"A minha conduta foi totalmente incorreta e vergonhosa. Estou muito arrependida", afirmou, ao tribunal coletivo, a antiga responsável da contabilidade daquele município do norte do distrito de Leiria.
A arguida, que se demitiu da autarquia, está acusada pelo Ministério Público (MP) de quatro crimes de peculato, quatro de falsificação de documento e um crime de branqueamento, em coautoria.
Em julgamento, estão também o antigo chefe da Divisão Administrativa e Financeira, que controlava o fundo de maneio, e a ex-tesoureira. Ambos respondem por sete crimes de peculato, sete crimes de falsificação de documento e um crime de branqueamento, em coautoria.
Todos incorrem na pena acessória de proibição do exercício de função.
Segundo o despacho de acusação, o plano dos acusados, que remonta a 2013, passava pelo processamento informático das ordens de pagamento/tesouraria por parte da responsável da contabilidade, que eram depois enviadas ao chefe de divisão, que validava. Após esta validação, eram remetidas ao presidente da Câmara ou quem o estivesse a substituir, para despacho.
Depois, as ordens de pagamento eram enviadas para a tesouraria, sendo que a tesoureira ou alguém que a substituísse fazia a entrega, em dinheiro, das quantias nelas mencionadas, ao chefe de divisão, que o repartia em partes iguais pelos três, ainda segundo o MP.
As ordens referem-se, por exemplo, a "alegados pagamentos ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social", com supostas despesas da Administração Central do Sistema de Saúde, ou "relativas a cauções prestadas por fornecedores de serviços para garantia de obras, como se se reportassem a devoluções".
O MP acusou também o ex-chefe de divisão de ter falsificado documentos, tendo por base outros referentes a pagamentos à Conservatória do Registo Predial de Pedrógão Grande, agindo em concertação com a tesoureira.
Ainda em concertação com esta, abasteceu pelo menos 113 vezes o seu carro particular, mas fazendo "constar dos respetivos recibos matrículas de viaturas" da Câmara, ou em relação a despesas de refeições.
Este arguido apresentou, igualmente, "diversos recibos referentes à compra de medicamentos", fazendo constar que se destinariam à autarquia, em suposto conluio com as coarguidas.
Segundo o MP, os arguidos "assenhorearam-se, entre outros montantes não apurados", de 86.539,57 euros, segundo as contas feitas pela Lusa.
Perante o coletivo de juízes, a ex-responsável da contabilidade do município frisou que desconhecia por completo o fundo de maneio e afirmou não poder precisar por iniciativa de quem este plano foi desenvolvido, mas reconheceu que as suas dificuldades financeiras eram do conhecimento do então chefe de divisão.
A arguida assumiu a sua participação na elaboração e assinatura dos documentos, e "depois recebia o dinheiro".
Ao tribunal coletivo, adiantou que tentou ressarcir o município, por duas vezes, dos valores que o MP lhe imputa, mas não obteve resposta da Câmara.
Ainda de manhã, a antiga tesoureira também garantiu estar "profundamente arrependida", confessou parte dos factos e referiu que "desconhecia em absoluto qualquer uma das questões que estavam na génese" desta situação.
"Estou aqui com muita vergonha, confessando que participei no ato", adiantou, esclarecendo ter feito a reposição dos valores, na ordem dos 18 mil euros, ao município.
Hoje, foram ouvidas três testemunhas, com o julgamento a continuar no dia 05 de junho.