Para acabar de vez com os lisboetas

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Ao contrário do que choram as carpideiras do regime a democracia em Portugal está pujante. Mas a respectiva saúde não deve ser aferida pelo valor da abstenção verificada nas diversas eleições. O bom eleitor é o que vota com os pés.

O melhor voto é aquele em há coerência entre a escolha e a acção política. Em Portugal a emigração corresponde a um voto claro e, nos melhores anos, ganhou em quantidade à imigração que, com o atraso típico na chegada das ideias feitas a Portugal, traz agora ocupada a classe política. A escala do fenómeno varia e ao nível autárquico os bons eleitores existem há ainda mais tempo.

A queda do número de residentes em Lisboa é uma constante, fruto de duas condicionantes: o aumento exponencial do custo da habitação e o deliberado infernizar, por parte dos diversos poderes autárquicos, da vida dos residentes. Se o poder público tem a capacidade para cevar a qualidade de vida do munícipe, nada como multiplicar o número das entidades autárquicas que o podem fazer. Em Lisboa as juntas de freguesia tornaram-se repúblicas independentes que retalham de forma anárquica o já diminuto território do concelho, com lógicas de gestão absolutamente conflituantes, que mudam de rua para rua, ao sabor da arbitrariedade do poder autárquico, da respectiva ideologia, das clientelas políticas e empresariais e da fronteira do respectivo território.

Na qualidade de residente, eleitor, trabalhador e contribuinte que, possuído pela teimosia, insiste em viver em Lisboa, deixo dois exemplos dos resultados do cruzamento entre anarquia e autarcia. As piscinas municipais foram, nos tempos negros do centralismo, geridas pela Câmara Municipal de Lisboa. Tal permitia coisas extraordinárias como economias de escala na gestão de consumíveis e de serviços de gestão e manutenção mas também permitia um mínimo de coordenação para não acontecer o óbvio ululante numa gestão descentralizada: o fecho de todas as piscinas durante largas semanas durante o Verão.

Segundo, e mais sofrido, exemplo. A circulação automóvel em Lisboa está a ser deliberadamente combatida com métodos maquiavélicos pagos pelo contribuinte. Muitas ruas e avenidas transformaram-se em gincanas multicor, inúteis e geradoras de engarrafamentos. No topo norte da avenida Álvaro Pais (um dos acessos ao hospital de Santa Maria) quatro faixas estão a ser abrupta e desnecessariamente transformadas em três, em cima do cruzamento. Em Sete Rios (vulgo praça Marechal Humberto Delgado) decorre um processo keynesiano de enterramento de garrafas com notas de euro que são posteriormente descobertas por empreiteiros especializados em obra pública. A rampa de acesso nascente ao eixo norte-sul, com duas faixas foi definitivamente entaipada. Há um carreiro permanente de centenas de autocarros que, saindo do terminal rodoviário, deixaram de aceder directamente ao eixo norte-sul, têm se subir a avenida das Forças Armadas e, no já martirizado cruzamento com a avenida Álvaro Pais, virar à esquerda, descer a avenida das Forças Armadas e entrar, vinte minutos depois, no eixo norte-sul. Este formigueiro é copiado por todos os que procuram sair de Sete Rios, transformado numa gincana circular sem placas. Os engarrafamentos são permanentes, fazem perder tempo, gastam combustível, desgastam veículos automóveis e, claro, aumentam as emissões de partículas e de gases com efeito de estufa. Os engarrafamentos são repetidamente alegrados pelas sirenes das ambulâncias que procuram chegar ao hospital de Santa Maria.

A melhor forma de chamar a atenção para um problema que não existe é criá-lo. Até quando deixarão os lisboetas que abusem da sua paciência?

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