Eleições EUA. O que pode mudar

2 horas atrás 26

A onze dias das eleições que definirão a posição dos EUA no futuro já há americanos a votar. A corrida mantém-se renhida e sem alterações nas sondagens. As campanhas dão o tudo por tudo.

As eleições americanas estão a menos de duas semanas e há já americanos a votar de forma antecipada. É uma eleição que coloca frente-a-frente dois candidatos, e respetivas equipas, diametralmente opostos. E se a diferença entre Donald Trump e Kamala Harris é evidente, a diferença de ambos com os próprios partidos, pelo menos, em relação ao que têm representado nas últimas décadas, é também algo de assinalar.


Será uma eleição em que os eleitores encontrarão no boletim de voto, além de outros candidatos com expressão residual, duas ideias totalmente diferentes de América, seja no seu funcionamento interno, na sua segurança, na economia ou até na própria bússola moral.


Ainda assim, a nível internacional, o panorama não será muito diferente a nível económico, já que Joe Biden e Kamala Harris pouco mudaram quanto à política comercial que tinha sido colocada em prática durante a presidência Trump. A diferença está na publicidade que ambos fazem do protecionismo, com o republicano a vangloriar-se e com os democratas a evitar falar do tema.


No que às guerras diz respeito, tanto na Ucrânia como no Médio Oriente, ambos abordam a questão de forma pouco semelhante, principalmente no que concerne à invasão russa da Ucrânia. O que é certo é que, e como escreveu Henrique Burnay no ensaio O Mal está feito para o jornal i, independentemente de quem ocupar a Sala Oval em janeiro de 2025, os Estados Unidos estarão inevitavelmente mais afastados da Europa do que aquilo que estão atualmente.

As sondagens


Na edição de 11 de outubro, foi apresentado no Nascer do SOL um panorama geral das sondagens, revelando, sem surpresas, que o equilíbrio tem sido a palavra dominante nesta corrida. E, passadas duas semanas, as sondagens mantêm-se praticamente inalteradas, com a situação nos swing-sates, o conjunto de sete Estados decisivos, a continuar totalmente em aberto.
Contudo, o Polymarket, um mercado de previsões onde é possível apostar num variado leque de assuntos, tem vindo a ganhar popularidade por apresentar números claramente desequilibrados. Na plataforma, onde o volume de apostas na eleição americana ronda os 2,3 mil milhões de dólares, Trump lidera com 66% e, Elon Musk, CEO da rede social X e parte integrante da equipa do ex-Presidente, disse, de forma pouco surpreendente, que o Polymarket é «mais preciso que as sondagens, uma vez que há dinheiro real em cima da mesa».


É algo que só se saberá no rescaldo das eleições, mas as sondagens, ao que tudo indica, deverão estar mais perto do resultado final do que o Polymarket.

A política externa


Se é verdade que a política externa não é, de todo, uma prioridade para os eleitores americanos – apenas 2% considera que os assuntos externos são a questão mais importante, segundo números da Statista em colaboração com a YouGov -, também é verdade que o papel dos Estados Unidos no futuro próximo é fundamental para a ordem internacional liberal num mundo que está em ebulição.


Donald Trump gera controvérsia na situação ucraniana, e Kamala Harris tem no Médio Oriente uma bota difícil de descalçar. O republicano já garantiu, bem ao seu estilo e em várias ocasiões, que colocará um ponto final na guerra em solo europeu em 24 horas, e até antes de se tornar líder do mundo livre novamente. A questão que inevitavelmente se coloca é: como?
A abordagem simplista do ex-presidente, que acredita numa resolução que passa por sentar à mesa Volodymyr Zelensky e Vladimir Putin, não deixa espaço para uma análise precisa. As suas intenções de forçar os restantes membros da NATO a cumprir com o limite mínimo de 2% em despesas de defesa estabelecido pala aliança atlântica são bem conhecidas, tal como o corte de financiamento aos ucranianos – o que, aliás, já foi feito através de um bloqueio de meses no Congresso orquestrado pela ala mais afeta ao movimento MAGA.


Mas é através do seu companheiro de corrida, J. D. Vance, que se pode entender melhor o plano de resolução para o conflito na Ucrânia. Vance propõe que os russos se apoderem do território até onde já avançaram – incluindo Luhansk, Donetsk, Mariupol e toda a zona da Crimeia – e que seja estabelecida uma zona desmilitarizada ao longo das atuais linhas de batalha. A Ucrânia teria a garantia de soberania territorial na área restante e a Rússia receberia também garantias de neutralidade por parte da Ucrânia. «[A Ucrânia] não se junta à NATO nem a outra qualquer instituição aliada (…) Penso que, em última análise, é a isso que se parece [o plano de paz]».
Como seria de esperar, os críticos acusam o ticket republicano de ser um apaziguador e de estar a entrar no jogo de Vladimir Putin, mas Mark Rutte, o novo Secretário-Geral da NATO já reafirmou, durante a visita a solo ucraniano, que a Ucrânia continua a ser uma «prioridade máxima da aliança». O próprio Zelensky utilizou uma camisola onde podia-se ler-se «Make Russia Small Again», numa referência claramente provocatória ao slogan de Donald Trump (Make America Great Again), quando se dirigiu à nação na quarta-feira. Kamala Harris, ao que tudo indica, dará continuidade à política da atual administração.


Porém, no conflito do Médio Oriente, Harris está numa posição complexa. O Partido Democrata, principalmente desde que a vice-presidente assumiu a candidatura, está cada vez mais à esquerda, e a questão palestiniana pode alienar tanto a franja moderada quanto a mais radical. É precisamente por isto que a ambiguidade tem sido rainha nos discursos de Kamala quanto a este assunto.


A candidata democrata tem-se escondido atrás do cessar-fogo, esquecendo todas as variáveis que estão agora em cima da mesa no tabuleiro geopolítico do Médio Oriente – e também da índole dos interlocutores. Harris parece esquecer também que o Hamas rejeitou uma proposta de cessar-fogo da sua própria administração, e a resolução do conflito não passa por uma política externa tão simples quanto Kamala tem dado a entender.
As eleições do próximo dia 5 de novembro podem mudar o rumo da política externa americana, e do mundo.

Um ‘show’ democrata


A campanha do Partido Democrata ganhou outra vida quando Kamala, sem passar pelo processo das primárias, assumiu a candidatura do partido. O Congresso Democrata ajudou a dar um boost nas sondagens em agosto, e Harris, em conjunto com o seu candidato à vice-presidência, Tim Walz, apresentavam uma forma de fazer política com base nas boas vibrações, conhecida como ‘Politics of joy’.


Mas o ímpeto foi-se esbatendo e os candidatos democratas começaram a demonstrar as suas fragilidades, principalmente nos debates e em entrevista com mais profundidade. Ao ouvir a atual vice-presidente, não fica claro se a administração que se propõe a liderar em caso de vitória será uma continuação da atual ou um virar de página, e a campanha democrata tem jogado o seu mais importante trunfo, Barack Obama, de forma frequente nos últimos dias.


O ex-Presidente chegou até a cantar uma música do rapper Eminem – que mais tarde apareceria no palco para demonstrar o seu apoio a Kamala Harris. Um ‘show’ na reta final, um tudo por tudo nos últimos dias de campanha de uma eleição que será fundamental para o futuro dos Estados Unidos e até do próprio Ocidente.

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