A outra metade!

6 meses atrás 58

Sempre estive curiosa em saber se em Davos as mulheres tinham ou têm uma palavra decisiva nas decisões. Afinal é na Suíça, no lago de Davos, que todos os anos acontece o Fórum Económico Mundial. Por esses lados do Cantão dos Grisões, cabeças frias tomam as grandes decisões do mundo que em grande medida afectam os muitos que vivem com a cabeça quente.

Na minha distante visão, muito para além de Marte, só me permito imaginar…. O que é que a minoria decide quando as guerras, mortes, pobreza, refugiados, riscos climáticos extremos e o feminicídio[1] estão em alta? A alta inteligência é reunida nos bons ares de Davos e fico curiosa em saber se esses filhos da outra metade do mundo vão mesmo decidir pelo bem comum ou simplesmente brincar na neve…

Se “elas que são a maioria no mundo e a outra metade é filho delas[2], se decidissem ou influenciassem as decisões, será que a guerra já não teria terminado? A economia estaria como está? Será que a distribuição da renda não teria um outro padrão? Ou mesmo, se a arquitectura das instituições não teria mais casas de banho para mulheres para se evitarem sempre as longas filas?

Só consigo imaginar… que enquanto decorria Davos, a primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, se demitiu dizendo que “já não tinha suficiente gás no tanque para fazer justiça ao trabalho”, e as mulheres líderes em Davos discutiam como alcançar a paridade de género na liderança. Que paradoxo!

E terminaram a lamentar: “o poder é muito hostil às mulheres, acabamos de ver isso esta manhã com Jacinda Ardern…”. Acrescentando, “a política é um lugar inóspito, mas é mais inóspito para as mulheres do que para os homens. E isso é algo que não devemos aceitar”, disse Arancha Gonzalez Laya, reitora da Escola de Assuntos Internacionais de Paris (PSIA), Sciences Po, numa sessão do Fórum Económico Mundial[3].

Perdemos uma guerreira da política como perdemos todos os dias mães, irmãs e filhas, quer através das micro-agressões nos locais de trabalho, quer pela violência social e doméstica. O futuro não é animador. O Relatório Global sobre a Disparidade de Género 2022, do Fórum Económico Mundial, diz que os últimos dados disponíveis do Objectivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) nº5 mostram que o mundo não está no bom caminho e que serão necessários mais 286 anos para colmatar a disparidade global de género.

Resumindo, são precisos mais de 100 anos e, consequentemente, não será na minha geração nem das minhas netas, pois a inteligência acumulada da humanidade e a inteligência artificial e a do ChatGPT ainda não chegaram a Davos. Uma pena não terem percebido que ElesPorElas – HeForShe[4] e todos juntos têm potencial para fazer do planeta um lugar melhor para viver.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.

[1] (termo difundido na década de 1970, pela socióloga sul-africana Diana E.H. Russell (“femicide”, em inglês)
[2] Frase inspirada “Metade do mundo são mulheres. A outra metade, os filhos delas”. da Tanzaniana Éfu Nyaki
[3] Advancing Gender Equality: UN Women at Davos 2023 | UN Women – Headquarters
[4] Lançado pela ONU Mulheres em 2014
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