Os partidos estão de acordo: avançar para o colapso climático

8 meses atrás 40

Entre os temas do clima, da energia, dos transportes, da agricultura e florestas há grandes diferenças entre os partidos, mas todos partilham o acordo de acelerar rumo ao colapso: alguns prometem intangivelmente cortar emissões enquanto garantem nas propostas concretas aumentar emissões, outros nem isso. Os casos mais evidentes de convergência são o acordo sobre a construção de um novo aeroporto de Lisboa, mas abundam propostas de construir mais estradas, até novas pontes sobre o rio Tejo. As palavras sobre emergência climática são, quando existem, retóricas. As práticas são claras: não estará na mesa de voto no dia 10 nenhuma proposta real de travar a maior crise da história da humanidade. Poderemos votar em qual o general para seguir a guerra contra a Humanidade: Montenegro e Rocha, Ventura, Santos e Mortágua ou outras combinações.

2023 foi o ano mais quente desde que há registos, pelo menos 1,48ºC acima da era pré-industrial. Os primeiros meses de 2024 escaldam o planeta, dos oceanos aos pólos. Este mês provavelmente terá uma temperatura de 2ºC acima da era pré-industrial. A temperatura do planeta está a entrar em roda livre. Ainda assim, não só os debates políticos não são à volta deste tema como a imprensa acha que podem não ser, promovendo o acordo sobre enfiar a cabeça na areia e estendendo a passadeira à seca permanente, ao colapso de colheitas, à explosão do custo de vida e à catástrofe social que todos os anteriores (e outras consequências da crise climática) garantem.

A polarização política em curso na velha Europa é apenas uma guinada total à direita, com a extrema-direita ditando os programas, o centro-direita apoiando novos fascismos, o centro tornando-se centro direita, a esquerda tornando-se centro. Isto está plasmado nestas eleições. A escolha do capitalismo europeu é a catástrofe e, para garanti-lo, o autoritarismo. O seu controlo sobre a hegemonia da comunicação é do mais forte que vemos há décadas.

A natureza das alterações climáticas é incompatível com a agenda política mediada entre parlamentos e comunicação social. A procura de compromissos ao centro garante a catástrofe porque não existem opções intermediárias entre realizar ou não os cortes necessários para travar o colapso climático. Ou se fazem os cortes ou não se fazem os cortes. E não são uns cortes quaisquer, são precisos e objetivos: 85-90% menos de emissões até 2030. Estão em acordos internacionais que todos assinam e ninguém cumpre. A nível partidário isto repete-se. Nenhum partido propõem fazer os cortes necessários. Nenhum partido. Nenhum. O que põe desconfortavelmente no mesmo plano o Bloco de Esquerda e a Iniciativa Liberal, a CDU e o Chega, o PAN e o PS, a AD e o Livre.

Se estes programas são todos iguais? Não, nem em termos climáticos, muito menos em outros aspectos. Mas nenhum propõe fazer o que é necessário, nem os que prometem que todas as propostas orçamentais tenham avaliação de impacto climático nem os que não falam de alterações climáticas uma só vez.

A meio da campanha a Galp, uma empresa petrolífera e que, consequentemente, é uma organização cujo objetivo em 2024 é o extermínio da Humanidade, anunciou os maiores lucros da sua história e o objetivo de aumentar a produção de petróleo e gás. Qual é a proposta que une todos os partidos neste âmbito? Fechar as centrais a gás? Obrigar a empresa a pagar uma transição energética justa para os seus trabalhadores? Não. É baixar o IVA do gás. Não sendo todos iguais, aqui o Chega apostaria em migrantes escravizados que ainda teriam de sustentar as contas públicas.

A avaliação um a um dos programas eleitorais é esclarecedora. As coisas interessantes não escondem a resignação. Pedir agora compromissos agora aos partidos que em 2024 acharam que podiam apresentar um programa que não travasse a crise climática e que deixaram nos 500 debates que aconteceram que este assunto não existisse é só cumprir calendário. Destas eleições não sairá a solução para crise climática. Não será tampouco delas que será derrotado ou aclamado o novo fascismo do Chega. O abandono da política revolucionária progressista pelas forças que se institucionalizaram não é irreversível, mas com a virada à direita o seu espaço vital vai mirrando. Ter programas políticos que não respondem de forma corajosa à maior crise da história mas antes se acomodam à hegemonia de extrema-direita faz com que esse espaço se esteja a extinguir. Não é admissível que pessoas adultas e organizações políticas que se propuseram um dia mudar o mundo para melhor se recusem a mudar os seus confortáveis hábitos quando o que está em jogo não são umas eleições ou meia dúzia de empregos, mas o futuro da espécie humana.

Aceitar a ideia de que quaisquer eleições vão resolver a crise climática é juntar-se à fila do matadouro e caminhar placidamente na direção da catástrofe, cantando slogans diferentes, mas recusando abandonar o hábito de seguir o da frente. Aceitar a normalidade de umas eleições que negam a nossa ameaça existencial nem propõe a sua solução é legitimar o caminho para o colapso. Não o faremos.

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