"Não podemos tratar os imigrantes como criminosos": a imigração no debate da rádio

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O debate das Europeias na rádio começou com um tema quente que divide a esquerda e a direita de uma forma insanável: a imigração. Em discussão esteve o Pacto de Migrações e Asilos, as regras mais ou menos apertadas nas fronteiras e a defesa ou repúdio da limitação de imigrantes que podem entrar em Portugal.

Foi Marta Temido, a cabeça de lista do PS e ex-ministra da Saúde, quem teve a primeira palavra e visou as opções que o Governo da AD tem em mente, censurando o “apertar de regras” e o “estreitar da tipologia de migrantes”. A ex-governante alertou para a “dependência de mão de obra menos qualificada”.

Já o cabeça de lista da Iniciativa Liberal (IL), João Cotrim Figueiredo, preferia ver, antes de qualquer reforma política, a implementação da legislação vigente. Para este candidato, a integração de migrantes só pode acontecer se as “regras estiverem a funcionar”.

O Bloco de Esquerda, pela voz da antiga coordenadora Catarina Martins, considera “inaceitável” o tratamento que os imigrantes sofrem no país. “Temos centenas de milhares de imigrantes em Portugal que não chegaram agora, que chegaram há alguns anos, que estão a trabalhar, que estão a fazer descontos para a Segurança Social e que têm processos pendentes e, por isso, não têm a sua situação regularizada.”

Tânger Correia, do Chega, apontou como “urgente” a legalização dos 400 mil imigrantes que ainda aguardam autorização de residência, pelo que, até lhes serem “dadas condições dignas de vida”, o país deve fechar a porta à entrada de mais imigrantes. Sobre isto, a resposta viria mais tarde por Catarina Martins, que voltou a sublinhar que essas pessoas que esperam “estão a trabalhar há anos”.

A Agência para a Integração Migrações e Asilo (AIMA), que substituiu o SEF e que tem estado debaixo dos holofotes nos últimos dias, foi puxada ao assunto por João Oliveira, o cabeça de lista da CDU. A prioridade deverá passar por dar músculo à AIMA. “Quanto mais se apertam as regras à legalização dos processos de imigrantes, mais se dificulta a sua regularização”, explicou. E acrescentou: “Regras mais apertadas não significam menos imigração, significam menos legalização dos processos”.

Foi no mesmo sentido a opinião de Francisco Paupério, do Livre, que entende que o apertar de regras atenta contra o rumo da União Europeia, agudizando ainda o problema da imigração ilegal. Também Pedro Fidalgo, do PAN, defendeu o reforço da capacitação da AIMA, recusando a ideia de que a União Europeia tem “as portas escancaradas”.

Do lado da Aliança Democrática (AD), Sebastião Bugalho defendeu que a solução para combater a imigração ilegal pode passar pela introdução de um contrato de trabalho. O antigo comentador disse que existe “alta vulnerabilidade” nas fronteiras europeias.

Depois de uma primeira volta, o tema manteve-se em cima da mesa. Temido foi confrontada com a opinião de Carlos Zorrinho, que, em Évora, defendeu boas políticas de imigração mas com controlo de fronteiras. A antiga ministra tentou emendar a mão do camarada. “[O que Zorrinho quis dizer é que] é preciso bom controlo e isso não é mais controlo”, declarou.

De seguida, puxou como cartada o respeito pelo Pacto de Migrações e Asilos: “É preciso ser implementado tal e qual como está ou ser escrutinado”. Temido diz temer que a modificação desse pacto possa torná-lo “pior” e que, como resultado, entre outros resultados, pode desaguar no financiamento de muros.

Bugalho recusa a ideia de muros. “Somos contra muros do pontos de vista físico”, referiu.

Recentemente, na televisão, o cabeça de lista do Chega afirmou ter testemunhado o “medo” no rosto de alguns portugueses em Vila Nova de Milfontes, no Alentejo. O candidato a deputado europeu revelou ter visitado um centro comercial onde havia apenas duas lojas com funcionários portugueses e que alegadamente sofrem pressões. “Não podemos deixar que os portugueses sofram com essa imigração. Preocupa-nos que os portugueses se sintam mal no seu país”, atirou, respeitando assim o caráter xenófobo do partido.

Tânger Correia foi mais longe e propôs “quotas anuais de imigrantes” estabelecidas “de acordo com as necessidades do mercado de trabalho”. Cotrim Figueiredo, candidato da IL, interrompeu-o e acusou o cabeça de lista do Chega de “laivos de xenofobia e racismo”. Mais: “Associar este tipo de comportamentos a imigrantes é exatamente isso que não ajuda à resolução do problema”.

Os reforços chegaram do Bloco de Esquerda. Catarina Martins acusou o Chega de “semear ódio” e de ser inútil. “Não serve para absolutamente nada, não luta por nada nas instituições onde está.”

Deve haver limites na imigração?

A pergunta é simples: deve ou não haver limitação na entrada de imigrantes e migrantes no país? As respostas divergiram, pois claro. Bugalho diz que esse limite foi “ultrapassado nos imigrantes que não foram registados nem protegidos”. O cabeça de lista da AD diz que, nas suas arruadas e eventos, não houve um empresário que tenha referido a necessidade de mão de obra. Porém, ressalva: “Não podemos tratar os imigrantes como criminosos, são vítimas de crime”.

Cotrim insistiu na ideia original: “O único limite é a aplicação das regras em vigor”. Já Tânger Correia diz que esse limite deve ser ditado pelas “regras do mercado”, ou seja, “o país deve ter o que precisa”.

Catarina Martins foi buscar números para responder à questão. “Entre 2011 e 2023 saíram 1,1 milhões de pessoas de Portugal e só entraram 600 mil. Precisávamos de uma reflexão sobre os salários que temos que pagar cá para as pessoas cá ficarem.”

Do lado da CDU veio outra ideia. “Portugal não tem capacidade ilimitada para acolher imigrantes, mas deve fazer um investimento na criação de condições para acolher imigrantes”, defendeu João Oliveira, entregando essa responsabilidade ao Estado.

“Não devemos ter quota legal sobre qual o limite porque isso vai variando ao longo dos vários sectores”, indicou Paupério, do Livre. “É muito dinâmico. O Chega tem isso no seu programa e é completamente irresponsável.”

Marta Temido, do PS, elogiou o caminho que tem sido trilhado. “A reforma foi feita no sentido correto”, afirmou a antiga ministra, que repudia “a ideia de que estamos a tratar mal os imigrantes”. E questionou: “Dar destino aos que cá estão? São por acaso objetos?”.

Finalmente, Fidalgo Marques, do PAN, recusou a ideia de limitar a entrada de imigrantes no país. “Temos de ter regras bem claras e isso já existe. Não faz sentido termos um número.”

As eleições Europeias vão decorrer no próximo domingo, dia 9 de junho. No domingo que passou, dia 2, mais de 250 mil eleitores estavam inscritos para o voto antecipado, uma opção que visa fomentar a participação (em xeque graças ao fim de semana grande que se avizinha).

O debate da rádio, o derradeiro debate desta campanha, foi moderado por jornalistas de Renascença, Antena 1, TSF e Observador e decorreu nas instalações da RTP.

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