Puigdemont vive na Bélgica desde 2017 para escapar à justiça espanhola, depois de ter protagonizado naquele ano uma declaração unilateral de independência da Catalunha.
Seis anos depois, em 2023, negociou uma amnistia com o governo espanhol do socialista Pedro Sánchez em troca de lhe viabilizar um novo mandato como primeiro-ministro. O seu partido, o Juntos pela Catalunha (JxCat), elegeu sete deputados nas eleições espanholas do ano passado que, inesperadamente, se tornaram imprescindíveis para Sánchez continuar no poder, com o socialista a ceder na concessão de uma amnistia que sempre tinha rejeitado.
A amnistia está em fase final de aprovação no parlamento espanhol e Puigdemont, que está a fazer a campanha das eleições autonómicas de domingo a partir de França, confia regressar em breve à Catalunha, já protegido pela medida e com os votos de que precisa para ser de novo investido presidente do governo regional por uma 'geringonça' independentista no parlamento catalão.
Segundo as últimas sondagens, conhecidas na segunda-feira, Puigdemont será o segundo mais votado no domingo, atrás dos socialistas mas à frente do outro grande partido independentista, a Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), atualmente no governo regional.
Puigdemont mantém ou recuperou um nítido poder de mobilização junto de eleitorado independentista, num fenómeno que o professor de Ciência Política Oriol Bartomeus, da Universidade Autónoma de Barcelona, admite ser difícil de entender fora da Catalunha ou mesmo por alguns setores dentro da região.
"É preciso entender o que foi o 'process' [a tentativa de autodeterminação que culminou com os acontecimentos de 2017]. Uma parte considerável daquele que era um voto nacionalista catalão de centro-direita radicalizou-se e comprou a ideia de que a independência era possível. Uma parte já a abandonou e cansou-se. Mas outra continua muito metida na dinâmica do 'process'", disse à Lusa o politólogo.
Segundo Oriol Junqueras é sobretudo um eleitorado já mais velho, que se informa essencialmente através de meios de comunicação social públicos em catalão, ligados à administração autonómica, e para quem Puigdemont "continua a ter essa mística do presidente no exílio".
"É muito nostálgico. Para uma parte das pessoas, o 'process' foi ma revolução maravilhosa" e Puigdemont consegue ativar esse sentimento e mobilizar esse eleitorado que se recorda de 2017 quando o vê e lhe ouve um discurso que, apesar das negociações com o governo espanhol, "mantém a mística da confrontação" com o poder central, acrescentou.
"São pessoas que continuam a acreditar que houve uma revolução pacífica, democrática, contra um Estado fascista", diz Oriol Bartomeus.
Para o analista político e ex-jornalista Josep Martí Blanch, "a Puigdemont saiu-lhe a lotaria" no ano passado.
"Estava morto, era um cadáver político, e com os sete deputados que elegeu nas eleições espanholas conseguiu ressuscitar em grande", diz à Lusa.
A amnistia que conseguiu sem "diminuir a pressão" e sem passar pela prisão, como aconteceu com outros separatistas da ERC - e depois de os socialistas sempre a terem negado, criou "a ficção de que o tempo acabou por lhe dar razão e as pessoas gostam de estar ao lado dos campeões", acrescenta Josep Marti Blanch.
Para o seu eleitorado, segundo este analista, Puigdemont "protagonizou a história do herói" e "mantém um discurso muito agressivo" que é mobilizador para quem o apoia.
Neste discurso, reivindica liderar o único partido independentista com poder de pressão sobre o Estado espanhol e o único que "dá dores de barriga" a Madrid, maas agora sem estabelecer calendários e objetivos concretos para a independência ou mesmo para um referendo de autodeterminação.
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