BE coloca no mesmo saco "toda a direita que é um exército contra as mulheres"

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02 jun, 2024 - 23:33 • Alexandre Abrantes Neves

Mais uma vez lado a lado, Mortágua e Catarina Martins jogam as fichas todas nos dicursos mais audazes desde o início da campanha. Para além das críticas à AD, há propostas para mudar "o sonho europeu" - e ainda quem cole o PS à extrema-direita.

Reportagem BE Alexandre Abrantes Neves - comício ao ar livre 2junho
Ouça aqui a reportagem da Renascença. Foto: Manuel De Almeida/Lusa

O Bloco de Esquerda (BE) replica a estratégia das legislativas e volta a colocar toda a direita no mesmo saco ao chamá-la de “um exército de guerra contra as mulheres”.

No discurso mais incisivo desde o início da campanha para estas europeias, a cabeça de lista voltou a trazer um tema querido do partido – os direitos das mulheres. Com uma plateia recheada na Quinta das Conchas, a antiga coordenadora bloquista igualou as bandeiras políticas de todas as forças à direita e sintetizou-as em poucas palavras: um “ataque” às “conquistas das mulheres” nas últimas décadas.

“Não podemos iludir-nos. A bandeira da direita dos dias de hoje é esse ataque: sentem que a igualdade ameaça privilégios e responde à violência. A direita está a transformar-se num exército de guerra contra as mulheres”, defendeu, poucos momentos antes de o relvado se encher de palmas.

Catarina Martins continuou e mudou o foco para a Europa. Colocou o ónus na postura do centro-direita europeu – nomeadamente, no Partido Popular Europeu (PPE), onde está incluída a Aliança Democrática – que “não espantou ninguém” por “escandalosamente admitir acordo com MelonI” ou por deixar que o húngaro Viktor Órban “ficasse até à 25.ª hora no PPE”.

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A candidata bloquista parece saber, porém, que esta estratégia de ataque funciona melhor dentro do que fora de portas – e, por isso, rapidamente cola o líder do PSD aos nomes mais sonantes da direita radical mundial.

“Nada disso é para nós uma questão estrangeira. Os aliados de Ventura, seja Milei, seja Trump, seja Meloni, seja Orban, tomam os direitos das mulheres como alvo. Os aliados de Montenegro querem aproximar-se dos aliados de Ventura, afirmando que se normalizaram e são democratas. Mas nós sabemos que quem quer espezinhar os direitos das mulheres não é democrata, é simplesmente alguém que despreza a humanidade”, condena.

E, depois de viajar subtilmente da política europeia para a nacional, Catarina Martins não deu mais nenhum passo atrás. Apesar de não ter referido a inclusão da interrupção voluntária da gravidez (IVG) na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, a bloquista puxou de novo um dos slogans que adotou nesta campanha – “estas eleições são sobre a nossa vida” – para envolver a plateia contra a Aliança Democrática – e nem o PPM ficou de fora.

“E se me dizem que aqui não vão mexer na lei do aborto, pois lembro-vos que o PSD e CDS, mesmo depois do referendo ter dito o que o país queria, votaram contra a lei que descriminalizava o aborto. Lembro-vos que, há dois meses, um dos dirigentes da coligação explicou que voltariam a fazer o mesmo truque. E lembro-vos que é só porque o PPM está escondido no sótão que não se repete a cena do macho ibérico”, sublinhou.

Europa "sim", mas diferente

Sempre juntas em pelo menos uma ação de campanha por dia, Mariana Mortágua encarou o batalhão bloquista na Quinta das Conchas – onde estavam figuras como o ex-coordenador, Francisco Louçã, ou o antigo líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares – para piscar o olho a um eleitorado que não é eurocético, mas que quer ver um novo funcionamento na UE.

O discurso de Mortágua apelou a todos aqueles que se reveem no projeto de paz da UE e que querem resolver as suas falhas – e, neste grupo, até entram figuras históricas da direita, como Freitas do Amaral.

“A paz que a Europa conseguiu criar para dentro, nunca existiu fora das suas fronteiras. Contra essas guerras levantou-se uma outra potência, a da opinião pública democrática e de uma esquerda corajosa, que foi de Freitas do Amaral a Maria de Lourdes Pintassilgo ou Mário Soares”.

A estratégia continuou, nomeadamente ao trazer um trunfo antigo para cima da mesa: a troika. A líder do partido diz “não perdoar” que Bruxelas tenha quebrado a “promessa de prosperidade” – e tenha trazido para Portugal, Irlanda e Grécia medidas de austeridade que atingiram “as populações mais vulneráveis”.

Do passado para o presente, Mortágua foi bem clara a dizer que “não desiste da Europa” – mas também a reforçar que o partido quer uma volta de 180 graus em alguns temas dentro da União.

“Não desistimos do reconhecimento da Palestina e do fim do genocídio e do apartheid. Não desistimos da cooperação na transição energética para o fim do fóssil. Não desistimos da integração dos migrantes que fogem da miséria. Não desistimos de uma política de juros que sirva a justiça fiscal. (…) Não desistimos de contratos com salário decente”, rematou.

Colar PS à direita – um prenúncio de estratégia?

Além de Mariana Mortágua e Cataria Martins, outros candidatos ao parlamento europeu também discursaram – caso do número 2 da lista, José Gusmão.

Num discurso mais morno do que os outros dois, o candidato foi o único a deixar críticas aos socialistas – e a falar constantemente das “convergências” entre PS e AD. Gusmão aposta numa nova estratégia e esvazia de importância o “espetáculo mediático” dos últimos dias entre Temido e Bugalho.

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“Sebastião exigiu que Marta pedisse desculpa, mas Marta disse: ‘não peço’. O espectador mais desatento poderá pensar que seria melhor que os candidatos debatessem as suas divergências. Mas esse debate arriscava-se a ser muito curto. É muito mais interessante que estes dois candidatos falem sobre as convergências – aliás, vimos nos debates uma sintonia comovente”, criticou.

E se as regras orçamentais e o não reconhecimento do estado da Palestina são sinais dessa aproximação, as críticas sobem de tom no que toca à posição do PS sobre o Pacto de Migrações e Asilo.

“Os representantes [têm de] explicar o mundo de diferença entre 'prender uma criança' e 'deter uma criança' – a primeira é inaceitável e a segunda é 'consequência de uma Europa aberta'. Este foi mais um dos passos que foram dados, seguindo o roteiro que tem sido definido pela extrema-direita europeia. Socialistas, liberais e direita estão hoje unidos na prossecução dessa agenda”, rematou.

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