Filho de Alenichev atua no Ermesinde: «Quero jogar no FC Porto, um Grande da Europa»

5 horas atrás 19

Alenichev. Um apelido pesado, que transpira respeito, sobretudo quando é chamado à mesa do universo portista. Ao serviço dos azuis e brancos, o refinado médio ganhou tudo. Campeonato nacional? Venceu a prova por duas vezes. Taça de Portugal? Lá vão mais duas conquistas. Supertaça? Como é óbvio.

Poderíamos estar a referir-nos, única e exclusivamente, ao paradigma lusitano, mas Dmitri não era um jogador que se contentasse com pouco. Como tal, depois de ser decisivo no derradeiro encontro da Taça UEFA 2002/03, acabou por ser uma peça preponderante no mágico tabuleiro de José Mourinho que dominou o continente, vencendo a Liga dos Campeões em 2003/04. Na mítica final em Gelsenkirchen, saiu do banco para marcar e assistir, remetendo, assim, as aspirações do Monaco para o caixão.

Depois de uma carreira recheada, que teve na casa Spartak Moskva a sua última paragem, o internacional russo passa agora o seu dourado testemunho ao herdeiro. Daniil Alenichev, filho da figura incontornável dos dragões, procura seguir as pisadas do progenitor, tendo escolhido o futebol português para exponenciar as suas potencialidades. Um dos primeiros capítulos desta obra precoce já está ser redigido... no Distrital.

Tal pai, tal filho: a vontade de sair do ninho

Sabendo da imponente história de Dmitri no Spartak Moskva, não é preciso uma mega dedução para calcular onde é que começou a trajetória futebolística de Daniil. Todavia, o jovem atleta, com apenas 13 anos de idade, decidiu explorar outros cantos da sua pátria: numa primeira instância seguiu para o Lokomotiv e, posteriormente, atuou na Escola de Desporto TsDYuS Mytishchi.

Tudo faria crer que os seus primeiros anos de futebol sénior seriam realizados dentro de portas, mas o ano de 2022 tinha reservado algo diferente para o protagonista deste conto. O atacante rumou a terras lusas e assinou pelo Leixões, mostrando ânsia de correr atrás do seu sonho.

Daniil Alenichev teve no Leixões a sua primeira oportunidade em Portugal @Leixões SC

«A minha família conhecia bastante bem este país por causa do meu pai. Eu acredito, genuinamente, que é um dos melhores países do mundo para o desenvolvimento de jovens jogadores. É uma grande escola futebolística. Para mim, o mais importante é desenvolver as minhas habilidades. Como tal, a escolha de vir para aqui foi bastante fácil», explicou ao zerozero, falando a língua de Camões de forma louvável face ao pouco tempo que habita em Portugal.

«Sinceramente, eu nunca estudei o idioma. Sempre tentei compreender e fixar as expressões para depois utilizá-las com colegas e amigos. Contudo, o meu pai está-me sempre a dizer que eu tenho que aprender, porque na visão dele é algo mesmo muito importante. Ele fala vários idiomas diferentes, por causa das suas passagens no estrangeiro. É fluente em português, italiano,...», acrescentou.

Segundo o próprio, a experiência nos sub-23 dos bebés do mar foi enriquecedora, com a turma matosinhense a ter ficado nos lugares cimeiros da Liga Revelação em 2021/22. Apesar dos bons resultados coletivos, o futebolista de 19 anos sentiu algumas distinções entre os dois contextos futebolísticos que já frequentou.

«Quando cheguei cá, fiquei chocado com a elevada técnica dos jogadores de 17/18 anos. Na minha opinião, muitos têm a destreza necessária para serem dos melhores do mundo. Na Rússia, tentamos jogar mais como equipa, porque não há tantos futebolistas talentosos. É um estilo mais físico, interiorizado desde tenra idade», salientou.

O livro 'Uma Aventura no Distrital'

Com o término da época 2023/24, Alenichev Jr. acabou por seguir para uma nova paragem, com o intuito de dar os primeiros passos no profissional. De forma surpreendente, o destino escolhido atua na divisão mais alta do futebol distrital do Porto: o Ermesinde 1936. Zé Soares, técnico do modesto clube, confessou que não conhecia o atleta quando este chegou ao clube, mas agora, apesar do pouco tempo no novo lar, já é capaz de caracterizar a jóia.

«Com o decorrer dos treinos, comecei a observar um rapaz que não tem medo de arriscar no um-contra-um, provavelmente, a sua melhor arma. Para além disso, é um jogador forte e explosivo», assegurou, numa primeira instância. No entanto, ainda existem muitos recortes que necessitam ser lapidados: «Às vezes chateio-lhe a cabeça para soltar mais a bola, mas é algo perfeitamente normal nesta fase de desenvolvimento. A opção inicial dele é sempre fintar, o que o leva a perder a bola com frequência. Ele está connosco há duas semanas e, como é natural, vai melhorando com o passar dos dias.»

«Ele aceita bem as indicações, mas são notórias algumas lacunas quanto ao posicionamento. Ainda está a tentar pôr em prática o estilo de jogo que gosta e, como tal, às vezes parece individualista. Temos lhe dado liberdade para ser espontâneo e aos poucos temos corrigido estas falhas. Os timings com bola é, sem dúvida, o aspeto que eu mais tenho tentado orientá-lo. Tem que entender os momentos em que deve acelerar e aqueles em que é melhor soltar o esférico», frisou ainda.

O esquerdino prefere jogar como médio mais adiantado, mas também se sente confiante nos dois corredores, sobretudo pela direita. O treinador de 45 anos tinha outra ideia posicional para o respetivo comandado, mas o tiro saiu pela culatra. «Já o coloquei uma vez a ponta de lança, porque achei que as características físicas dele assentavam bem nessa posição. É um jogador bastante alto [192 cm] e pensei que pudesse ser forte no jogo aéreo. Contudo, quando o experimentei nesta nova função, ele disse-me logo que não se sentia confortável

De realçar que Daniil já somou os primeiros minutos no mais recente projeto, no desaire frente ao AR São Martinho. O técnico do zinde assegurou que a adaptação à Divisão de Elite não se antevê fácil: «É uma prova com uma exigência especial. As pressões são muito acentuadas, há muitos duelos, muitas segundas bolas, e o Alenichev não vai de encontro com estas dinâmicas. Ele é um criativo, que gosta de ter espaço e de não ser importunado. Contudo, se eu trouxesse um jogador de craveira mundial para jogar aqui, provavelmente, também teria dificuldades [risos].»

«O FC Porto corresponde a História. É o melhor clube de Portugal»

Com um percurso tão rico na formação da Invicta, Dmitri Alenichev tem certamente boas recordações para partilhar. Que o diga o seu rebento: «A eliminatória frente ao United foi muito especial para o meu pai. Ele disse-me que foi um duelo muito intenso em Old Trafford, onde a grande maioria dos adeptos tinha muitas dúvidas de que seria possível passar para a próxima fase da competição. Era uma das melhores equipas da Europa. Ele contou-me que havia alguma desconfiança mesmo entre os próprios jogadores, mas a verdade é que conseguiram sobreviver.»

Dmitri Alenichev conquistou a prova milionária em 2003/04 @Getty /

Também Daniil tem o sonho de chegar longe na modalidade, tal como qualquer outro miúdo. Porém, mostrar serviço em Portugal é uma prioridade, principalmente numa equipa em particular: «Espero ser um futebolista de classe mundial, de forma a ter a oportunidade de jogar nos melhores campeonatos e nos melhores clubes, como o FC Porto

«É um Grande da Europa, que costuma fazer excelentes campanhas na Champions League. É o melhor clube em Portugal, apesar de existirem outras belas equipas, como o Benfica ou o Sporting. Contudo, o FC Porto, para mim, corresponde a História. Quero muito conquistar troféus. É para isso que todos os futebolistas trabalham diariamente. A modalidade vive da competição», destacou ainda, de forma convicta.

Pressão adicional? Os genes não o definem

Para vingar neste desporto, o pupilo terá que adotar uma abordagem diferente da do progenitor, fruto da sua complexidade, Mesmos genes, físicos diferentes: «O nosso Alenichev deve ter mais 20 centímetros que o pai. O Dmitri jogava um pouco mais atrás, no meio-campo. Também não apostava tanto no drible, embora fosse um médio de rotura. Tinha claramente uma capacidade de passe bem mais apurada e defendia muito bem no último terço. O filho é mais um extremo puro, mais vertiginoso. O pai era mais cerebral, pensava muito bem o jogo», ressalvou Zé Soares.

qO filho é mais vertiginoso, o pai era mais cerebral, pensava muito bem o jogo

Zé Soares, técnico do Ermesinde 1936

Sobre eventuais comparações, Danill Alenichev assegurou que a pressão adicional sobrevoo o seu pensamento numa fase anterior da sua vida. Porém, agora o cenário não é o mesmo:  «Eu tento não pensar nisso. Senti essa obrigação no início do meu percurso, quando ainda era criança, mas agora penso mais em mim, naquilo que sou capaz. Sei que tenho um peso acrescido fruto do meu nome, mas foco-me em dar o meu melhor.»

Num mundo tão competitivo, a melhor estratégia deve passar mesmo por não conceber mais muros artificiais na sua consciência. Com um caderno cheio de folhas em branco, o avançado irá fazer de tudo para embelezar um bonito reinado. Objetivo? Que os prestigiantes contos se prolonguem por gerações.

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