Dívida pública cai mas continua a fazer soar alarmes

2 meses atrás 72

Analistas referem que ‘’economias onde o Estado intervém mais’, nomeadamente em apoios sociais têm maiores dificuldades em controlar as despesas. E o resultado final fala por si e Portugal não escapa.

A dívida pública tanto na Zona Euro como na União Europeia tem vindo a cair. Os dados mais recentes são do Eurostat e dizem que, no 4º trimestre do ano passado, a dívida pública em percentagem do produto interno bruto (PIB) no conjunto dos países da Zona Euro  situou-se em 88,6% (89,6% no 3º trimestre de 2023) e na UE27 situou-se em 81,7% (82,4% no 3º trimestre de 2023). Em relação ao período homólogo foi registada uma quebra de 2,2 p.p. (pontos percentuais) da dívida pública da Zona Euro e uma diminuição de 1,7 p.p. na UE27. Em Portugal, a dívida pública em percentagem do PIB situou-se em 99,1% (112,4% no 4º trimestre de 2022 e 107,5% no 3º trimestre de 2023).

Comparando Portugal com os restantes países da Zona Euro, Paulo Monteiro Rosa, economista do Banco Carregosa, ‘aplaude’ o progresso das contas públicas, «corroborado pela diminuição do rendimento do tesouro português em relação ao benchmark europeu, a Alemanha, sendo atualmente esse spread de 65 pontos base no que toca às obrigações soberanas a 10 anos». Já a França tem uma diferença superior, de 70 pontos base, tal como todos os países periféricos do mediterrâneo (Espanha 82 pontos, Itália 143 e Grécia 110). «Apenas países como a Dinamarca, a Finlândia, a Irlanda, a Holanda e a Áustria apresenta uma diferença menor que a dívida portuguesa face à dívida de referência, a alemã», refere o economista.

Já os analistas da XTB adiantam que Portugal continua acima da média europeia em termos de dívida pública em relação ao PIB, explicando que «apesar de ter conseguido reduzir significativamente os níveis de endividamento, ainda assim permanece acima dos pares europeus como França (98,1%) e Alemanha (66,5%)». No entanto, quando comparamos a evolução da dívida pública nacional com os restantes países do sul, «vemos que estamos consideravelmente melhores do que a Grécia (161,9%) e Itália (142%)».

Sobre os países que fecharam 2023 com valores mais altos e mais baixos face a Portugal, os analistas defendem que trata-se principalmente da maneira como o Estado está implementado na economia, uma vez que a sua intervenção «tem benefícios e malefícios». E acrescentam:  «Economias onde o Estado intervém mais com infraestruturas e apoios sociais tem por norma uma dificuldade acrescida para controlar as suas despesas, já que a própria economia depende do Estado. Este problema pode ficar mais complicado em alturas que essas economias não conseguem aumentar a sua capacidade produtiva, nesses casos o peso da dívida fica cada vez mais relevante». Por outro lado, defendem Henrique Tomé e Vítor Madeira, «países menos interventivos ou com capacidades superiores para gerar maior produção têm menos dificuldade em controlar a sua dívida». Posteriormente, «também temos de olhar para a cultura do país e como as políticas públicas são implementadas. Existem países com culturas orçamentais mais restritas, onde a população tem maior enfoque nisso. Depois existem países onde a população não se importa com a dívida contraída e vive mais o dia-a-dia sem pensar nas gerações vindouras», explicam ao nosso jornal.

O que esperar daqui para a frente? Paulo Monteiro Rosa não tem dúvidas: «Uma desaceleração do ritmo de descida do rácio da dívida pública em relação ao PIB nominal, ditada pelo abrandamento das receitas do Estado, determinado não só pelo desagravamento fiscal, sobretudo em sede de IRS, mas também por um contributo cada vez menor da inflação, à medida que esta regressa gradualmente aos níveis dos 2%». A isto, junta-se o acréscimo de despesa «ditado pela entrada do novo executivo, correspondendo ao seu programa eleitoral, abrandará o significativo ritmo de descida da dívida pública observado nos últimos dois anos», diz.

Também Henrique Tomé e Vítor Madeira, analistas da XTB, preveem um abrandamento. «Portugal tem conseguido baixar significativamente os níveis de dívida pós-Covid, contudo daqui para a frente deveremos começar a ver um abrandamento neste ritmo de redução». E, ao Nascer do SOL, explicam: «Se olharmos para uma das métricas mais relevantes, que compara o rácio da dívida pública em função do PIB, esta deverá começar a estagnar ou eventualmente até subir ligeiramente tendo em conta que o crescimento económico no país (e em toda a zona euro) tem estado a diminuir nos últimos trimestres e mesmo que os gastos públicos se mantenham constantes, o facto de haver uma alteração no valor do numerador (PIB) vai influenciar o resultado deste rácio». Ainda assim, dizem, «não deve ser visto como um sinal de alerta, mas a evolução da dívida pública deverá ser acompanhada de perto ao longo dos próximos meses».

Quanto ao possível aumento da despesa e redução das receitas, Paulo Monteiro Rosa diz que poderão desacelerar o ritmo de descida do rácio da dívida pública face ao PIB nominal, «mas o principal contributo para a forte diminuição desse rácio nos últimos dois anos foi a elevada inflação, e esse benefício para as contas públicas irá desaparecer gradualmente, à medida que a estabilidade de preços regressa ao seu normal de 2%».

Por sua vez, os analistas da XTB apontam que as ‘contas certas’ «irão estar sempre do equilíbrio que o Governo consegue garantir entre a despesa e as receitas do Estado, pelo menos a curto prazo». No entanto, defendem que esta lógica poderá «não se aplicar obrigatoriamente a longo prazo, dependendo de como o Estado está a utilizar esse capital para gerar riqueza no futuro». Por esse motivo, «poderá ser imprudente fazer uma avaliação das políticas adotas apenas com base na capacidade (ou não) de o Governo manter as ‘contas certas’».

As previsões do FMI

Esta semana, o Fundo Monetário Internacional (FMI) alertou que o IRS Jovem pode vir a provocar uma «perda considerável de receita», defendendo ainda ser incerta a eficácia desta medida para travar a emigração de jovens. «As taxas preferenciais de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares com base na idade provocarão uma perda considerável de receita […], sendo incerta a sua eficácia na limitação da emigração de jovens», alerta a instituição liderada por Kristalina Georgieva.

E deixa outros alertas para Portugal ao defender que apesar da meta do Executivo – que prevê um excedente entre 0,2% e 0,3% – ser «apropriada», há riscos a ter em conta no orçamento do próximo ano. «Qualquer novo relaxamento da posição orçamental arriscar-se-ia a reacender a inflação», diz o FMI, que defende que «os novos cortes de impostos e aumentos de despesa planeados devem por isso ser prudentemente desenhados para garantir que são consistentes com o cumprimento das metas ou que são compensados por outras medidas».

O Nascer do SOL tentou perceber junto destes especialistas o que significam os alertas do FMI que até está mais otimista e reviu em alta a projeção para a economia portuguesa e espera agora um crescimento de 2% este ano e 2,25% no próximo. «A economia norte-americana ainda mostra alguma resiliência e houve no início do ano uma recuperação da economia chinesa e da Zona do Euro. Este atual cenário externo mais favorável pode beneficiar uma economia muito aberta como a nossa, continuando a estimular as receitas do turismo nacional, um dos principais contributos para sustentar o nosso crescimento económico acima da média da Zona Euro, a par do aumento da população empregada», defende Paulo Monteiro Rosa.

Já Henrique Tomé e Vítor Madeira defendem que as «grandes entradas de nova população ativa, em conjunto com a explosão do turismo após a pandemia, parecem ser as razões mais prováveis para esta revisão do FMI».

Sobre os alertas em relação ao IRS jovem, Paulo Monteiro Rosa defende que, ao acontecer, «é uma perda de receita significativa, não se sabendo bem a sua eficácia». Já os analistas da XTB dizem que esta decisão «passou por uma tentativa de segurar os jovens no país, visto que o país tem perdido mão de obra qualificada ao longo dos últimos anos, representando uma grande fatia da população jovem».

Ler artigo completo