Nosy Komba, a ilha no Canal de Moçambique que está a ser salva pelos engenheiros da ESA

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Nosy Komba é “a ilha, da ilha, da ilha”, diz o engenheiro da Agência Espacial Europeia (ESA), Tiago Soares. Mesmo a quase nove mil quilómetros de distância, este pedaço de terra com 25 quilómetros quadrados, no Canal de Moçambique, está no centro das atenções de toda a comunidade de funcionários da ESA, nos Países Baixos (ESTEC), pelo menos um final-de- semana por ano.

Esta ligação a Nosy Komba, em Madagáscar, começou já em 1995, altura em que começou a ser criada a associação Sunshine in Nosy Komba, formada por funcionários da ESA. Outra forma de definir a pequena ilha banhada pelas águas cálidas do Índico seria “os mais pobres dos pobres”, já que faz parte de um país em que são flagrantes as desigualdades sociais e grande parte da população vive abaixo do limiar de pobreza. Falta tudo, menos riqueza biológica e humana e é à população que o especialista em seguimento de lixo espacial se dedica na sua atividade como voluntário da associação. A formação é a base do trabalho, mas na realidade a intervenção do grupo internacional é bem mais vasta, estendendo-se à colaboração na construção de infraestruturas, instalação de painéis solares. “Fazemos tudo o que é necessário no terreno”, resume.

Quando chega à pequena ilha em Madagáscar, Tiago Soares (à direita na foto) esquece o papel de engenheiro e põe mãos à obra

A abordagem dos voluntários está assente no respeito pela comunidade, pelos seus tempos, modos de vida e condições. “A vida lá é muito difícil, violenta, todas as pessoas têm traumas”, descreve Tiago. É por isso que só pode ir ao terreno quem já integra a associação há mais de um ano. Há todo um trabalho de preparação prévio. Neste momento, Tiago é das pessoas com mais conhecimento e experiência. Tornou-se voluntário em 2011, logo a seguir a ter entrada na ESA. É ele o principal mobilizador do fim-de-semana de atividades em junho em que se angaria boa parte dos 50 mil euros do orçamento anual e que servem para pagar os salários de 16 professores, duas enfermeiras e também para assegurar bolsas de estudo, alimentação e deslocações dos estudantes. Nesta espécie de festival, bem acolhido pelos órgãos de gestão da Agência, realizam-se atividades desportivas, quizzes, sessões com DJs.

Aqui não há engenheiros

Em Nosy Komba não há carros, as deslocações são em canoa ou a pé e quem lá chega vindo da Europa necessita de um bom processo de compreensão da realidade local. “Não vamos numa atitude de impor o que quer que seja”, nota Tiago Soares. “Começamos em pequena escala e vamos criando uma ligação às pessoas, seguindo os princípios do “desenvolvimento participativo”, resume. Nesta lógica, o objetivo é tornar as comunidades autónomas, de forma a que consigam “evoluir sem nós”, sublinha. “Temos de ser humildes na aproximação, ir avançando devagar e cuidadosamente.” Com esta abordagem, a Sunshine já atingiu resultados que impressionam ao nível da redução do abandono escolar e melhorias nos resultados escolares – uma taxa de sucesso no ensino primário que subiu de 60 para cem por cento e de 96% a nível secundário quando antes do programa de bolsas de estudo não chegava a quarenta por cento.

Quinhentos alunos frequentam a escola apoiada pela associação, uma centena deles vive nas próprias instalações. Hoje até já são os próprios professores a gerir a escola, o que se enquadra na tal perspetiva de incentivo à autonomia da comunidade. Já os estudante que prosseguem para o ensino superior são incentivados a apoiar a comunidade, com atividade na biblioteca, a ensinar a ler, sempre que regressam para o fim-de-semana ou férias.

Para Tiago Soares estes anos de trabalho voluntário no Índico também representam uma importante aprendizagem. “É preciso desconstruir o ego, esquecer o papel do engenheiro”, sublinha. E pôr mãos à obra. Seja para evitar uma colisão no espaço, seja para construir uma escola.

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