Por Mário Barros, Cluster Operations manager da Ingka Centres para o Sudoeste da Europa e presidente da Mesa da Assembleia Geral da Associação Portuguesa de Centros Comerciais
Todos nós possuímos uma marca pessoal. Levamos anos a construí-la e a desconstruí-la, gerando percepções e definindo o que nos torna únicos. No fundo, a nossa marca pessoal é um reflexo das nossas experiências, crenças e da imagem que desejamos projectar.
A marca de um produto ou serviço segue essa mesma lógica. Ela representa a forma como uma empresa pretende construir o seu relacionamento com o público-alvo. Uma marca eficaz transforma a relação com o cliente de meramente funcional para aspiracional, passando da simples análise do preço à apreciação do valor, assegurando que os valores que representa estão alinhados com os do consumidor.
Algo que podemos ver no estudo de 2020 da Deloitte “Brand Marketing Effectivenness Study” onde mais de 62% dos inquiridos sentem que têm uma relação com a marca, e onde 60% dos clientes de larga duração usam termos emocionais tais como “digna de confiança”, “honesta” e “íntegra” para descrever uma marca.
Podemos ver o mesmo no nosso próprio comportamento. Temos o País dividido em dois no que diz respeito a cerveja, existem três clubes principais, e temos o nosso restaurante favorito onde nos encontramos com a família e/ou amigos. Todas estas decisões são racionais? Estes são casos extremos, mas quando a ligação emocional com uma marca é tão forte, verificamos este tipo de comportamentos tribais.
É crucial desenvolver e manter uma identidade de marca forte e actualizada. Isso permite que os clientes tenham expectativas claras em relação à marca e aos seus produtos, influenciando assim o seu processo de compra, tanto hoje como no futuro. Embora seja um processo subjetivo e, por isso, complexo e demorado, algumas características essenciais devem ser observadas: a marca precisa estar alinhada com as características do produto, com os desejos dos clientes e ser consistente ao longo do tempo.
Uma imagem de marca sólida resulta de múltiplos passos e acções, e raramente será bem-sucedida se for vista como um objectivo isolado. O primeiro passo para a sua obtenção passa por se identificar o segmento de mercado onde existem lacunas que podemos preencher, ou onde podemos ser relevantes. O nosso produto deve atender não apenas às necessidades dos clientes, mas também representar e agir de acordo com seus valores.
Um exemplo actual de evolução e introdução de novas marcas é o sector automóvel. Com a crescente popularidade dos veículos eléctricos e a diminuição da oferta de modelos de entrada, várias marcas reposicionaram-se para atrair um público com maior poder de compra, principalmente as que já estavam no mercado, enquanto que as novas surgem promovendo tecnologias sustentáveis a preços acessíveis. Estamos a presenciar a transformação de um sector e a sua adaptação a uma tecnologia que está a ser, e será ainda mais, disruptiva e exigirá constante evolução das marcas e das suas soluções.
Num centro comercial, onde trabalhamos com diversos segmentos, a oferta é mais ampla. Este pode ser visto como uma casa de marcas, cada uma com seu próprio posicionamento. Aqui, a combinação de marcas, a experiência de compra, o design e a atmosfera são fundamentais, bem como a conexão com a comunidade envolvente.
Não existem fórmulas correctas, mas temos exemplos interessantes que podemos observar. Quando o Meeting Place MAR Shopping Matosinhos abriu em 2008, com a sua oferta, ambiente e design pensados para o cliente local, foi pedido à comunidade para ajudar na escolha do nome do centro. Mais de 300 mil pessoas participaram nessa selecção, o que reflecte o poder de criar uma relação próxima com os clientes.
Noutra perspectiva, o Meeting Place da Ingka Centres, Kungens Kurva, em Estocolmo, está a começar uma transformação ambiciosa, que visa passar de uma oferta puramente de retalho, para um destino vibrante e de utilização mista. O seu posicionamento, assim como o que oferecerá aos seus clientes, mudará, e, consequentemente, o seu relacionamento com eles também será diferente. A estratégia da Ingka Centres é fazer evoluir os seus espaços comerciais para locais de encontro, onde se criam experiências que vão além do simples acto de compra, proporcionando mais razões para a visita dos seus clientes, além de se integrar cada vez mais e melhor na comunidade envolvente.
Desta forma este centro está a passar por um processo de alteração de marca e pretende reflectir a sua comunidade nesta mudança. Nesse sentido foi criada e lançada a marca “Livli Kungens Kurva”. Livli em sueco, significa algo cheio de energia e alegria, e reflecte o conceito que se pretende introduzir.
Fará então sentido abandonar uma marca construída e criar uma nova? Sim, se a forma como nos relacionamos com os clientes mudar, e a marca deixar de representar o nosso produto ou o nosso cliente, então essa reavaliação é essencial.
A imagem de marca não se resume à forma como comunicamos com o cliente ou com as campanhas que realizamos, mas sim no modo genuíno como nos relacionamos e com o que temos para oferecer.