Obrigações verdes soberanas: para quando em Portugal?

7 meses atrás 64

Os Estados podem emitir as chamadas obrigações verdes para financiar despesas e investimento que contribuam para a diminuição da pegada ambiental do país e para a adaptação às alterações climáticas. Estas obrigações devem demonstrar que geram impactes alinhados com o Acordo de Paris e com os Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável. Assim, os Estados podem financiar ativos públicos ou despesas que estão alinhados com as políticas pública nacionais de mitigação, adaptação, gestão eficiente dos resíduos, gestão da água, proteção dos serviços dos ecossistemas entre outras categorias.

Na realidade, estas áreas constituem hoje uma parte relevante dos investimentos que Portugal tem de realizar: melhoria dos transportes públicos e da ferrovia; conservação e manutenção da rodovia de forma a que esta seja resiliente aos impactes das alterações climáticas; massificação e reforço da infraestrutura da rede nacional de carregadores elétricos; projetos que contribuam para diminuir os incêndios, para a valorização da biodiversidade; entre outros que poderão ocorrer no setor do mar, agricultura e turismo.

As obrigações verdes também podem cobrir despesas associadas a subsídios, isenções fiscais, consumo intermédio, transferências correntes entre administrações públicas e cooperação internacional corrente, desde que contribuía para o Acordo de Paris e para os ODS.

Apesar da Comissão Europeia ter aprovado o Standard Europeu de Obrigações Verdes em novembro de 2023, existem muitos países que já emitiram obrigações verdes. Em 2017, a França tornou-se o primeiro país europeu a emitir uma obrigação verde de sete mil milhões de euros com maturidade até 2039. Desde então França tem emitido várias obrigações verdes sendo o país europeu que mais apostou nesta forma de financiamento até hoje.

Em 2022 o valor das obrigações verdes soberanas na Europa atingiu cerca de 65 mil milhões de euros, sendo expectável que em 2023 este valor tenha sido, no mínimo, semelhante. Na realidade, em 2023 os principais países europeus que emitiram divida verde soberana foram a Alemanha (€15 mil milhões); Itália (€13 mil milhões), Reino Unido (€9,8 mil milhões), Irlanda (€3,8 mil milhões), França (€2,9 mil milhões), Bélgica (€900 milhões) e Suíça (€400 milhões).

Segundo a MSCI, as obrigações verdes soberanas constituem atualmente mais de 20% do Bloomberg MSCI Green Bond Index, o que comprova o crescimento desta opção de investimento pelos países.

As obrigações verdes soberana emitidas na Europa (e no resto do mundo) têm seguido os princípios do ICMA – A International Capital Market Association – que foi proativa na criação de guidelines que têm sido seguidos pelo mercado. O Standard europeu agora aprovado, vem explicitar algumas componentes ao nível da verificação entre outras, mas na essência as despesas que podem ser consideradas verdes respeitam a abordagem da ICMA.

Se Portugal decidisse emitir uma obrigação verde soberana, seria importante que se tivesse consciência do seguinte:

O processo associado à elaboração da obrigação deve ser verificado por uma entidade terceira, de forma a validar que a emissão está alinhada com os compromissos ambientais de Portugal, bem como com o Acordo de Paris e com os ODS; Uma emissão verde soberana é considerada como um sinal de compromisso para os mercados de que Portugal está de facto a apostar num modelo de desenvolvimento sustentável, e pode ter um efeito de arrastamento positivo para o sector privado. Por isso, mais do que uma reestruturação de dívida, que é tentadora, a primeira emissão de obrigações verdes transmite aos investidores uma mensagem clara de que o país está a caminhar para uma economia verde e justa; É uma ótima oportunidade para o país atrair investidores verdes que são diferentes daqueles que normalmente compram as obrigações convencionais. É importante considerar a negociação futura no mercado secundário desses títulos, o que significa que a obrigação verde deve ser “genuína” para poder manter a sua atratividade;

Outro fator fundamental é ter presente que não existe um valor mínimo desejável para o valor da emissão verde soberana. Após eu ter contactado vários players do lado de investidores para compreender se de facto existe algum valor mínimo desejável, a resposta genérica que obtive foi de que qualquer Estado deve emitir obrigações verdes para as suas necessidades de investimento verde e pelo prazo mais longo possível, não ficando preso a um valor mínimo. É isto que os investidores procuram. E se parte da obrigação verde for para restruturar a dívida para se poupar no juro pago, então essas poupanças devem ser investidas em projetos verdes.

O mercado de compradores de obrigações verdes é hoje constituído por players exigentes e com muito conhecimento sobre o tema. Há que apostar numa obrigação verde séria! Sendo que quase todos os países europeus já emitiram obrigações verdes, para quando podemos esperar uma obrigação verde genuína em Portugal? Elas também são recomendadas pela presidente do Banco Central Europeu.

Ler artigo completo