Almada Negreiros ou Júlio Pomar. Sócrates comprou 197 mil euros em obras de arte, segundo o Tribunal da Relação

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Segundo as juízas, as compras terão sido feitas através de quem consideram ser o testa-de-ferro de Sócrates, o empresário Carlos Santos Silva, pois “não possuía nenhuma fonte de rendimento conhecida que lhe permitisse tais investimentos sem suscitar suspeitas”.

O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) suspeita que José Sócrates terá comprado várias obras de arte através do seu testa de ferro Carlos Santos Silva.

As compras foram feitas através do empresário para não levantar suspeitas, num montante que atinge os 197 mil euros, segundo as três juízas desembargadoras do TRL Raquel Lima, Micaela Rodrigues e Madalena Caldeira.

“A partir de Dezembro de 2010, o arguido José Sócrates sabia que o seu património financeiro se encontrava misturado com o do arguido Carlos Santos Silva e portanto, os meios financeiros do arguido José Sócrates podiam ser mobilizados, sem que essa utilização pudesse suscitar suspeita ou implicar a associação ao seu nome”, pode-se ler no acórdão do TRL sobre a Operação Marquês, após o Ministério Público ter recorrido da decisão do juiz de instrução Ivo Rosa.

José Sócrates “resolveu realizar a aquisição de obras de arte, fazendo mobilizar fundos para a aquisição de quadros de pintores com boa cotação no mercado da arte, escolhendo obras que facilmente valorizariam, dada a reputação dos respectivos autores enquanto artistas com reconhecimento internacional”.

As magistradas do TRL recordam que, desde 1997, o ex-primeiro-ministro era cliente da Galeria Antiks Design, que vende obras de pintura de artistas nacionais e estrangeiros.

“O arguido José Sócrates não pretendia que a sua identificação ficasse ligada a tais aquisições, uma vez que não possuía nenhuma fonte de rendimento conhecida que lhe permitisse tais investimentos sem suscitar suspeitas. Teve, mais uma vez, a intervenção de Carlos Santos Silva”, pode-se ler no documento.

Comprou assim três pinturas em fevereiro de 2011: duas de Uwe Lindau, cada uma por 12 mil euros, num total de 24 mil euros; outra de Batarda, por 25 mil euros.

Quem é que pagou? “Para o pagamento desta fatura o arguido Carlos Santos Silva fez emitir o cheque n.º02454735, com data de 08.02.2011, sacado sobre a conta n.º 2102 4355 0006 do BES”.

Em junho de 2011, novas compras na mesma galeria, recorrendo de novo a Carlos Santos Silva.

Comprou novamente três quadros: um desenho da Nau Catrineta por Almada Negreiros, pelo preço de 12.500 euros; uma pintura a óleo de António Ramalho por 6.500 euros; outra pintura a óleo de Escada por 29 mil euros.

Quem pagou? Carlos Santos Silva emite um cheque a 13 de junho de 2011, “sacado sobre a conta n.º 2102 4355 0006 do BES”.

Em outubro de 2011, “mais uma vez, o arguido José Sócrates faz uma aquisição à Antiks Design”: um quadro a óleo de Júlio Pomar, com o nome de “Salomé”, por 50 mil euros. O pagamento foi feito por Carlos Santos Silva recorrendo novamente à já citada conta do BES.

Mas o afã para comprar obras de arte por parte de José Sócrates não ficou por aqui. Entre outubro e dezembro de 2011, José Sócrates volta às compras na mesma galeria, segundo o TRL: uma pintura a óleo de Jorge Martins – “Joana à espera” – por 30 mil euros; outra pintura a óleo de Manuel Amado – “A estrada do pinhal” por 15 mil euros; um desenho de Silva Porto – “Cabeça de menino” – por cinco mil euros. Quem pagou? Novamente um cheque “sacado sobre a mesma conta do BES”.

Contas feitas, 197 mil euros em pagamentos a lojas relacionadas com obras de arte.

As três magistradas não têm dúvidas: “Como é possível ao arguido Sócrates proceder ao pagamento destas despesas supra referidas de milhões de euros? Usando o dinheiro que, embora formalmente estivesse em contas tituladas pelo arguido Santos Silva, lhe pertencia. Esta conclusão retira-se com facilidade dos factos que relatámos supra, sendo certo que, de acordo com as regras da experiência, não nos é possível chegar a outra conclusão. Ninguém gasta milhões que não lhe pertençam”.

José Sócrates vai ser julgado por corrupção

José Sócrates vai enfrentar a justiça. O ex-primeiro-ministro vai a julgamento por suspeita de cometer três crimes de corrupção, 13 crimes de branqueamento de capitais, e seis crimes de fraude fiscal. A decisão de levar Sócrates a julgamento por 22 crimes foi tomada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que reverteu parte da decisão do juiz Ivo Rosa que, em abril de 2021, pronunciou o ex-governante com seis crimes em autoria com o amigo Carlos Silva: três de branqueamento de capitais e três de falsificação de documento.

Mas há mais a enfrentarem a justiça, segundo a decisão da Relação. Ricardo Salgado, ex-líder do BES enfrenta três crimes de corrupção, oito crimes de branqueamento. Por seu turno, Zeinal Bava, ex-CEO da Portugal Telecom (PT), está acusado de um crime de corrupção, outro de branqueamento, e um terceiro por fraude fiscal. Henrique Granadeiro, ex-chairman da PT, enfrenta um crime de corrupção, dois crimes de branqueamento, dois crimes de fraude fiscal. Já o ex-ministro Armando Vara, vai a julgamento acusado de um crime de corrupção, um crime de branqueamento de capitais. Já a construtora Lena, está acusada de um crime de corrupção, três crimes de branqueamento de capitais, e seis crimes de fraude fiscal.

O juiz Ivo Rosa deixou cair quase todos os crimes deste processo, restando apenas 17 de um número inicial de 189. Do universo inicial de 19 pessoas e nove empresas, restaram apenas cinco indivíduos: José Sócrates, o empresário Carlos Santos Silva, Armando Vara, Ricardo Salgado e João Perna.

Agora, o ex-primeiro-ministro está acusado de três crimes de corrupção passiva, um por atos praticados no interesse do grupo Lena, outro por actos praticados no interesse do arguido Ricardo Salgado, relativamente a negócios do grupo PT, e um terceiro por “actos praticados no interesse dos arguidos Diogo Gaspar Ferreira e Rui Horta e Costa, com utilização das sociedades do grupo Vale do Lobo”.

Já Ricardo Salgado está acusado de três crimes de corrupção activa relativos a negócios do grupo PT e GES e os pagamentos a Sócrates, a Zeinal Bava e a Henrique Granadeiro. Sócrates disse ontem que não se conforma e que vai recorrer da decisão da Relação.

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