A Comissão e os Comissários dos Povos

2 horas atrás 19

Aqui por Xelas não há a tradição de atribuir cognomes aos Presidentes da Comissão Europeia. Fazendo-o, a re-eleita Presidente mereceria o apodo de “a enjeitada”.

Tendo conseguido manter-se Ministra nos quatro Governos de Merkel (de 2005 a 2019), dada como sucessora in pectore da Chanceler, viu-se combatida pelo aparelho da CDU e foi “chutada”, ao fim de 48 horas de marchandage no Conselho Europeu, incluindo uma noite branca de domingo para segunda-feira, para Presidente da Comissão Europeia, a primeira do género. Macron surgiu como autor da proposta, ideal para matar, ab ovo, a deriva parlamentar dos Spitzenkandidaten socialista (o holandês Frans
Timmermans) e do PPE (o alemão Manfred Weber). Na votação no Conselho Europeu, em que os Chefes de Estado e de Governo recuperaram o exclusivo da escolha do Presidente da Comissão, Merkel teve de se abster para moderar a fúria do parceiro de
coligação, o SPD, que apoiava Timmermans.
Em 2019 Ursula Gertrud, indigitada Presidente da Comissão, foi a votos no Parlamento Europeu e de lá saiu com 383 (e 327 contra), mais nove do que o mínimo necessário (374). Em 2024 melhorou o score: 401 votos a favor, 281 contra, quando precisava de obter o mínimo de 360 (o Brexit reduziu o número de Deputados). Entre as
duas eleições muitos foram (e mais ainda os alemães, com destaque para o Chanceler Scholz) os que tentaram afastá-la de um segundo mandato na Comissão, alimentando uma candidatura a Secretária-Geral da NATO (mais uma première). Enjeitada mas
avisada, Ursula fez saber da sua indisponibilidade para se ocupar da “outra” organização com sede em Xelas. A 28 de Setembro de 2025 as eleições para o Bundestag trarão de volta a CDU ao governo Federal e Ursula ficará a saber se o eixo Bruxelas-Berlim
funcionará melhor.
Antes terá de encontrar pastas para 27 Comissários, indicados por Estados com dimensões diferentes (em população e poder económico). O número visa manter uma igualdade formal e não avançar em direcção ao que os Tratados permitem: um número
menor de Comissários do que o de Estados-membros. Não havendo mundo para tanto Comissário, Ursula anunciou esta terça-feira a multiplicação de Comissários com competências sobrepostas. Há um Vice Presidente para a Prosperidade e a Estratégia Industrial (Stéphane Séjourné, ex-MNE francês, substituto de última hora do compatriota Thierry Breton que não tinha ainda percebido que Ursula não gosta dos que lhe possam
fazer sombra), um Comissário para a Segurança Económica (Šefčovič) e outro para a Economia e Produtividade (Dombrovskis), ambos ex-Vice Presidentes da Comissão.
Há novidades, como um Comissário para a Defesa (Kubilius) matéria que integra as competências da Alta Representante (Kallas), a quem é proposta co-habitação com um Comissário para as Parcerias Internacionais (Síkela) a juntar ao ménage, nem sempre fácil, com a pré-existente pasta do Alargamento (Kos) e a novel Comissária para o Mediterrâneo (Šuica), o que deixa órfãs as restantes geografias.
As cartas de missão que Ursula enviou aos indigitados acrescentam complexidade administrativa: muitos respondem perante a Presidente o que desdoura a matriz colegial da Comissão.
Também há Comissários que não têm serviços sob a sua tutela (Habitação, Defesa,…) o que despertará a vontade de criar novas Direcções-Gerais, pondo à prova os propósitos de “simplificação”.
A próxima etapa do Colégio inclui as audições dos indigitados e a aprovação da Comissão pelo Parlamento. A forte inclinação à direita poderá obrigar a alguma troca de última hora, como aconteceu em 2004 com Rocco Buttiglione, por sinal mentor do agora indigitado Fitto. O anunciado Comissário dos Assuntos Internos e Migração, o austríacoBrunner, também é, na óptica da esquerda do PE, um bom troféu num eventual rolar de cabeças. Haverá revelações da vida pretérita dos indigitados e, para alguns, será questionada a respectiva independência face à excessiva proximidade dos lobbies que irão regular.

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