Gigante reergue-se no Montijo: «Cidade com grande saudade do que foram os anos 70»

3 meses atrás 76

O futebol distrital português é uma mina de histórias e no Montijo há um «novo Gigante» adormecido, que esta época conseguiu o tão desejado regresso aos nacionais, subindo ao Campeonato de Portugal, e que quer ultrapassar as dificuldades dos últimos anos para devolver a glória a uma cidade que, na década de 70, conheceu a Primeira Liga. Falamos do Olímpico Montijo.

Originalmente, o grande representante do Montijo, uma das maiores cidades do distrito de Setúbal, era o histórico CD Montijo, uma equipa que chegou a estar entre a elite do futebol português, durante três épocas, na década de 70. Contudo, o clube acabou por ser extinto em 2007, devido a graves problemas financeiros. Nesse mesmo ano surgiu o seu «substituto», o Olímpico Montijo, que tem tido altos e baixos nos últimos anos e, esta época, garantiu a subida ao Campeonato de Portugal.

Olímpico venceu AF Setúbal @Olímpico Montijo

«Essa ligação histórica entre o Desportivo e o Olímpico tem que ser natural, porque somos o clube que representa a cidade. Não podemos agarrar e ficar com a identidade do Desportivo. O Desportivo teve o seu período de existência e terminou lamentavelmente, porque não tinha forma de continuar. O Olímpico acaba por ser a continuidade do futebol na cidade. Usamos as mesmas cores, temos um nome parecido e é normal que as pessoas associem os dois clubes. Mas também não nos fica bem dizer que somos a continuidade do Desportivo. Somos a continuidade do futebol na cidade. O Montijo é uma cidade em crescimento e merece ter um clube com projeção a nível nacional», começa por dizer Cláudio Oliveira, presidente do Olímpico, ao zerozero.

«Não é um peso. É um objetivo. Temos muito orgulho no passado futebolístico da cidade. Sabemos e compreendemos que não somos a continuidade do CD Montijo. Somos é o clube que representa a cidade, nessa continuidade histórica entre os vários clubes. Isso é um motivo de orgulho e de força para trabalhar», acrescenta, sobre o "peso" histórico do CD Montijo.

O dirigente de 45 anos assumiu a presidência dos montijenses há quase um ano, em julho de 2023, e desde aí, juntamente com a sua direção, tem feito um trabalho esforçado para reerguer o Olímpico: «Foi um ano muito trabalhoso, mas extremamente gratificante, não só pelas conquistas que comos alcançando, mas sobretudo por sentirmos que a cidade está a abraçar este projeto de forma incrível. Estão a abraçar com a mesma intensidade que nós. Queriam sangue novo. Não é uma crítica a quem estava antes, mas compreendo hoje, ainda por cima tendo feito parte da direção do CD Montijo, que havia um cansaço acumulado que era difícil de combater. A vitória no campeonato distrital de seniores acabou por ser o culminar de uma série de situações que foram acontecendo.»

«O terminar do Desportivo deixou um vazio muito grande na cidade»

Olímpico costuma ter casa cheia @Olímpico Montijo

Com menos de um ano à frente do clube, esta direção do Olímpico tem colecionador conquistas, dentro e fora de campo. A subida de divisão ao Campeonato de Portugal fala por si, mas há mais e prova disso é que a cidade do Montijo recomeçou a respirar futebol: aumentou a venda de camisolas e cachecóis, aumentaram os números de sócios e afiliados - 500 novos face há um ano - e o clube ainda conseguiu recomprar, recentemente, os 80 por cento que tinha em falta da SAD e concluiu o processo de certificação para Entidade Formadora de três estrelas.

«Num dia mau temos entre 600 e 800 pessoas a ver os jogos. Num dia normal são mil pessoas e no jogo contra o Comércio e Indústria [1-0] ultrapassámos as duas mil pessoas. Chegou ao ponto da polícia chegar e mandar fechar o portão para não entrar mais ninguém. Tive família de jogadores a ficar à porta e um jogador do plantel que chegou mais tarde e ficou pendurado no muro, à porta do campo, para ver. Sentirmos que as pessoas olham para o clube e o nosso projeto e a reconhecer o empenho é das maiores vitórias. A paixão está a reaparecer. É uma cidade com grande saudade do que foram os tempos dos anos 70. O terminar do Desportivo deixou um vazio muito grande e, na altura, o aparecimento do Olímpico não apazigou essa mágoa que a cidade sentia em relação ao futebol. O que é certo é que ao fim destes anos a paixão está a reacender e temos uma dinâmica fortíssima», conta-nos Cláudio.

Campo da Liberdade tem enchido @Olímpico Montijo

Afinal, falamos de uma cidade que viu passa pelas fileiras dos seus clubes nomes como Paulo Futre, Ricardo (o herói do Euro 2004), João Alves, Fernando Mendes, José Rachão, Beto (atualmente no Everton), o antigo internacional de futebol praia Belchior, Edinho, Tiago Targino ou Zé Pedro (atual treinador do Vitória FC), apenas para nomear alguns.

«Filho da cidade e amante do futebol da cidade», como se apelida, Cláudio vê com orgulho na voz tudo o que tem sido alcançado e sabe que essa  ligação emocional tem sido chave nestes meses. De resto, prova disso é que três elementos do plantel - Cami, o Carlos AlmeidaDiogo Arreigota - pertencem também aos órgãos sociais e até o seu filho, Guilherme, fez parte da equipa este ano. A aposta no amor e orgulho da região é para continuar.

«É uma situação que tentamos não dar muito foco, porque lhes dá um peso extra que não merecem, maior do que já têm. O Guilherme é meu filho e vive com esse peso, porque se não joga é porque não presta e se joga é porque é meu filho. Essa ligação emocional ajuda. Quando o cansaço começa a acumular nas pernas eles os quatro têm mais cinco por cento para dar, porque sentem essa responsabilidade, ligeiramente superior, por essa ligação. É uma responsabilidade positiva. No reforço desta época estamos a tentar contratar jogadores da cidade, o que origina maior dinâmica. Eles sentem a sua capacidade recompensada. Acredito que também vão trazer mais gente às bancadas. Depois, no momento do cansaço, têm esse sentimento extra pela camisola», explica o dirigente.

«Clube agora tem a capacidade de decidir o que quer para o futuro»

Clube adquiriu 80 por cento da SAD @Olímpico Montijo facebook

Em 2018, pouco antes de surgir a famosa pandemia de covid-19 no mundo inteiro, o Olímpico Montijo juntou-se ao cada vez maior grupo de clubes a criar SAD (Sociedade Anónima Desportiva) para tentar dar o próximo passo desportivo. José de Almeida, irmão do internacional português Nani, foi o seu primeiro proprietário, mas pouco depois saiu, por incumprimento de acordos pré-estabelecidos. Desde aí, o clube mudou de mãos mais um par de vezes, com a entrada de investimento asiático, mas tudo mudou recentemente, quando o clube readquiriu os 80 por cento que tinha em falta da SAD.

«Permite-nos decidir e não estarmos reféns. Nesta altura, temos a próxima época toda programada e com uma outra pessoa nunca sabemos se esta está à procura de dinheiro, quais as condições que quer ver e o projeto que quer para o clube. Não consigo ver o clube de uma forma diferente além de existir apenas um clube, seja seniores e juniores ou formação. Os objetivos para cada escalão têm que ser feitos consoante a capacidade de cada um. O clube agora tem a capacidade de decidir o que quer para o futuro, pode procurar determinado tipo de parceiro para chegar a esses objetivos e isso faz a diferença. Não estar dependente da vontade de terceiros. Quando errarmos, errámos porque não tomámos a melhor decisão», esclarece Cláudio Oliveira.

Entidades têm apoiado o clube @Olímpico Montijo

Apesar de tantas conquistas, a verdade é que essa mesma questão da SAD impede que o clube, hoje, esteja nas melhores condições financeiras. O representante máximo do clube explica que «ainda não há a estabilidade desejada», porque o «orçamento preparado no início da época baseava-se na formação» e tiveram que «abraçar toda a responsabilidade da SAD», alterando a alocação de pagamentos.

«Colocou-nos numa situação frágil, mas uma situação com pés assentes na terra e onde sabemos o necessário para nos equilibrar. Deixámos de estar no sufoco», explica.

Por isso, Cláudio Oliveira mostra-se confiante para o futuro e define objetivos.

«Queremos fazer o clube crescer a todos os níveis. Administrativo – estamos a criar um departamento jurídico -, para estarmos muito bem organizados e termos uma boa base de trabalho, independentemente do escalão ou o campeonato a disputar. Queremos a estrutura bem consolidada, para o clube crescer com organização. Queremos continuar a ser angariadores de talento na formação e começar a colocar equipas nos campeonatos nacionais. No futebol feminino, gostava de ter um projeto para num ano ou dois subir à 2ª divisão nacional. É um objetivo. Nos seniores queremos estabilizar a nível nacional e com um bocadinho de mais tempo projetar o clube para um patamar superior. Como direção, só temos mais um ano de mandato e depois perceber se temos condições para continuar e se os sócios assim o desejam», conclui.

O gigante amarelo e verde do Montijo reergue-se.

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