O Orçamento que o país (não) precisa

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Sem surpresas, o Orçamento do Estado para 2024 (OE2024) foi aprovado após um debate pobre que pouco ou nada acrescentou às questões que preocupam o país, não refletindo a realidade com que se deparam os portugueses, nomeadamente a elevada carga fiscal com que se deparam as empresas e famílias e a pouca ambição nas mudanças estruturais necessárias ao desenvolvimento do País.

O governo não deu gás à política económica e cedeu à política orçamental, apontando baterias para as contas certas. É certo que o excedente orçamental é útil para abater a dívida e contribui para credibilizar a imagem externa e reduzir os juros. Mas não é menos certo que se mantém o garrote sobre famílias e empresas sem cuidar de medidas estruturais, do investimento e da provisão dos serviços públicos.

Ao nível fiscal, a proposta do OE registou algumas alterações na especialidade. Medidas emblemáticas caíram ou foram adiadas. É o caso do recuo no aumento do Imposto Único de Circulação (IUC). Também na eliminação do regime especial de IRS para os residentes não habituais (RNH) acabou por não se concretizar com a aplicação de um regime transitório em 2024 para os estrangeiros ou pensionistas que comprovem até ao fim deste ano a intenção de trabalhar ou viver em Portugal, numa medida considerada eleitoralista.

Neste regime houve novidades, com os socialistas a atenderem às críticas de um conjunto de agentes nacionais e a alargarem a medida para 2024 no caso de docentes do ensino superior ou investigadores científicos. Mais deduções no IRS, redução do IVA em alguns bens alimentares e medidas na habitação como uma isenção fiscal, em sede de IRS e de IMI, para os proprietários com contratos de arrendamento antigos em vigor, foram outras das alterações.

O ministro das Finanças defendeu que “este é o Orçamento que o país precisa”. E acenou mais uma vez com “mais rendimentos para as famílias”, numa alusão ao corte do IRS que representa menos de metade das receitas adicionais que vão entrar nos cofres do Estado à boleia dos impostos indiretos (2,8 mil milhões de euros) num OE com carga fiscal recorde de 38%.

O estímulo ao rendimento das famílias através da descida do IRS e a redução da dívida pública para um valor abaixo dos 100% do PIB não deixam de ser boas decisões. No entanto, o documento padece de insuficiências que penalizam os portugueses e a atividade económica com a falta de medidas dirigidas ao investimento, à capitalização das empresas e estímulo às exportações que estão a dar já sinais de alerta.

Com um OE que não conta com aumento das exportações nem do crescimento, não é de estranhar que Medina considere “essencial aumentar o poder de compra”. Resta saber se as medidas traçadas garantem este reforço com os portugueses, fiscalmente asfixiados, a liderar o top 3 dos países da OCDE que mais recorreram às poupanças para fazer frente ao agravamento do custo de vida dado os baixos níveis de rendimento disponível.

Aguardam-se mudanças estruturais no imposto que recai sobre as famílias, continuando o IRS a caracterizar-se por uma hiperprogressividade. E uma nova política que não passe por reduzir a fatura do imposto sobre as famílias, tendo como contrapartida o aumento dos impostos indiretos em vez da redução da despesa para compensar medidas que levem a menor receita fiscal.

Trata-se, portanto, do alívio possível face ao objetivo de ter um orçamento equilibrado no médio e longo prazo. Segundo o chefe de Estado, este OE embora não seja estimulante, “é a única solução possível”. O mesmo será dizer que é um mero paliativo, não sendo, por isso, o Orçamento que o país precisa.

Como disse Marcelo, foi “feita à defesa” com um pé atrás face ao período de incerteza internacional. O pior é que fica aquém das necessidades e aumenta os riscos económicos e sociais de Portugal num período de especial dificuldade. Os portugueses ficam a perder.

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