Portugal tik-tok

1 semana atrás 41

A quantidade de diretos televisivos, pseudo informações e até bonitas análises sobre a detenção do tal Castelo Branco retratam o país em que nos tornámos ao longo dos últimos anos. O nivelamento agora é quase todo ele feito por baixo. Se não é Castelo Branco, a superficialidade mantém igualmente prisioneira grande parte do que sobra da informação. A palavra mágica é “polémica”. O ângulo de abordagem é este, só este, pouco mais do que este. Nuno Melo afirma que os jovens delinquentes poderiam ter um caminho a fazer nas Forças Armadas e o assunto é imediatamente esmagado como se fosse uma sugestão idiota que não merece debate, apenas escárnio e a lasciva oportunidade para polemizar. Bem sei que Nuno Melo não tem gravitas política, mas o tema é oportuno, desde que colocado num contexto que não reduza o recrutamento a esta via a que podemos chamar sem rebuço de realinhamento. Houve um jornal que se preocupou em verificar quantos jovens estariam nestas condições hoje — afinal, pouco mais de uma centena —, quanto ao resto, nada, zero, vazio completo, exceto algumas declarações previsíveis das corporações do sector (os militares), bastante felizes em poder aproveitar o assunto para a vitimização habitual e a proverbial mão estendida ao Estado. O epílogo é conhecido: queremos mais verba, na linguagem contabilística que define a irreprimível ambição de parte do país. Na verdade, hoje, a receita mediática só conhece retas informativas, não há curvas: declaração, reação das corporações, as frases dos ofendidos, esfrega-se tudo até fazer ferida, nasce a polémica, junta-se alguma análise e fim da suruba. O dia inteiro assim. Embriagados de inutilidade. Houve um tempo em que pensei que o país iria seguir o caminho da Fox News, isto é, optar por canais televisivos ou outros media politicamente engajados e nada interessados em fazer jornalismo. A vida não para de nos surpreender. O que temos hoje é pior: é o Portugal tik-tok. Clips de alguns segundos ou poucos minutos que alimentam o ciclo noticioso de manhã à noite até ao dia seguinte, onde a alvorada trará certamente uma nova e rebarbativa polémica, um ultracongelado de baixíssimo custo e zero calorias com vida inteligente. A política partidária sempre viveu destes microciclos, mas não se esgotava neste comportamento pavloviano e insolvente. A eleição de Marcelo Rebelo de Sousa para presidente da república — com minúscula —, é o símbolo nacional, com escudo, esfera armilar e mão ao peito deste desenho animado lusitano que nos captura a atenção. Estamos vidrados. Estamos reféns e não há resgate à vista. De certa forma, até gostamos, gostamos muito, gostamos tanto. Sofremos de síndrome de Estocolmo. Deem-nos o André Ventura, mais e mais. E mais um pouco ainda — outra, outra e outra vez…

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