A guerra fria está de volta, uma boa notícia

1 mes atrás 49

       Os saudosistas estão vingados: EUA e Federação Russa voltaram aos velhos hábitos, aqueles que nunca morrem: trocas de “espiões”, em resultado de mais de dois anos de tensas negociações em que começaram por trocar listas de desejos.

As negociações bem sucedidas são sempre úteis para aliviar tensões, re-adquirir confiança na contraparte e proclamar o sucesso do resultado. Putin está esfuziante, recuperou o papel de interlocutor, em pé de igualdade, com os EUA, como nos bons velhos tempos. Bom funcionário, aproveitou para, por via do exemplo, lembrar a todos os funcionários leais que a Mãe Rússia não se esquece deles. Em campanha eleitoral, Biden e Kamala fizeram-se fotografar junto dos “libertos” sem que ninguém lhes recordasse que quase todos eram presos políticos abusivamente detidos por Moscovo com o propósito de amealhar “moeda” para troca por verdadeiros espiões e criminosos de delito comum, condenados por tribunais ocidentais em julgamentos públicos, “fair and impartial”. O cabeça de cartaz da “wish list” de Washington, Alexei Navalny, morreu na prisão e retirou peso às concessões russas.

Bom seria assistir ao retomar das negociações noutras áreas clássicas dos tempos da guerra fria: controlo de armamentos, em particular de mísseis de curto e médio alcance e de armamento nuclear. Há nestas negociações a grande dificuldade de as alargar ao necessário ménage à trois: a China não está obrigada pela maioria dos acordos internacionais de controlo de armamento (em particular os que em anos recentes têm sido denunciados por Moscovo e por Washington) e não tem qualquer interesse em limitar pela via jurídica as suas capacidades de defesa.

Vistos de Washington os conflitos na Ucrânia e o no Médio Oriente são distracções em relação ao principal objectivo: a contenção militar, económica e política da China. A distracção médio-oriental diminuirá de importância depois das eleições presidenciais de 5 de Novembro. A distração ucraniana já está a diminuir de importância, o que levou Zelensky a referir, pela primeira vez, a possibilidade de um acordo de paz com perda de território, sujeito a referendo pelos ucranianos. Este método negocial tem riscos próprios, como o processo do Brexit demonstrou: oferecidas ao Reino Unido algumas concessões importantes tal não foi suficiente para garantir no referendo um resultado favorável à permanência na UE.

As negociações entre russos e ucranianos começaram, convém recordar, pouco tempo depois da invasão iniciada a 24 de Fevereiro de 2022, e podem não terminar num acordo solene e formal, que tenha de ser aprovado pelos respectivos parlamentos, publicado e questionado (ou até referendado). A aceitação de um modus vivendi, com as actuais fronteiras de facto, poderá ser o suficiente para dar origem a mais um “conflito congelado”. Tal permitirá aos ucranianos salvar a face, continuando formalmente em guerra para defesa do território ocupado mas sem ter um conflito aberto com perdas humanas, materiais, económicas e políticas que são insustentáveis a prazo. A Federação Russa teria o mesmo benefício e o ganho de causa da ocupação dos territórios que considera como sendo etnicamente russos. A União Europeia e a NATO, não reconheceriam a bondade da ocupação mas deixariam de ter um conflito aberto na proximidade das fronteiras a Leste. A inexistência de um acordo formal permitiria igualmente contornar a grande dificuldade das “garantias de defesa” reivindicadas pelo Kiev, recusadas abertamente por Moscovo e, no que respeita à cláusula de legítima defesa colectiva, impossíveis de conceder pela NATO.

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