Golpe militar no Níger constituiu-se como o principal desafio histórico da CEDEAO

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De acordo com analistas ouvidos pela Lusa, se "parece inevitável" que os três Estados do Sahel central - Níger, Mali e Burkina Faso, que constituíram em setembro último a Aliança dos Estados do Sahel (AES) - abandonem a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), os dois blocos "têm de garantir que se separam em boas condições, para preservar o essencial e a segurança e a cooperação entre os Estados" da região, sublinhou Djiby Sow, investigador principal do gabinete regional do Institute for Security Studies (ISS) para a África Ocidental, Sahel e Bacia do Lago Chade.

"Precisamos de um divórcio amigável", acrescentou Sow, coautor de um artigo publicado esta semana pelo instituto de análise sul-africano sobre este processo, que deverá concretizar-se no final janeiro próximo, um ano depois do anúncio formal da rutura por parte dos três países.

A separação resulta da forma como a CEDEAO geriu a sucessão de seis golpes de estado militares no seu seio desde 2020 -- dois no Mali, outros dois no Burkina Faso, um na Guiné Conacri e outro no Níger, em 26 de julho de 2023, que suscitou a ameaça de invasão militar por parte da organização sub-regional africana e a constituição da AES, em resposta quase imediata, enquanto pacto de defesa mútua contra ameaças externas e internas, incluindo o terrorismo.

No passado dia 06 de julho, em Niamey, as juntas militares do Níger, Mali e Burkina Faso deram mais um passo no sentido da consolidação da aliança e da rutura com a CEDEAO, anunciando, na primeira cimeira da AES, a formação de uma "confederação".

"Os povos do Sahel viraram irrevogavelmente as costas à CEDEAO", anunciou então o anfitrião da cimeira, general Abdourahamane Tiani, o homem que tomou o poder no Níger há um ano, e que, não obstante as ameaças, mantém desde então preso o Presidente eleito, Mohamed Bazoum, assim como três dezenas de membros do anterior Governo.

Nos últimos 12 meses, apesar do repúdio internacional e das sanções impostas pela CEDEAO e pela União Africana a um dos países mais pobres do mundo, o Níger - que na véspera do golpe de Estado era o principal aliado militar do ocidente na região - expulsou mais de 1.500 efetivos franceses deslocados no país e, meses depois, decidiu também encerrar a importante base militar norte-americana de vigilância aérea em Agadez, onde os Estados Unidos tinham investido mais de 100 milhões de dólares e tinham até agora estacionados mais de mil soldados.

Ao mesmo tempo, o regime liderado pelo general Tiani -- à semelhança das juntas militares no Mali e no Burkina Faso - abriu as portas à Rússia e estreitou relações com o Irão e a Turquia.

"A tendência atual é a de reforço das relações que os três países da AES têm com a Rússia como parceiro privilegiado", sublinhou Sow, para quem, "enquanto os Estados da AES forem liderados por chefes militares - e por estes chefes militares em particular -, a Rússia continuará a ter uma posição privilegiada no Sahel".

A dissensão dos membros da AES, por outro lado, mergulhou a CEDEAO numa reflexão interna, que deverá resultar em reformas importantes nos domínios político e económico da organização, a acontecerem numa cimeira, para cuja organização a sua Comissão foi mandatada no início do mês.

"No seio da CEDEAO, os chefes de Estado estão conscientes da necessidade de efetuar um certo número de reformas e de mudanças para se adaptarem melhor às realidades do momento, para aprenderem com a experiência oferecida pelos membros da AES em matéria de gestão dos golpes de Estado", disse Djiby Sow.

Como sublinhou na cimeira da CEDEAO no passado dia 07 o Presidente senegalês, Bassirou Diomaye Faye - designado como negociador da organização, a par do seu homólogo do Togo, Faure Gnassingbé, para tentar manter os Estados separatistas no bloco -, a Comunidade "tem que mudar".

"Mas como é que ela vai mudar? Quanto tempo é que isso vai demorar? Não sei, mas este é claramente um teste decisivo para a CEDEAO", respondeu Sow.

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