Académica diz ser "entidade legítima e natural para manter posição de cessionária" do estádio de Coimbra

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A Associação Académica de Coimbra - Organismo Autónomo de Futebol (AAC-OAF) e a Câmara Municipal de Coimbra tardam em chegar a acordo relativamente ao Estádio Cidade de Coimbra, espaço que é propriedade da autarquia e que tem sido utilizado pelos estudantes. Na reunião camarária da última segunda-feira não houve consenso e o excutivo autárquico agendou nova discussão para esta noite. Entretanto, o clube emitiu um comunicado onde reitera ser "entidade legítima e natural para manter posição de cessionária" do recinto.

Leia o comunicado na íntegra:

"Na sequência da reunião de ontem do Executivo Camarário de Coimbra, e depois de termos tipo oportunidade de ouvir a mesma, cumpre à Direção da AAC/OAF esclarecer:

- Entre a decisão de não renovar o contrato de exploração do ECC, 19 de junho de 2023, e a primeira proposta da CMC, 11 de junho de 2024, decorreram 11 meses e 22 dias.

- O Sr. Presidente da CMC, no dia de ontem, afirmou que "a CMC solicitou o Programa de Desenvolvimento Desportivo (PDD) a 11 de junho e repetiu esse pedido a 3 de julho, por email, conforme comprovam os emails.". Esta afirmação não corresponde à verdade, conforme se pode retirar da leitura dos aludidos emails.

- No email enviado a 11 de junho, a CMC escreveu: "Caso a proposta apresentada mereça a concordância de V. Exa., deverá a AAC/OAF, na qualidade de beneficiária, contribuir para a conclusão do documento, remetendo, em complemento, o indispensável Programa de desenvolvimento desportivo (…) ".

- No email enviado a 3 de julho, a CMC escreveu: "Em caso de concordância com a versão atualizada da minuta de contrato, deverá a AAC-OAF complementar o documento, remetendo, adicionalmente, o indispensável Programa Desportivo".

- Em ambas as situações, a AAC/OAF não concordou (e transmitiu à CMC a sua discordância) com as versões apresentadas, pelo que, conforme facilmente se compreende, perante o clausulado contratual apresentado não se afigurou sequer pertinente o envio do Programa de Desenvolvimento Desportivo.

- Acresce que a solução que agora está em discussão foi apresentada pela AAC/OAF no passado dia 15 de julho em reunião realizada entre as partes na CMC e formalizada pela AAC/OAF, por escrito, no email enviado no dia 16 de julho.

- Porquanto, apenas no dia 19 de julho (sexta-feira), após reunião nos Paços do Concelho, a CMC demonstrou disponibilidade para que esta solução pudesse avançar, tendo-se então, apenas perante esta hipótese, tornado pertinente a apresentação do Programa de Desenvolvimento Desportivo - o que ocorreu ainda durante o fim de semana.

- Quando o Sr. Presidente afirma que a AAC/OAF usufrui das rendas dos espaços comerciais há 20 anos é importante recordar que quando a AAC/OAF iniciou a gestão do ECC não existiam rendas. Foi a Académica-OAF, com a sua gestão, e com um investimento avaliado em cerca de 5.000.000€ ao longo do tempo, que permitiu que os espaços comerciais atuais tomassem forma (inclusive criou, por sua conta e expensas próprias, a constituição da respetiva propriedade horizontal).

- Desde sempre que a Académica procedeu à manutenção e conservação do ECC e fê-lo com parcerias e patrocinadores por si angariados, sem qualquer ónus para o Município, pelo que tais custos não são sequer passíveis de ser contabilizados (facto que é do pleno conhecimento da CMC).

- A este propósito convém relembrar que a 10 de novembro de 2022, a AAC/OAF apresentou uma proposta para a instalação de painéis fotovoltaicos na cobertura do ECC em parceria com uma empresa de Coimbra, sem quaisquer encargos para a CMC, visando fazer do ECC o primeiro estádio carbono positivo e com tecnologia 5G. A proposta previa a criação de uma Comunidade de Energia Renovável (CER) que permitiria reduzir a fatura elétrica do estádio, dos edifícios municipais que aderissem e das famílias residentes em habitação municipal num raio de 4km do ECC. Estava também previsto, com essa intervenção, a requalificação da cobertura do ECC que apresenta defeitos de construção desde 2004. Porém, um parecer jurídico dos serviços da CMC impossibilitou a concretização desta proposta por considerar que a cobertura do ECC não estava cedida à AAC/OAF e, por conseguinte, não detinha legitimidade para implementar esta notória mais-valia.

- Com o sobredito parecer jurídico ficou claro que todas as questões de manutenção e conservação relacionadas com a cobertura do ECC são da responsabilidade da CMC, apesar da AAC-OAF, de forma recorrente e ao longo de 20 anos, ter feito intervenções para minimizar os danos causados no ECC. Não podem, pois, ser assacadas à AAC-OAF quaisquer responsabilidades pela falta de manutenção e conservação da cobertura, e consequentemente, dos danos causados pelas infiltrações e inundações que decorrem dessa falta de manutenção e conservação, nem tampouco as indemnizações por danos aos arrendatários/usufrutuários dos espaços cedidos.

- Sobre a possibilidade de realizar eventos, a AAC-OAF estranha, por não lhe ter sido apresentado qualquer fundamento legal, que não possa promover eventos/espetáculos não desportivos. A AAC-OAF está disponível, como sempre esteve, para que os grandes eventos musicais que a AAC-OAF consiga atrair para Coimbra, sem conflituar com os organizados/apoiados pela CMC, sejam organizados em parceria com o Município e que este, aquando da divulgação pública, seja a entidade de destaque.

- Relativamente ao Parecer Jurídico do Senhor Professor Pedro Costa Gonçalves que considera a AAC-OAF a entidade legítima e natural para manter a posição de cessionária que até então sempre deteve, atenta a tamanha clareza de raciocino que ali está sobejamente explanado, é no mínimo inconcebível que a CMC não explique o motivo pelo qual parece fazer tábua-rasa desse parecer em detrimento de uma alegada "defesa da legalidade" (como se o parecer a ignorasse). Infra transcrevemos parte das considerações ali referidas e, de seguida, suas conclusões finais:

"O destino normal de um estádio municipal de futebol, com a dimensão do Estádio Cidade de Coimbra (que foi palco de jogos de um campeonato europeu), é o de ser utilizado por um clube que participe numa competição profissional ou, porventura, numa competição sem natureza profissional, mas com a intenção e até a missão de ascender às competições profissionais."

(…)

"(…) a legislação atualmente em vigor autoriza expressamente a cedência da utilização de equipamentos desportivos públicos a clubes desportivos. Embora se refira a uma cedência gratuita, a mesma legislação exige, em regra, que o beneficiário da cedência assuma determinadas obrigações, que se configurem como contrapartidas de interesse público. Assim, respondendo à questão acima colocada: por força e ao abrigo da legislação do ordenamento desportivo, o Município de Coimbra está autorizado a ceder gratuitamente a um clube desportivo direitos de utilização do Estádio Cidade de Coimbra. E esse direito inclui, naturalmente, o direito de obter as receitas inerentes à utilização desportiva do Estádio (venda de bilhetes, de lugares, de direitos de publicidade, etc.). "

(…)

"Retomando a figura da cedência gratuita da utilização de equipamentos desportivos, uma questão que também tem de se colocar é a de saber se podem ser concebidas como contrapartidas de interesse público as obrigações que o clube cessionário assume quanto à conservação e à manutenção dos equipamentos cuja utilização lhe é cedida. Sobre isto, e tendo em mente os avultados custos e encargos de conservação e de manutenção de um equipamento da dimensão do Estádio Cidade de Coimbra, é forçoso concluir que a assunção de tais encargos já representa, na perspetiva dos interesses do Município, uma significativa contrapartida de interesse público. Mais: parece que se pode até tratar de uma contrapartida desproporcionada em relação ao benefício, se se concluir que o valor das receitas associadas à rentabilização do equipamento desportivo acrescido do valor intrínseco da sua utilização (que seria como que o valor de uma renda que o clube teria de pagar) é inferior ao valor dos custos que o clube beneficiário fica obrigado a suportar. Neste plano, desde logo quando esteja envolvido um clube que não participe em competições de natureza profissional, fará todo o sentido admitir que uma contratação da cedência de utilização do Estádio Cidade de Coimbra possa envolver a cedência de espaços não desportivos para rentabilização, ou outros apoios financeiros, na medida necessária à cobertura dos encargos acima indicados , isto sem prejuízo de outros apoios financeiros que o Município de Coimbra entenda conceder, relacionados com outras contrapartidas."

(…)

"Por fim, há ainda um elemento histórico que não pode deixar de ser aqui convocado: o Estádio Cidade de Coimbra, inaugurado em 27 de setembro de 2003, ocupa o espaço onde antes se localizava o designado Estádio Municipal de Coimbra: este havia sido inaugurado em 1949, numa partida de futebol entre a AAC e a Seleção Nacional de Portugal. Desde então, ou seja, desde 1949 (há 75 anos), foi sempre a AAC (ou o Clube Académico de Coimbra, que a substituiu entre 1974 e 1984) e a AAC/OAF (após 1984) a utilizar o Estádio Municipal de Coimbra e, desde 2004, o Estádio Cidade de Coimbra. Este elo de apertada ligação histórica, que é também cultural, entre a AAC/OAF e o Estádio de Coimbra constitui, por si só, justificação bastante para um novo acordo de utilização do Estádio entre o Município de Coimbra e a AAC/OAF."

 - O douto Parecer Jurídico termina com as seguintes conclusões:

"Em síntese, nos termos da lei vigente, o Município de Coimbra pode:

i) – atribuir à AAC/OAF, por Acordo de cedência gratuita, direitos de utilização e de rentabilização do Estádio Cidade de Coimbra, enquanto equipamento desportivo;

ii) – além dessa cedência, o Município pode vir a conceder apoios financeiros à AAC/OAF, na forma de cedência da utilização e da exploração de espaços afetos a atividades comerciais e de serviços;

iii) – em troca da cedência ou do apoio financeiro, sob qualquer forma, a AAC/OAF deve assumir obrigações de efetuar contrapartidas de interesse público, as quais não podem apresentar qualquer conexão com a eventual participação daquele organismo em competições de natureza profissional."

Este é, pois, o superior entendimento sobre o enquadramento jurídico de toda a situação aqui em causa."

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