15 militares feridos fazem reabilitação em Portugal: "Sem vítimas não há guerra, quero recuperar"

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A zona das chegadas do aeroporto de Lisboa foi esta tarde decorada de azul e amarelo por bandeiras da Ucrânia. Quem por lá passava não tinha dúvidas de que Portugal se preparava para receber mais um grupo de refugiados, mas desta vez, um grupo diferente - 15 militares feridos que combateram na linha da frente no leste da Ucrânia.

À espera dezenas de ucranianos membros da associação portuguesa de apoio a ucranianos - HELP UA. Vieram até ao aeroporto para mostrar aos militares feridos que não estão sozinhos. À Renascença, Oleksandra Boychenko, que vive em Portugal há 7 anos, diz que "significa muito e que é motivo para se estar muito agradecido a Portugal pela criação de um centro de reabilitação para os militares ucranianos".

Oleksandra veio para dizer "obrigada" aos militares e confessa que nas últimas semanas foram angariados livro para que "possam relaxar e recuperar". Os livros vão ser colocados numa estante no centro de reabilitação construído em Ourém. A associação juntamente com apoio de civis, empresa e da autarquia de Ourém conseguiu recuperar o velho seminário de Aldeia Nova para construir um espaço de reabilitação que contará com a colaboração da CUF de Santarém.

Depois de mais de uma hora à espera, apareceram os 15 militares. Assim que os olhares se cruzaram, mesmo que desconhecidos, todos os que esperavam acabaram por se emocionar e mesmo assim, com alguma força, cantaram o hino da Ucrânia - um momento que todo o aeroporto se calou para ouvir.

Na frente do grupo de militares estava Artem, de 36 anos. Atrás dele alinharam todos os outros 14 militares que tinham vestida uma camisola branca com a palavra "restart", que quer dizer "recomeçar". Artem conta que em Portugal quer "trabalhar muito para recuperar e chegar aos objetivos", para trás deixa a memória do dia em que ficou ferido.

Artem trabalhava já antes da guerra com os sistemas de rockets e assim que começou a invasão da Rússia não teve dúvidas de que "tinha de defender a pátria". Acabou ferido numa acão militar em Donetsk. "Íamos atacar um grupo de militares russo e acabei ferido. Sem vítimas não há guerra, e o nosso objetivo foi conseguido, destruímos o inimigo no local", disse.

Chega a Lisboa em cadeira de rodas, mas espera recuperar o possível em Portugal. Ao longo da conversa traduzida por um dos membros da associação, Artem agradeceu por várias vezes a ajuda dos portugueses e a todos os que permitiram que o dia de hoje chegasse, sobre a viagem de 36 horas diz que correu bem.

O grupo de militares feridos viajou de Kiev para Varsóvia e só depois apanhou um voo da TAP para Lisboa. Tudo sempre com o apoio da associação de ucranianos.

Ângelo Neto, da associação, não consegue terminar a frase em que agradece a ajuda dos portugueses, por estar muito emocionado. "Nós cumprimos este sonho porque foi vontade dos portugueses, com doações, empresas, voluntários e agora também precisamos de mais ajuda para continuar este sonho que é muito importante para estes feridos, para passarem uma noite que consigam dormir sem uma bomba. O tratamento psicológico fora da Ucrânia é 50% mais eficaz", sublinhou.

A voluntária Teresa Leal Coelho descreve que a média de idades do grupo é de 44 anos "como na guerra". De acordo com a voluntária todos os feridos já foram intervencionados, a maioria foram feridos com balas. "A Rússia está a utilizar bombas de fragmentação que são proibidas pela lei internacional temos muita gente amputada", conta.

No grupo que está em Portugal o mais novo tem 21 anos e fisicamente parece o que está em melhores condições. Visivelmente cansados, mas de sorriso por estarem no caminho da recuperação o grupo de militares seguiu viagem para a Aldeia Nova em Ourém onde vão ficar nos próximos tempos no antigo seminário que é agora o primeiro centro de reabilitação privado para militares ucranianos da Europa.

Paulo Rangel. "É importante que seja a sociedade civil" a ter a iniciativa

Numa sala mais privada, à espera do grupo de militares ucranianos, estava o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, que realçou o facto de o grupo vir acompanhado por 5 médicos e psicólogos ucranianos. "Têm muita experiência e podem treinar os fisioterapeutas e médicos portugueses que estão disponíveis”, diz o ministro, que sublinhou que se trata de uma missão "da sociedade civil".

Paulo Rangel diz que o Governo está solidário, e destacou o apoio dado pela autarquia de Ourém. “O financiamento foi todo da sociedade civil, agora as operações para passagem de fronteira e tudo isso exigem uma coordenação grande e por isso, por exemplo, os embaixadores junto de Kiev e de Varsóvia estiveram muito ativos para desbloquear um conjunto de questões, que nós vamos fazendo, mas eu não quero chamar a esta iniciativa a orla do Governo”, explicou.

O ministro dos Negócios Estrangeiros considera "muito importante que seja a sociedade civil" a tomar a iniciativa, e garante que se for cumprido o objetivo de receber 40 ucranianos no centro de reabilitação, mais 35, a associação terá o acompanhamento " do Estado".

Paulo Rangel diz que atitudes como a da Associação de Ucranianos em Portugal, que construiu um centro de reabilitação para militares feridos, "é uma motivação para a grande Cimeira da Paz deste sábado, na Suíça".

O ministro dos Negócios Estrangeiros diz que o objetivo da cimeira é sensibilizar o mundo inteiro para o plano de paz para a Ucrânia. "Vamos trabalhar na segurança alimentar, vai haver uma grande atenção à questão da segurança nuclear. Neste momento, as infraestruturas elétricas estão a ser altamente danificadas, o que pode, por exemplo, originar novas vagas de refugiados. Portanto, nós estamos a preparar também uma contenção", diz.

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