Cenário pós-eleitoral para o Irão é "sombrio" - International Crisis Group

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"O prognóstico para a República Islâmica é sombrio: um Governo formado por uma minoria cada vez mais reduzida, prosseguindo objetivos ideológicos maximalistas que estão profundamente dessincronizados com os de uma maioria crescente", refere a organização não-governamental virada para a resolução e prevenção de conflitos.

Para o "think-tank", embora o governo minoritário não represente uma ameaça existencial iminente para o sistema, "é quase certo que o enfraquecerá ainda mais a longo prazo".

"A desconexão prenuncia fracassos contínuos na resposta aos desafios sociais, políticos e económicos e uma crise de legitimidade cada vez mais profunda para o país e respetivas instituições ostensivamente representativas", sustenta o ICG.

O esforço conservador para dominar todos os ramos do Governo no Irão, continua a ONG, é uma tentativa de "purificação" política, em que o regime foi eliminando elementos moderados da governação para criar ainda mais espaço para a próxima geração de adeptos da visão revolucionária do mundo.

Aliás, os conservadores reforçaram o controlo sobre as instituições religiosas, evidenciando o fosso crescente entre o Estado e a sociedade.

Os resultados oficiais da 12.ª eleição parlamentar desde a revolução de 1979 e da 6.ª votação para a Assembleia de Peritos, o órgão clerical nominalmente encarregado de selecionar o próximo líder supremo, deram a vitória clara aos conservadores, mas com uma afluência às urnas num mínimo histórico, "sinal de frustração generalizada e do ceticismo quanto à hipótese de mudança política através das urnas", prossegue o ICG.

As eleições, refere ainda, decorreram num contexto de graves desafios económicos, sociais, políticos e de segurança, bem como de dúvidas crescentes sobre quem sucederá ao atual líder supremo, o ayatollah Ali Khamenei, de 84 anos.

Quase três anos depois de os conservadores terem consolidado o controlo de todos os ramos do Governo, intensificaram-se as lutas internas nas suas fileiras.

O mesmo aconteceu com o descontentamento público, manifestado em repetidas rondas de agitação em massa, a mais recente das quais foi o protesto nacional "mulher, vida, liberdade", que eclodiu em setembro de 2022 devido à morte de uma jovem, Mahsa Amini, sob custódia da "polícia da moralidade". O Estado reprimiu violentamente os protestos, que abalaram o país durante meses.

Para o regime, sustenta a ONG, o Governo, as forças armadas e outras instituições "precisam de ser limpas de todos aqueles que consideram desleais ou ideologicamente instáveis".

"Estes sentimentos são antigos e vários organismos de controlo, como o Conselho dos Guardiães - que revê as listas eleitorais para eliminar aqueles que considera ideologicamente fora do alcance - intervieram durante anos para impedir o desenvolvimento dos aspetos republicanos do sistema. Mas estes esforços parecem estar a acelerar e os parâmetros de quem é considerado aceitável como candidato nas eleições nacionais estão a estreitar-se nos últimos quatro anos, à medida que a sucessão da Khamenei se aproxima", analisa o ICG.

"Passámos as fases iniciais de purificação e chegámos agora à fase de enriquecimento. As centrifugadoras políticas avançadas estão a girar à velocidade máxima", lembra a ONG, que cita as palavras de Abbas Abdi, um proeminente sociólogo iraniano.

Para o ICG, a consolidação do poder entre os elementos mais conservadores do regime é um "mau presságio" para a sua capacidade de enfrentar os crescentes desafios do Irão e o estado da economia continua deplorável, apesar de um crescimento modesto após uma década de queda.

A diplomacia que a poderia ajudar, assegurando o alívio das sanções dos Estados Unidos e de outros países, prossegue a análise do ICG, "parece moribunda", enquanto a corrupção e a má gestão "são generalizadas".

A orientação de Teerão para laços mais estreitos com a Rússia e a China ainda não produziu benefícios económicos tangíveis, refere o ICG, realçando que a inflação ultrapassou os 40% nos últimos três anos e o poder de compra caiu a pique, sem que se vislumbrem grandes melhorias.

"Na esfera política, o campo conservador dividido tem tido dificuldade em legislar eficazmente, não conseguindo aprovar projetos de lei fundamentais, incluindo os que promovem a transparência", lê-se na análise, em que o ICG destaca a "impopularidade" das restrições ao código de vestuário das mulheres e de outras medidas que não conseguem diminuir uma cada vez maior animosidade religiosa.

Neste e noutros domínios, refere o ICG, os decretos governamentais e as atitudes públicas são "cada vez mais dissonantes" e a tendência para suprimir a frustração sociopolítica, em vez de abordar as suas causas profundas, levou o antigo Presidente Mohammad Khatami a avisar que o sistema estava a "derrubar-se a si próprio", ao insistir em políticas impopulares, em vez de as repensar.

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