A despedida de Iniesta: «Nos treinos fazia cuecas e parávamos para lhe limpar as chuteiras»

1 hora atrás 20

Magia:

Religião dos magos Produção de atos extraordinários e sobrenaturais Encanto; fascinação Futebol produzido pelos pés de André Iniesta

É certo que modificámos um pouco a definição que surge no dicionário, mas acreditamos que, se apreciar futebol da mesma forma que nós, não irá ficar melindrado, caro leitor. Depois de mais de 20 anos como profissional de futebol, Andrés Iniesta anunciou, esta terça-feira, a despedida dos relvados aos 40 anos.

Produto de La Masia, Don Andrés conquistou tudo o que havia para conquistar ao serviço do seu Barcelona. Junto do fiel escudeiro Xavi Hernández- a boa relação de amizade entre ambos fica bem patente no facto de serem o '8' e o '6' no Barcelona e o '6' e o '8' na seleção espanhola- e de Sergio Busquets, formou um dos melhores meios-campos de sempre e festejou tanto a nível de clube como de Seleção. 

De resto, aqui não há como fugir: o golo mais importante da história do futebol espanhol foi da autoria do mago de 1,71m. Aos 117 minutos da final do Campeonato do Mundo de 2010, na sequência de um corte incompleto de Van der Vaart, Iniesta aproveitou um passe açucarado de Fábregas para dar a nuestros hermanos o seu primeiro Mundial. Logo depois, um sinal de grandeza também como homem. 

Iniesta nos festejos do golo na final do Mundial @Getty / Jamie McDonald

«Dani Jarque siempre con nosotros»

Nos festejos do golo mais importante da sua vida, Iniesta não esqueceu o amigo- jogador do rival Espanyol- que falecera alguns meses antes. Na era do imediatismo, o médio foi sinónimo de tranquilidade e de saber sempre o que fazer com a bola.

E ainda que possamos estar a ser um pouco parciais neste texto, a verdade é que nos baseamos apenas num dos melhores barómetros que existe para se avaliar um jogador: o testemunho de quem com ele partilhou balneário.

«Vim para o Vissel Kobe muito por causa dele»

Ainda que tenha passado grande parte da sua carreira no Barcelona, clube onde venceu, entre outros títulos, nove campeonatos espanhóis e quatro Liga dos Campeões, Andrés Iniesta representou também o Vissel Kobe e o Emirates Club, último emblema que carregou ao peito.

No Japão, onde esteve entre 2018 e 2023, o médio cruzou-se com Jean Patric, extremo que passou por Portugal (Académico de Viseu e Santa Clara) e que conversou com o nosso portal sobre o término da carreira de El Ilusionista.

«É um sentimento de muita felicidade, posso dizer que jogar com o Iniesta foi um sonho realizado. Ter partilhado o balneário e o campo com alguém com quem jogava na PlayStation 2 é um sentimento incrível», começou por nos contar Jean Patric, que foi ainda mais longe: 

Andrés Iniesta
Total

962 Jogos  66137 Minutos

ver mais >

«Fiquei muito surpreendido pela positiva com a forma de ser do Iniesta. No início nem sabia como devia falar com ele, não sabia se ia incomodar... Os primeiros cumprimentos foram muito tímidos, mas depois percebi que ele era muito aberto. Nós éramos dos poucos estrangeiros do clube e lembro-me que, logo no meu início aqui, ele me perguntou "Jean, o que te traz aqui, amigo?" e eu respondi sem hesitação "É claro que o Vissel Kobe é uma grande equipa, mas um dos motivos pelos quais assinei foi por ter a oportunidade de jogar contigo". Expliquei-lhe que queria aprender muito com ele e ele foi extremamente simpático, disse-me que ficava muito feliz. Ele foi sempre uma pessoa muito alegre e disponível para ajudar.»

Ainda que só tenha partilhado balneário com Iniesta durante alguns meses, ainda para mais na fase descendente da passagem do médio pelo Vissel Kobe, o extremo brasileiro não teve dúvidas e assegurou que, na sua equipa, o internacional espanhol «jogava sempre»: «Era um jogador diferenciado, tecnicamente estava muito acima de todos os outros. Fazia coisas incríveis e, mesmo com 39 anos, ainda dava muito à equipa.»

Jantares e meiinhos ficam na memória

Se dentro das quatro linhas não há dúvidas em relação à qualidade Iniesta, quisemos perceber junto de Jean Patric como é o mago fora dos relvados...

«Nós jantávamos sempre juntos, até brincávamos e dizíamos que era a mesa dos estrangeiros. Havia três brasileiros, dois espanhóis e um sérvio e nós fazíamos muitas perguntas. Queríamos saber como eram o Messi e o Neymar e como eram os jogos contra o Real Madrid. Ele partilhava muitas experiências e falava muito das conquistas com o Barcelona e com a Seleção, estava sempre disponível. Respondia a tudo e brincava muito connosco», frisou o extremo.

A publicação que Jean Patric aquando da saída de Iniesta do clube tornou evidente a boa relação que ambos têm, sendo que, um dos aspetos que nos saltou à vista foi a resposta de Iniesta: para além de ter agradecido a Jean Patric, o ex-Barcelona fez também referência aos 'rondos'- meiinhos em português.

A explicação é simples:

«Para além dos jantares, o meiinho também era dos estrangeiros. Os jogadores locais são mais tranquilos, ao passo que nós éramos mais barulhentos. Os meiinhos eram os momentos de maior descontração que tínhamos no treino e brincávamos muito. Eu costumo dizer que ele tirava sempre um coelho da cartola e fazia várias canetas/cuecas; depois começávamos todos a gritar e até parávamos o treino para lhe limpar as chuteiras. É por isso que ele diz que tem saudades desses meiinhos

Uma estrela de dimensão global

Ainda que tenha primado sempre pela simplicidade aquando da sua passagem pelo Japão, Iniesta não conseguiu 'fugir' ao facto de ser um dos futebolistas com maior currículo a nível mundial. «Isto até era tema de conversa no plantel: quando o Iniesta estava na comitiva para um jogo fora, tínhamos sempre 200/300 pessoas à espera dele com camisolas dele e do Barcelona. Era quase uma cerimónia, uma festa com bastante celebração. Quando ele não viajava, dizíamos entre nós que era um dia comum [risos]. Víamos a grandeza dele nesses momentos, era incrível ver a paixão que as pessoas tinham por ele», recordou Jean Patric, que enfatizou as qualidades humanas de Don Andrés: 

Médio despede-se dos relvados aos 40 anos

«Por norma vemos estes atletas como se fossem intocáveis. No entanto, o Iniesta era uma pessoa que estava sempre disponível e nunca se colocou como superior, mesmo tendo a carreira que tinha. Aliás, aqui há uns dias tive uma lesão e falhei alguns jogos. Ele mandou-me logo mensagem a perguntar o que é que se passava porque estava a ver o jogo e percebeu que eu não estava na ficha. São pequenos detalhes que marcam e que fazem com que admires ainda mais a pessoa em questão.» 

Na hora de desligarmos a chamada, isto na medida em que o fuso horário em relação ao Japão já se fazia sentir e Jean Patric tinha de ir dormir enquanto para nós ainda era fim de tarde, fizemos uma última questão ao extremo. Que legado deixa Iniesta no mundo do futebol?

«Dificilmente existirá outro Iniesta e esse é o maior elogio que lhe posso fazer, o futebol deve-lhe muitos agradecimentos. Ele sempre usou a camisola 8 do infinito. Acredito, de forma sincera, que ele é daqueles jogadores que ficará eternizado neste desporto», rematou.

Entretanto novamente um pouco no campo da parcialidade, dizemos com plena convicção: Gracias, Andrés. Fue un placer!

Ler artigo completo