Entrevistámos Markus Haupt. O gestor que tem 10 mil milhões para transformar a SEAT

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Markus Haupt, foi um dos responsáveis pela implementação do Volkswagen T-Roc na Autoeuropa e agora tem outro desafio: transformar a produção da SEAT S.A. de alto a baixo.

Mesmo aqui ao lado, em Espanha, a SEAT S.A. tem em curso o maior investimento da história da indústria automóvel espanhola. O objetivo é simples: transformar o país vizinho num centro europeu de mobilidade elétrica.

Trata-se de um projeto de dimensões superlativas, que prevê um investimento total que ascende aos 10 mil milhões de euros. E no epicentro desta transformação está um homem: Markus Haupt, vice-presidente de Produção e Logística da SEAT S.A. O gestor a quem a Grupo Volkswagen confiou um dos seus projetos mais importantes das últimas décadas.

Em entrevista à Razão Automóvel, este gestor com mais de 20 anos de experiência internacional no Grupo Volkswagen, explicou-nos como é que vai gerir este projeto cujo impacto direto na economia espanhola vai rondar os 2,1 mil milhões de euros.

SEAT S.A. Martorell© SEAT S.A. Só em Martorell (Barcelona), a principal fábrica da SEAT e CUPRA, será feito um investimento de três mil milhões de euros, o dobro do que a SEAT S.A. investiu há mais de 30 anos para a construção desta unidade de produção.

Um gestor que também já teve uma ligação direta à fábrica da Autoeuropa, em Palmela. Markus Haupt foi o gestor do projeto do Volkswagen T-Roc, o modelo que atualmente sai todos os dias das linhas de produção da maior fábrica automóvel em Portugal.

Mais recentemente, participou ativamente na conversão de todo o grupo alemão para a produção de veículos elétricos. Em setembro de 2022 foi nomeado membro do Conselho de Produção e Logística da SEAT S.A. para impulsionar a transformação da empresa para a eletrificação e a digitalização. Uma transformação para a qual existem algumas dúvidas mas apenas uma convicção.

É verdade, não existe um plano diferente do A.

Markus Haupt, VP de Produção e Logística da SEAT S.A

Nesta entrevista é precisamente sobre isso que falamos. Sobre o plano cujo nome é Future: Fast Forward. Um plano que, como referimos, tem como missão transformar Espanha num centro de mobilidade elétrica. Curiosamente, um dos países onde a adopção da mobilidade elétrica continua atrasada face aos objetivos da União Europeia.

Os espanhóis não estão a comprar elétricos, os incentivos são diminutos, e foi precisamente por aí que iniciámos a nossa conversa.

O Governo espanhol não está a ajudar o plano Future: Fast Forward ao não aplicar políticas de promoção da mobilidade elétrica há muito prometidas (incentivos para PHEV e EV, infra-estruturas, etc.). Isso preocupa-vos?

Markus Haupt: Qualquer colaboração público-privada é muito importante num projeto desta dimensão, sendo que devemos destacar o incentivo que recebemos do governo para avançar.

Embora isso não invalide que lamentemos que ainda faltem ajudas para incentivar a compra de veículos elétricos e para a instalação de uma infraestrutura de carregamento de baterias, sem as quais o automóvel elétrico não poderá democratizar-se em Espanha.

A nossa preocupação é evidente e foi bem demonstrada pelo nosso presidente, que decidiu bater com a porta e abandonar a direção da ANFAC (Associação Nacional de Fabricantes de Automóveis de Espanha) por sentir que não há compromisso da parte do governo espanhol.

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Uma produção anual de 40 GWh da fábrica de Sagunto deverá dar para 650 mil carros elétricos por ano, considerando que a autonomia desse veículo foi anunciada em torno dos 450 km (o que implicaria uma capacidade bruta da bateria de uns 60 kWh). Este cálculo, um pouco criativo, faz sentido?

MH: São números com alguma lógica, até porque vamos produzir os elétricos compactos de três marcas em duas fábricas e a capacidade dessas duas fábricas irá rondar os 600 mil carros por ano. Seja como for, com a evolução do mercado e os eventuais novos modelos no futuro, podemos ampliar para 60 GWh/ano.

Produção SEAT S.A.© SEAT S.A. Imagem da linha de produção da fábrica da SEAT S.A., em Martorell.

A montagem das baterias em Martorell destina-se apenas ao mercado espanhol? A que marcas do Grupo Volkswagen se destinam as baterias montadas em Martorell?

MH: As baterias montadas em Martorell serão utilizadas nos modelos CUPRA Raval e Volkswagen ID.2, considerando que por ano deverão ser produzidas 300 mil unidades.

No caso dos modelos fabricados em Pamplona (Skoda Epiq e Volkswagen ID.2 Crossover), a gestão será feita pela PowerCo, uma empresa do nosso grupo de fornecedores de componentes que tem autonomia e gestão própria.

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Podemos assumir que vão existir mais semelhanças técnicas entre o Skod Epiq e o Volkswagen ID.2 Crossover, do que entre o ID.2 e o ID.2 Crossover, uma vez que o Epiq é produzido em Pamplona e o ID.2 será produzido em Martorell?

MH: A estratégia é a mesma que já utilizávamos quando a mesma fábrica produz modelos de marcas diferentes: a plataforma é comum entre as unidades fabris, mas as carroçarias entre modelos assemelham-se mais.

Neste caso, as carroçarias do Skoda Epiq e do Volkswagen ID.2, produzidos ambos em Pamplona, são mais parecidas, tal como as carroçarias do ID.2 e do CUPRA Raval, também serão mais próximas. É a melhor maneira de potenciar sinergias entre os diferentes veículos.

SEAT S.A. produção de baterias© SEAT S.A. Os módulos de bateria que compõe os sistemas elétricos do Grupo Volkswagen.

Em suma, sim. Cada par de modelos produzido na mesma fábrica é mais próximo entre si, mesmo pertencendo a marcas diferentes. É a maneira de conseguir um processo de produção otimizado.

Que tipo de química irá ser utilizada nas células de iões de lítio? LFP (Lítio-Fosfato-Ferro) ou NMC (Níquel-Manganésio-Cobalto)?

MH: Vamos ter os dois tipos de químicas entre os diferentes modelos. As LFP nos modelos de entrada e as NMC nos modelos mais potentes. Todas as células são feitas com tecnologia desenvolvida pelo nosso Grupo.

Qual das duas fábricas concluirá primeiro a sua conversão para automóveis elétricos? Pamplona ou Martorell? Em termos de capacidade de produção instalada quais são os volumes hoje e quais serão os volumes no futuro?

MH: Temos uma capacidade instalada em Martorell de cerca de 600 mil veículos por ano. No futuro, quando começarmos a produzir os elétricos — já em 2025 —, iremos ficar com uma distribuição bastante equitativa, metade com motor de combustão e a outra metade elétricos. O volume total não irá variar.

O que acontecerá se a quota de mercado de carros elétricos se mantiver abaixo dos 10% até ao final desta década? O vosso Presidente afirma que o Plano B é igual ao Plano A.

MH: É verdade, não existe um plano diferente do A. A nossa sorte é que somos uma empresa global e que podemos escoar produção para muitos mercados na Europa, pelo que a dependência do mercado espanhol é muito menor do que poderia ser. O volume principal será para exportação o que nos deixa numa posição menos delicada.

SEAT S.A. produção fábricas© SEAT S.A.

Qual o processo de montagem que demora mais tempo? O de carros com motor de combustão (plataforma MQB) ou os elétricos (MEB)?

MH: O tempo de montagem de um carro elétrico e o de um a gasolina/Diesel é sensivelmente o mesmo. A maior diferença está na cadeia de valor dos fornecedores, mas dentro da fábrica existe uma grande proximidade.

Para alguém na sua posição, o que significa estar a liderar o projeto de indústria automóvel com o mais alto orçamento de sempre em Espanha?

MH: É algo muito especial e único, sim, uma vez que é algo que também vai muito além das fronteiras de Espanha. Isto enche-nos de orgulho, já que o Grupo Volkswagen confiou na SEAT S.A. para desenvolver este projeto de automóveis elétricos compactos do consórcio.

Como é que conseguiram adquirir o know-how de montagem de baterias, sendo que este é um processo muito específico e distinto, comparativamente ao que a SEAT S.A. faz há sete décadas?

MH: Esse foi, sem dúvida, o aspeto mais trabalhoso, porque automóveis é um produto que já fazemos há muito tempo. Assim sendo, recorremos aos recursos do nosso Grupo para apreender os automatismos muito próprios dos sistemas de propulsão elétricos.

SEAT S.A. fábrica de baterias construção© SEAT S.A. As obras nas unidades de produção da SEAT S.A. já estão em curso.

Um exemplo: agora temos de lidar com ciclos de automatização de menos de três segundos (como a etiquetagem das células das baterias, por exemplo), que são mais comuns nas indústrias farmacêutica ou alimentar e que não conhecíamos nos automóveis. Também o facto de trabalharmos com baterias carregadas é algo que tem riscos de segurança e que nos levou a fazer o maior programa de formação (mais de 300 mil horas) da história da SEAT.

Um projeto desta magnitude pode ter atrasos. É o caso?

MH: Começámos a avançar com a conversão das fábricas há dois anos e estão a ser feitas mais ou menos a par. Os primeiros veículos de pré-produção em série vão estar terminados no final de 2025 e tudo está a correr dentro dos prazos previstos.

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