O ensino do Português e os burocratas da língua

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Esse parece-me, aliás, um dos grandes problemas do ensino público: o desfasamento entre aquilo a que os programas se propõem e aquilo que efetivamente os alunos absorvem é abissal.

O ilustre leitor saberá o que é uma metátese? E uma aférese, uma apócope, uma epêntese ou uma paragoge? Não sabe? Eu também não. Mas aparentemente os jovens de 14 anos que terminam o 9.º ano de escolaridade obrigatória têm de conhecer estes fenómenos fonéticos que conduziram à formação das palavras tal como as usamos hoje.

Digo que têm de conhecer – mas se conhecem de facto, do que eu tenho as maiores dúvidas, só saberemos daqui a umas semanas, quando forem revelados os resultados do exame de Português que se realizou ontem nas escolas nacionais.

Esse parece-me, aliás, um dos grandes problemas do ensino público: o desfasamento entre aquilo a que os programas se propõem e aquilo que efetivamente os alunos absorvem é abissal.

No caso do Português esse desfasamento é especialmente notório. Só para se ter uma ideia de a que ponto a coisa se pode complicar, espreitemos a classificação dos diferentes tipos de orações. “Orações coordenadas: copulativas, adversativas, disjuntivas, conclusivas, explicativas. Orações subordinadas adverbiais: causais, temporais, condicionais, finais, comparativas, consecutivas, concessivas. Orações subordinadas substantivas: completivas, relativas. Orações subordinadas adjetivas: relativas restritivas, relativas explicativas (modificador do nome apositivo)”. É_verdadeiramente de ficar com os olhos em bico!

Um aluno que saísse do 9.º ano a saber isto tudo estaria pronto para ir para a universidade dar aulas de Linguística. Mas, lá está, os estudantes não só não sabem estas matérias complicadíssimas como não ficam a saber o básico, ou seja, escrever e falar corretamente.

E julgo que as duas coisas até estão relacionadas. Que eu saiba, nunca ninguém precisou de dividir e classificar orações para escrever ou falar corretamente. Mas, inversamente, impingir este emaranhado de gramática e sintaxe pode causar rejeição imediata.

Acredito que é precisamente por a matéria ser tão abstrata e burocrática que os alunos se desinteressam das aulas e acham o Português uma chatice mortal. Livrem-nos dos burocratas do ensino, que, a partir dos seus gabinetes, transformam a nossa belíssima língua numa coisa intragável. Deixá-los dominar o ensino do Português é a forma mais rápida de fazer com que os jovens detestem a sua própria língua.

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