As 130 buscas realizadas em várias partes do país a 24 de janeiro levaram à detenção do presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado, que já renunciou ao mandato, do chairman do Grupo AFA, Avelino Farinha, e do CEO da Socicorreia, Custódio Correia. Esta quarta-feira deverão ser conhecidas as medidas de coação.
Devem ser conhecidas esta quarta-feira as medidas de coação para os três detidos no âmbito das 130 buscas domiciliárias e não domiciliárias, que decorreram a 24 de janeiro, na Região Autónoma da Madeira (Funchal, Câmara de Lobos, Machico e Ribeira Brava), na Grande Lisboa (Oeiras, Linda-a-Velha, Porto Salvo, Bucelas e Lisboa) e, ainda, em Braga, Porto, Paredes, Aguiar da Beira e Ponta Delgada. O Ministério Público (MP) deve pedir prisão preventiva para Pedro Calado, presidente da Câmara do Funchal que renunciou ao mandato, o chairman do Grupo AFA, Avelino Farinha, e o CEO da Socicorreia, Custódio Correia.
O que dizem os advogados sobre a proposta do Ministério Público de prisão preventiva para os detidos?
Os advogados de Pedro Calado e de Custódio Correia, Paulo Sá e Cunha e André Navarro de Noronha, discordam da decisão.
“Não se justificam neste caso medidas privativas da liberdade. Isso significa que não se justifica nem uma medida de prisão preventiva, nem uma medida de obrigação de permanência na habitação”, disse Paulo Sá e Cunha.
Quando questionado sobre os argumentos utilizados pelo MP para a aplicação da medida de coação mais gravosa, mais concretamente o perigo de fuga, Sá e Cunha respondeu que o MP pode “alegar o que quiser”.
Já André Navarro de Noronha defendeu que “não há factos e os princípios da proporção, da proporcionalidade, da necessidade da adequação em qualquer cenário, com o que lá está, não implicam nem permitem o decretamento ou uma promoção de, por exemplo, prisão preventiva”.
O que esteve na origem das buscas?
O Departamento Centro de Investigação e Ação Penal (DCIAP) confirmou que as investigações, das quais resultaram as buscas, estão relacionadas com suspeitas relativas a adjudicações em concursos públicos que envolvem “várias centenas de milhões de euros”. A mesma entidade diz que estão em causa factos ocorridos a partir de 2015, suscetíveis de consubstanciar crimes de atentado contra o Estado de direito, prevaricação, recebimento indevido de vantagem, corrupção passiva, corrupção ativa, participação económica em negócio, abuso de poderes e de tráfico de influência.
Quais são as suspeitas do DCIAP?
O DCIAP esclareceu que as suspeitas recaem sobre titulares de cargos políticos do Governo Regional da Madeira e da Câmara Municipal do Funchal suspeitando-se que “tenham favorecido indevidamente” algumas sociedades/grupos em detrimento de outras ou, em alguns casos, de que tenham “exercido influência” com esse objetivo.
Estas investigações estão ligadas à Região Autónoma da Madeira e incidem, sobretudo, sobre a área da contratação pública, essencialmente sobre o “elevado número” de contratos de empreitada celebrados pelo Governo Regional da Madeira e várias entidades públicas da Região Autónoma com empresas da região.
Outra das suspeitas é de que as sociedades visadas tenham tido “conhecimento prévio” de projetos e dos critérios definidos para a adjudicação, assim como “acesso privilegiado” às propostas e valores apresentados pelas suas concorrentes diretas nos concursos, o que lhes terá possibilitado a apresentação de “propostas mais vantajosas e adequadas aos requisitos” pré-determinados.
Estão também a ser investigados um conjunto de projetos aprovados na Região Autónoma da Madeira, ligados às áreas do imobiliário e do turismo, que envolvem contratação pública regional e/ou autorizações e pareceres a serem emitidos por entidades regionais e municipais, relativamente aos quais se suspeita de “favorecimento dos adjudicatários e concessionários selecionados, de violação de instrumentos legais de ordenamento do território e de regras dos contratos públicos, nalguns casos com o único propósito de mascarar contratações diretas de empresas adjudicatárias”.
O DCIAP disse também que existem suspeitas de pagamento pelo Governo Regional da Madeira a uma empresa de construção e engenharia da região de “elevados montantes”, a coberto de uma transação judicial num processo em que foi criada a aparência de um litígio entre as partes, bem como suspeitas sobre adjudicações, pelo Governo Regional da Madeira, de contratos públicos de empreitadas de construção civil, sobre os quais o Tribunal de Contas levantou dúvidas e pediu esclarecimentos.
E a investigação inclui também atuações que visariam “condicionar/evitar” a publicação de notícias prejudiciais à imagem do Governo Regional em jornais da região, em moldes que são suscetíveis de consubstanciar “violação” da liberdade de imprensa.
“Investigam-se, ainda, benefícios obtidos por titulares de cargos políticos, por causa dessas funções, que ultrapassam o socialmente aceitável. Em causa estão factos ocorridos a partir de 2015, suscetíveis de consubstanciar crimes de atentado contra o Estado de direito, prevaricação, recebimento indevido de vantagem, corrupção passiva, corrupção ativa, participação económica em negócio, abuso de poderes e de tráfico de influência”, disse o DCIAP.
Que consequências já existiram devido às buscas?
Estas buscas já levaram à constituição do presidente do Governo Regional da Madeira, Miguel Albuquerque, como arguido.
Como resultado das buscas, Albuquerque já renunciou ao cargo de presidente do executivo madeirense e Pedro Calado renunciou à presidência da Câmara Municipal do Funchal tendo sido substituído por Cristina Pedra, a anterior vice-presidente.
Como reagiram os partidos?
Entre os partidos que asseguram a maioria absoluta o PAN começou por defender que Albuquerque não tinha condições para continuar a presidir o executivo madeirense, mas que aceitaria manter o acordo de incidência parlamentar com o PSD caso fosse indicada outra pessoa para o cargo.
Foi esta posição do PAN que levou a que Albuquerque renuncia-se ao cargo depois de ter defendido que não se iria demitir.
Albuquerque oficializou esta renúncia junto do Representante da República, Ireneu Barreto, que acabou aceite.
O PAN, após Albuquerque ter renunciado ao cargo, defendeu também que viabilizaria a continuidade de Albuquerque até à aprovação do Orçamento da Região.
O CDS-PP, quando oficializada a renúncia de Albuquerque, defendeu que Albuquerque não tinha condições para continuar como presidente do executivo madeirense pelo que deveria ser formado um novo governo, com liderança indicada pelo PSD, com um novo programa e orçamento.
O PSD defendeu estar em condições de formar um novo governo, contudo até ao momento ainda não é conhecido nem quem irá presidir a esse executivo nem os restantes membros. Os sociais democratas reuniram o seu Conselho Regional, da qual se esperava que saísse o nome do sucessor de Albuquerque, mas tal acabou por não se suceder.
Da parte dos partidos da oposição tem sido defendida a necessidade de eleições antecipadas. Esse pedido já foi feito por PS, Juntos pelo Povo (JPP), Bloco de Esquerda (BE), Iniciativa Liberal, Chega, PCP.
O PS e o Chega apresentaram moções de censura contra o executivo madeirense contudo estas acabaram por não serem debatidas devido à oficialização da demissão de Albuquerque e queda do executivo. O Governo Regional da Madeira encontra-se em gestão. Caiu também a discussão da proposta de Orçamento Regional, para 2024, que estava prevista para fevereiro.