Compra de casa. Um mercado dinâmico mas que precisa de dedo do Estado

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Os preços das casas têm subido mas as vendas também. Apesar deste dinamismo, muitos não conseguem alcançar o objetivo de comprar uma casa. Setor não tem dúvidas que, sem ajuda estatal, muitos não conseguirão lá chegar.

Diz-se que o português tem muito a cultura da compra de casa e é certo que este investimento por parte dos portugueses tem aumentado ao longo dos anos. O mercado, diz quem sabe, está mais “dinâmico”, ainda que existam algumas falhas. E os preços, esses, continuam em constante crescimento, o que pode ser um problema para a carteira.

Os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE)_mostram que, no segundo trimestre deste ano, os preços das casas cresceram 7,8% em termos homólogos. Ainda assim, nesse período de abril a junho, foram transacionadas 37.125 habitações, no valor total de 7,9 mil milhões de euros, um aumento, face ao mesmo período do ano anterior, de 10,4% e 14,1%, respetivamente.

Ainda dados do gabinete de estatística referentes aos primeiros três meses deste ano, referem que o preço mediano dos alojamentos familiares em Portugal foi de 1.644 euros por metro quadrado, uma subida de 5% face ao mesmo período do ano anterior. A Grande Lisboa e o Grande Porto são das regiões que contam com o preço mediano mais elevado: 2.795 euros e 1.847 euros o metro quadrado, respetivamente. Isto em valores medianos. Ainda assim, a região do Porto encerra este top 5 porque antes, em segundo lugar está o Algarve (com 2.666 euros o metro quadrado), Região Autónoma da Madeira (2.046 euros o metro quadrado) e Península de Setúbal (1.847 euros o metro quadrado). A Grande Lisboa lidera a lista.

Olhando apenas para o município de Lisboa, o preço mediano é de 4.188 euros o metro quadrado. A freguesia que mais faz disparar este número é Marvila, a mais de seis mil euros o metro quadrado. A mais barata é Santa Clara, com 2.899 euros o metro quadrado (ver quadro).

No Porto, o valor mediano não chega aos 3000 euros o metro quadrado e a freguesia com o valor mais elevado é a União de Freguesias de Aldoar, Foz do Douro e Nevogilde: 3.956 euros o metro quadrado.

‘Um enorme antagonismo’

Paulo Caiado, presidente da Associação dos Profissionais das Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), diz que, atualmente, o mercado de compra de casa “é caracterizado por um enorme antagonismo, por posicionamentos totalmente opostos de quem compra uma casa”. E explica as suas palavras: “De um lado temos aqueles que já têm uma casa e que a vendem, para seguidamente enfrentar uma nova aquisição – e estes viram a sua casa a ter tido uma fantástica valorização nos últimos anos, e a terem, agora, uma dotação financeira que provavelmente nunca imaginaram, o que lhes dá segurança para enfrentar outro processo de aquisição”. No entanto, num “extremo oposto, temos quem não tem casa nenhuma e que tem enorme dificuldade em enfrentar os preços que se praticam no mercado”.

Na opinião do responsável, é “fundamental” encarar esta realidade encontrando “soluções que combatam a exclusão habitacional e permitir que as pessoas possam aceder a uma habitação e dar oportunidade a quem não tem poupanças sujeitas a valorização imobiliária possa aceder ou à compra ou arrendamento de uma casa”, o que, já chegou a defender, só pode acontecer com apoio estatal.

Já Beatriz Rubio, CEO_da Remax Portugal, diz que o mercado de compra e venda de habitação “encontra-se bastante dinâmico em resultado de um aumento da procura, sobretudo nos últimos meses, por jovens que cumprem um conjunto de requisitos que lhes permite, entre outros benefícios, uma isenção do IMT” (ver páginas 4-5).

Mas não é só. Beatriz Rubio recorda que também se tem registado uma “descida paulatina das taxas de juro sobre as novas operações de crédito à habitação, em paralelo com um aumento do volume de crédito concedido, estimulando ainda mais a procura”.

Mas nem tudo é um mar de rosas, até porque “como a oferta não tem acompanhado quer em diversidade quer em quantidade, com esta procura crescente, inevitavelmente, temos assistido a um aumento dos preços”. Por isso, a responsável pela Remax Portugal diz ser expectável “que este cenário dinâmico se mantenha nos próximos meses, mas é de alguma forma um sinal de preocupação para muitos especialistas, pois os aumentos sistemáticos do preço de metro quadrado tem tornado cada vez mais difícil a aquisição pelas famílias com mais parcos recursos e/ou que não cumprem os requisitos para serem beneficiadas”. Por outro lado, “apesar do mercado apresentar claros sinais de crescimento, há sempre vários riscos que podem por em causa a sustentabilidade a longo prazo”.

Ainda assim, apesar dos problemas, a Remax tem registado um crescimento. Quer isto dizer que “o mercado de compra/venda em Portugal nos dias de hoje encontra-se bastante ativo, sobretudo no segmento habitacional, em resultado de um crescimento da procura, algo que se deverá manter nos próximos meses”.

E o futuro? A tendência de dinamismo deve continuar nos próximos tempos como perspetiva ao i Ricardo Sousa, CEO da Century 21 Portugal. “O futuro da compra de casa em Portugal apresenta-se com uma expectativa moderadamente positiva”, diz, acrescentando que acredita que o setor “deverá continuar a crescer, impulsionado por um mercado de trabalho dinâmico e pela descida gradual das taxas de juro, que criam um clima de maior confiança para os portugueses procurarem soluções de habitação”. Mas há desafios que, na opinião de Ricardo Sousa, “não podem ser ignorados”.

O responsável explica quais são: “O maior obstáculo continua a ser a elevada taxa de esforço necessária para adquirir casa nos principais centros urbanos, como a Área Metropolitana de Lisboa, a Área Metropolitana do Porto e o Algarve, com Lisboa a destacar-se como a região mais pressionada”.

Para o CEO da Century21, é claro que o rendimento líquido das famílias “tem crescido a um ritmo muito lento, ficando claramente aquém dos nossos vizinhos espanhóis e muito abaixo do necessário para acompanhar a valorização acentuada das casas nos últimos anos”. Acrescenta que “a falta de oferta de imóveis nas zonas de maior procura representa um verdadeiro desafio para muitos jovens e famílias” e que há “um claro desajustamento entre a oferta existente e as necessidades e possibilidades destas gerações. O envelhecimento da população, a crescente concentração urbana e os baixos rendimentos médios líquidos exigem medidas estruturantes e urgentes para corrigir estas disparidades”, diz.

Entre as soluções que Ricardo Sousa considera necessárias está a revisão dos Planos Diretores Municipais “numa perspetiva metropolitana, de forma a otimizar o uso dos solos para permitir a construção de mais casas e infraestruturas públicas adequadas à população”, mas “a atualização dos códigos de construção também é essencial para implementar processos construtivos mais rápidos, ecológicos e económicos, que tornem a habitação mais acessível e ajustadas às necessidades das pessoas”. Adicionalmente, nota que “é crucial reforçar e modernizar as redes de transportes públicos, aumentando a frequência e abrangência, para aproximar as áreas com potencial de desenvolvimento habitacional dos centros urbanos e das zonas de trabalho e lazer”.

Na sua opinião, “só com uma visão integrada e de longo prazo, que envolva o Governo, as câmaras municipais, os institutos públicos, o setor privado e o mundo académico, conseguiremos criar as condições necessárias para um mercado habitacional equilibrado e sustentável”. Uma colaboração que, garante, “é fundamental para garantir que Portugal tem as casas que os seus cidadãos precisam, nas localizações certas e a preços acessíveis”.

‘É preciso construção nova’ Ainda que a uma escala mais pequena que os portugueses, os estrangeiros continuam a queres apostar na compra de imóveis em Portugal e há quem diga que essa tendência crescente faz aumentar os preços. Algo com que Rui Torgal, CEO_da ERA Portugal, não concorda. “O preço médio das casas em Portugal, de facto, continua a aumentar, mas não creio que essa subida tenha no turismo ou nos estrangeiros a sua principal causa”, diz, defendendo que “a principal explicação para este crescimento ininterrupto dos preços, está relacionada com o desequilíbrio existente entre a acentuada procura e a limitada oferta existente no mercado nacional” que é um problema “de há duas décadas a esta parte, quando praticamente deixou de haver construção nova, e agora demorará alguns anos a resolver”.

Rui Torgal diz que o setor tem vindo a “evoluir positivamente” e que essa tendência se tem “acentuado de forma significativa”. Uma tendência que entende dever-se ao contexto macroeconómico internacional. “A incerteza que dominou o arranque de 2023, com a guerra na Europa que levou ao disparar da inflação e das taxas de juro, contribuiu naturalmente para uma contração no consumo, que teve efeito imediato no imobiliário”. Contudo, “a estabilização verificada na 2ª metade do ano, apesar do eclodir de mais um conflito bélico, trouxe uma redução da inflação e uma consequente descida das taxas de juro, o que se traduziu em maior confiança e dinamismo no mercado”. Ou seja, “a procura voltou novamente a crescer e a oferta mantém-se praticamente igual”.

Por fim, Rui Torgal atira: “Por muito que o turismo tenha criado alguma pressão nos preços do imobiliário, sobretudo nos grandes centros urbanos, o principal motivo para o que temos vindo a assistir de há vários anos a esta parte é outro e já o referi acima: temos falta de construção nova em Portugal”.

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