Pinho: crimes de ‘elevadíssima gravidade’ e sem arrependimento

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O acórdão ontem proferido pelos juízes Ana Paula Rosa, João Claudino e Ema Vasconcelos é arrasador para Manuel Pinho, que saiu condenado a 10 anos de prisão efetiva, por dois crimes de corrupção, um de branqueamento e um de fraude fiscal.

“O conjunto dos factos provados evidencia uma elevadíssima gravidade” e não se provaram as explicações “inverosímeis” que Manuel Pinho deu para continuar a ser pago por Ricardo Salgado quando passou a integrar o Governo de José Sócrates. Pelo contrário, o Tribunal deu como provado que houve entre ambos “um pacto corruptivo” para beneficiar os interesses do GES e critica duramente a postura que Pinho e a mulher assumiram ao longo do julgamento, “não demonstrativa da interiorização da gravidade das suas condutas”. Tudo visto e revisto, ao ponderarem a pena a aplicar, os juízes afirmam que “os arguidos não beneficiam de atenuantes gerais, como a confissão ou o arrependimento” – que nunca manifestaram.

Para este desfecho do julgamento muito contribuiu “a postura” assumida pelo ex-ministro que, salientam os juízes, só não negou aquilo que não pôde (nomeadamente, a extensa prova documental). Apresentou, afirmam, “inúmeras justificações inverosímeis, incoerentes e ilógicas”, “apenas enquadráveis numa realidade virtual, não verosímil, sem correspondência com a realidade da vida e das coisas de facto vivenciada pelos cidadãos”, “não tendo as mesmas sido corroboradas por qualquer outro meio de prova”.

“Da conjugação de toda a prova produzida e à luz das regras da experiência comum, no que respeita a todas as citadas contrapartidas financeiras que foram recebidas pelo arguido Manuel Pinho por ordem do arguido Ricardo Salgado, o Tribunal alcançou a conclusão segura de que entre os arguidos Manuel Pinho e Ricardo Salgado foi celebrado um pacto corruptivo visando que o primeiro, enquanto exercesse funções públicas (desde logo na qualidade de Ministro da Economia e da Inovação), beneficiasse indevidamente os interesses, diretos e indiretos, do GES/BES e do arguido Ricardo Salgado”, afirma o acórdão.

“Ao atuar da forma descrita, o arguido Manuel Pinho mercadejou com o cargo público que ocupou, violando os deveres de isenção e probidade a que se encontrava vinculado””, acrescenta-se.

O Tribunal elenca os factos da acusação que dão como provados e não provados (poucos), assinala as testemunhas cujos depoimentos considera terem credibilidade ou não (caso de José Sócrates) e conclui que, no âmbito desse pacto de corrupção, Manuel Pinho recebeu do GES contrapartidas monetárias, através da offshore da família (a ES Enterprises), “por ordem do arguido Ricardo Salgado”. Essas contrapartidas, pagas enquanto foi ministro, eram diretamente enviadas para a Tartaruga Foundation (offshore em que Pinho era um dos beneficiários, juntamente com a mulher, Alexandra Pinho), para a respetiva conta no Banque Privée Espírito Santo, na Suíça. Esses pagamentos “tiveram como objetivo manter o arguido Manuel Pinho ao serviço dos interesses do BES/GES, primeiro enquanto exerceu funções públicas no Governo, na qualidade de Ministro da Economia e da Inovação, e depois quando exerceu funções na qualidade de Presidente da Comissão Executiva de Candidatura no âmbito da candidatura de Portugal à organização da Ryder Cup 2018”.

A acusação do Ministério Público – que tinha sido deduzida pelos procuradores da República Carlos Casimiro e Hugo Neto(um dos procuradores da Operação Influencer) – foi, no essencial, dada como provada.

O acordo de corrupção e o branqueamento das quantias recebidas, feito por Pinho e mulher, são descritos ao logo quase 700 páginas.

Em síntese, e citando o acórdão: “Quando Manuel Pinho foi escolhido para ocupar o cargo de ministro da Economia e da Inovação, Ricardo Salgado prometeu-lhe desde logo e a fim de promover, publicitar e beneficiar indevidamente, se necessário e na medida do possível, e de forma direta e indireta, os interesses do GES/BES, e os seus próprios, e a estar sempre disponível para tal enquanto membro do Governo: a continuação do recebimento do montante mensal de cerca de 15 mil euros que lhe vinha sendo transferido até então pelo GES, mesmo depois de sair do Governo, o que veio a ocorrer, mensalmente, até junho de 2012 e em 2013 e 2014 numa única transferência em cada um desses anos; o pagamento de 500 mil euros a curto prazo, o que ocorreu a 11 de maio de 2005, quando o arguido Manuel Pinho já exercia funções governativas há cerca de dois meses; a passagem à reforma aos 55 anos com uma pensão equivalente a 100% do salário pensionável, a qual, tendo-lhe sido negada em 2010 pelo Fundo de Pensões do BES, foi substituída por ordem deste pelo regresso do arguido Manuel Pinho ao GES/BES, através da nomeação como administrador do BES África”.

Manuel Pinho vai continuar em prisão domiciliária e o Tribunal condenou-o ainda pagar 4,9 milhões de euros de indemnização ao Estado. Já Ricardo Salgado foi condenado a seis anos e 10 meses de prisão por dois crimes de corrupção ativa para ato ilícito e um crime de branqueamento – sendo que os juízes salientam que tiveram já em conta o seu estado clínico, considerando que o mesmo deverá ser reavaliado em fase de execução da pena. Alexandra Pinho foi condenada a quatro anos, com pena suspensa, por um crime de fraude fiscal e outro de branqueamento.

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