O menino que escapou ao FC Porto e agora brilha no City: «Foi o melhor que vi jogar»

Basta a falar de um esquerdino norueguês, extraordinariamente talentoso, para causar calafrios aos principais rivais do Manchester City. A descrição evoca Haaland, embora a carapuça também sirva à mais recente aposta de Pep Guardiola, decisiva este fim de semana na reviravolta tardia do atual campeão de Inglaterra, Europa e Mundo.

As semelhanças com o robô nórdico terminam por aí, já que não se trata de um goleador espadaúdo e louro, mas sim de um extremo/médio que se destaca pela criatividade e capacidade em espaços curtos. O nome é Oscar Bobb e a história da ascensão passa pelo FC Porto, onde ainda é recordado como aquele que escapou.

Foi observado e contratado pelos dragões ainda muito jovem, mas a inscrição oficial acabou adiada e, no fim, impedida pela FIFA, devido às regras de proteção de menores. Uma enorme perda, das que leva a pensar no que poderia ter sido, aqui contada pelo zerozero com a ajuda de um dos poucos treinadores por quem este prodígio passou em Portugal.

FC Porto a receber «um jogador especial»

Brilhou desde cedo na Noruega, destacando-se principalmente em torneios internacionais. Foi num desses - o Mundialito de 2013, no Algarve - que o FC Porto descobriu Bobb, que dois anos depois aterrou em Portugal para integrar a formação azul e branca.

«O engraçado é que fui contratado também para a integração do Oscar, sem saber quem ele era. Falaram-me de uma equipa especial que ia receber um jogador especial. Alguém extremamente desenvolvido tecnicamente, que seria o foco dessa geração. Diziam-me que se aquele jogador não conseguisse chegar a um patamar alto, mais nenhum dessa geração chegaria». Assim começou Pedro Mané, treinador dessa equipa de sub-13 do FC Porto, à conversa com o nosso jornal. 

«Depois, quando tive o contacto com o Oscar, percebi o porquê de dizerem tudo isso. Destacava-se dos colegas pelo talento, era um jogador diferenciado, mas também pela inteligência. Comunicava em inglês, falava norueguês e já se expressava bem em português, quando tinha apenas 12 anos.»

A ideia nunca foi que o menino escandinavo recebesse qualquer tipo de tratamento especial. Havia, simplesmente, uma certeza maior em relação ao seu futuro profissional que, segundo o técnico dessa equipa de sub-13 que contava com Martim Tavares, Diogo Abreu e outros, «os próprios jogadores começaram a reconhecer». Era mesmo especial.

qFoi claramente o melhor talento que vi jogar. Com a idade dele, nunca tinha visto um jogador daquela qualidade.

«Tive a felicidade de trabalhar com jogadores de enorme talento daquela idade, mas falamos de um jogador que chegou a um patamar de excelência... Ele foi, claramente, o melhor talento que vi a jogar. Com a idade dele, nunca tinha visto um jogador daquela qualidade», contou-nos o mister Mané, atualmente na equipa B do Charlotte FC, nos EUA.

FIFA travou o dragão

Se tudo tivesse corrido como planeado, poderíamos estar a falar de Oscar Bobb como um dos principais craques do FC Porto de Sérgio Conceição. Como sabemos, não foi esse o caso.

A FIFA não permite a transferência internacional de menores, exceto se os pais ou guardiões legais se tenham mudado para esse país por razões não relacionadas com o futebol. Turid Gunnes, atriz e mãe de Oscar, declarou que se mudou para o Porto por motivos profissionais, tendo se juntado a um grupo de teatro local, mas essa justificação, revelada nos documentos Football Leaks e noticiada em 2018 pelo jornal norueguês VG, nunca convenceu os responsáveis da FIFA.

Enquanto o processo decorria no Tribunal Arbitral do Desporto, mãe e filho, apaixonados pela cidade do Porto, continuaram na cidade. Oscar estava, ainda assim, impedido de jogar oficialmente pelos dragões.

«Tentámos minimizar ao máximo esse facto. Marcávamos jogos de treino, por vezes a meio da semana, para ele poder jogar. Chegámos a fazer viagens para jogar contra, por exemplo, o Celta Vigo e o Deportivo. Jogámos torneios internacionais e ele era premiado como melhor jogador em quase todos», recordou Pedro Mané.

«Não estava dentro da questão burocrática, o meu foco era o jogador e o seu bem-estar. Sei que eles eram felizes na cidade e que o Oscar gostava muito do FC Porto, paixão pura, mas sem poder ir a jogo oficialmente com os colegas dele era complicado...»

Tão complicado foi que, com a decisão final do TAS, Oscar Bobb acabou por regressar à Noruega.

Novo norueguês a brilhar de sky blue

Em 2019/20 o menino natural de Oslo trocou o Valerenga por Inglaterra. Deu os últimos passos da sua evolução na cada vez mais respeitada formação do Manchester City, destacando-se como figura nas equipas de sub-18 e sub-21, antes de saltar para as opções de Guardiola. 

Estreou-se no segundo dia de setembro, na vitória sobre o Fulham (5-1), e desde aí tem visto os minutos crescer. Jogou 14 jogos e já sabe o que é marcar na Liga dos Campeões e assistir na Premier League, começando a conquistar, pouco a pouco, o seu espaço numa equipa que muitos consideram a melhor do Mundo.

Para acelerar a chegada do seu nome a todos os cantos deste Mundo, Oscar Bobb, que já tinha marcado para a Taça no fim de semana anterior, saltou do banco a oito minutos do fim no St. James Park e fez, com técnica notável e já nos descontos, o golo da reviravolta. Ninguém ficou indiferente:

«Quando jogadores passam por nós, ou nós por eles, gostamos de os acompanhar, já o fazia quando ele jogava a Youth League. Com a qualidade que ele mostrava, chegou a um patamar que era expectável para ele. Não tenho dúvidas que fará uma carreira top», atirou Pedro Mané.

Consiga ou não afirmar-se na equipa que hoje representa, certo é que Oscar Bobb parece, ao dia de hoje, talhado para o sucesso que os responsáveis azuis e brancos lhe auguravam...

«O lado financeiro não é a minha área, mas em termos desportivos não tenho dúvida de que poderia ter feito uma grande diferença no FC Porto. Todos os que tiveram a felicidade de trabalhar com ele pensam o mesmo, certamente.»