Entre mentiras e insultos, Trump aposta em três debates para travar Kamala Harris

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Eleições nos EUA

08 ago, 2024 - 23:54 • João Pedro Quesado

O candidato republicano recuou e aceita debater fora da Fox News. A conferência de imprensa foi marcada pelo habitual dilúvio de mentiras, e continuou a preparar terreno para rejeitar o resultado das eleições se perder.

Donald Trump quer agora três debates contra Kamala Harris em setembro. Depois de recusar debater sem ser na "Fox News", o candidato do Partido Republicano nas eleições presidenciais de 2024 usou uma conferência de imprensa para confirmar um debate a 10 de setembro - além de voltar a questionar a etnia da vice-presidente dos Estados Unidos da América (EUA) e de insultar judeus que queiram votar no Partido Democrata.

Numa conferência de imprensa na sua residência em Palm Beach, na Flórida - onde tem passado esta semana, sem fazer comícios de campanha -, Donald Trump disse ter concordado com o debate de 10 de setembro, na ABC, e que quer debates a 4 de setembro, na Fox News, e 25 de setembro, na NBC.

Trump passou as últimas semanas a sugerir que não iria debater com Kamala Harris na ABC, um confronto que foi marcado ainda quando Joe Biden era o presumível candidato do Partido Democrata às eleições de 5 de novembro. Com desvantagem nas sondagens, a campanha de Trump terá mais interesse em realizar debates, procurando desestabilizar a candidatura de Harris.

Kamala Harris falou à imprensa no Michigan, na sede do sindicato dos Trabalhadores de Automóveis Unidos (UAW), pouco depois de Donald Trump terminar a conferência de imprensa, mas não reagiu ao proposto calendário de debates. A ABC confirmou que as duas campanhas concordaram debater a 10 de setembro.

Trump aproveitou a conferência de imprensa para voltar a atacar Kamala Harris com base na etnia, declarando que a vice-presidente “desrespeita” tanto a população negra como com ascendência indiana por ter origens nas duas comunidades.

Donald Trump também parece continuar a preparar terreno para declarar qualquer derrota na eleição de novembro como um resultado manipulado, ao afirmar que a nomeação de Kamala Harris é “inconstitucional”.

Quando Joe Biden desistiu da recandidatura, ainda era apenas o presumível nomeado do Partido Democrata à Casa Branca: apesar de as votações nas eleições primárias no partido já terem sido concluídas, o processo ainda não tinha sido encerrado através da votação dos delegados eleitos por cada estado.

Trump repetiu ainda um dos seus maiores êxitos, declarando que “ninguém falou para multidões maiores do que eu” - nem Martin Luther King Jr., alegou, na marcha de 1963 em Washington D.C., quando falou para cerca de 250 mil pessoas, de acordo com a agência responsável pelos parques dos EUA. O comício que deu origem ao ataque de 6 de janeiro de 2021 teve 53 mil pessoas, segundo a comissão especial da Câmara dos Representantes que investigou os acontecimentos desse dia.

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A conferência de imprensa contou com pelo menos 11 mentiras: ninguém morreu no ataque de 6 de Janeiro de 2021 ao Capitólio (sete pessoas morreram, quatro durante o ataque); que Harris quer tirar as armas aos norte-americanos; que tem o apoio da “vasta maioria do país” (apesar de nunca ter tido a maioria dos votos numa eleição); que os democratas estão a fazer entrar migrantes para que estes votem neles; que “vão destruir a Segurança Social”; que “toda a gente vai ser forçada a comprar um carro elétrico”; que aprovou o maior corte de impostos “da história”; e sobre os preços dos combustíveis.

E mais: que nenhum soldado foi atingido pelos talibã depois de Trump ter falado com o líder do grupo, em março de 2020 (morreram 13 soldados, segundo o “The New York Times); que o julgamento em Nova Iorque, onde foi condenado, foi controlado pelo Departamento de Justiça; e que os democratas defendem o aborto até ao nono mês e depois do nascimento da criança.

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Os insultos, mentiras e estilo caótico de Trump não são novidade, e não deixaram de estar presentes em todos os comícios desde que o ex-Presidente saiu da Casa Branca, no final de janeiro de 2021. Mas, se enquanto Joe Biden era o candidato a mensagem era clara e focada nos efeitos da inflação, desde que Kamala Harris substituiu o atual Presidente que tem havido menos coerência e mais ataques.

Um exemplo foi o questionar da legitimidade de Harris se dizer afro-americana por também ter raízes indianas, na semana passada. Logo a seguir, num comício no passado sábado, Trump optou por atacar o governador republicano da Geórgia, Brian Kemp, por não repetir as mentiras sobre fraude eleitoral no estado em 2020 - o que voltou a fazer esta quinta-feira.

As sondagens têm mostrado um aumento consistente do apoio a Kamala Harris. Uma sondagem da Ipsos publicada esta quinta-feira mostra Harris com cinco pontos de vantagem na votação nacional (42% para 37%). Numa sondagem da mesma empresa aos eleitores dos sete estados decisivos, Harris lidera globalmente, mas o resultado é um empate técnico.

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Vários agregadores de sondagens mostram Harris a aproximar-se e até a ultrapassar Trump no voto nacional global, com vantagens a rondar os dois pontos percentuais.

Apesar disso, a aproximação pode não ser suficiente: a vantagem natural que o sistema do Colégio Eleitoral dá ao Partido Republicano cria hipóteses reais, de quase 20%, de este vencer uma eleição para a Casa Branca mesmo com uma desvantagem de três a quatro pontos percentuais na votação global nacional - que equivalem a vários milhões de votos. Em 2016, Hillary Clinton perdeu apesar de conquistar a votação nacional por 2,1 pontos, o que equivaleu a mais de 2,8 milhões de votos de vantagem.

A vantagem inerente dos Republicanos neste sistema eleitoral surge devido à distribuição dos votos eleitorais, que é igual à soma do número de deputados de cada estado na Câmara dos Representantes ao número de senadores, que são sempre dois por estado. A soma dos dois senadores reforça o poder dos muitos estados menos populosos, que tendem a votar no Partido Republicano, e tem um efeito insignificante nos estados maiores, onde os democratas tipicamente vencem (com a exceção do Texas e da Flórida).

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