A flutuar com a Alemanha e Major Tom

1 dia atrás 19

«Palavras à Sorte» é a rubrica diária dos jornalistas do zerozero durante o Euro 2024. Todos os dias, na Alemanha ou na redação, escrevemos um apontamento pessoal sobre a competição e todas as sensações que ela nos suscita.

Jamal Musiala, Florian Wirtz e... Peter Schilling. Quando desenhámos previsões do Euro 2024, apoiados na informação acumulada de um vício que só piora na fase final de torneio de seleções, não considerámos o impacto que fatores extra-desportivos teriam, por exemplo, na anfitriã Alemanha. Ocorreu-nos (a nós, adeptos) a afirmação de jovens prodígios da Bundesliga, mas nunca a de um músico de 68 anos.

Nós tardamos em chegar à previsão certa quando só olhamos para o que acontece dentro do relvado, numa espécie de miopia futebolística. Ainda assim, é fora das quatro linhas que acontecem algumas das coisas mais bonitas. O fenómeno que é o tema «Major Tom», composto por esse artista no distante ano de 1983, exemplifica isso mesmo.

À semelhança do que aconteceu antes com «Freed from desire», a nova edição do Euro já conta com uma espécie de hino não oficial. A UEFA tentou vender-nos Meduza e Leony em torno de OneRepublic - banda que origina na paisagem rochosa de Colorado Springs, bem longe da Europa -  mas esse «Fire» mal ardeu. A canção que aquece as ruas germânicas é, na verdade, esta a que os alemães se referem como «völlig losgelöst» (totalmente separada).

Totalmente separada
Da terra
A nave espacial flutua
Totalmente à deriva

Para que as coisas corressem desta forma, o momento-chave foi em março, quando a Adidas anunciou o novo equipamento da mannschaft através de um vídeo fantástico que tinha «Major Tom» como banda sonora. 

A campanha teve impacto e não demorou a surgir uma petição pública para que essa canção fosse tocada no estádio sempre que a seleção marcasse golo - o torhymne, algo de enorme importância cultural no futebol alemão. A ideia avançou e ainda em março, quando Mittelstadt marcou aos Países Baixos, a letra ecoou pela primeira vez nas bancadas. 

Não queremos aqui insinuar que uma música seja mais importante para o sucesso alemão do que o drible aveludado de Musiala ou os passes açucarados de Kroos, mas há quem os coloque em pé de igualdade.

É uma nova Alemanha, com novas caras, uma nova imagem (o equipamento alternativo em rosa simboliza isso mesmo) e um novo som. O som de um astronauta menos melancólico do que os fãs de Bowie esperam, dono de um otimismo que faz adeptos dançar no meio de granizo e trovoada.

Mais do que levantar o troféu, a seleção anfitriã procura, acima de tudo, afastar-se da imagem que deixou em torneios recentes, quando caiu nos oitavos do último Euro e nos grupos dos últimos dois Mundiais. Com a vitória sobre a Dinamarca (2-0), a nova fórmula já fez os alemães flutuar até aos quartos de final. Porquê parar agora?

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