Pinto da Costa celebra 86 primaveras: largos dias têm 100 anos...

8 meses atrás 63

Poucos presidentes - em Portugal será caso único - se podem orgulhar de ouvir o seu nome ser entoado a plenos pulmões, pelos adeptos do seu clube, jogo após jogo, nos diversos campos do país.  

A realidade é que Pinto da Costa é um caso raro de unanimismo dentro do seu clube, um caso único na história do futebol nacional. Amado pelos portistas, idolatrado pelas massas populares da «Cidade Invicta» afetas ao clube, o dirigente máximo do clube azul e branco está para o FC Porto como Eusébio estará para o Benfica e a sua liderança icónica e carismática transformou para sempre o seu clube e o equilíbrio desportivo em Portugal.

Fora da Invicta, em casa dos rivais, Pinto da Costa representa como que uma personificação diabólica de uma figura maquiavélica, odiada por muitos, temida por outros tantos, não haverá um adepto rival que lhe seja indiferente . 

Amado ou odiado, tem por certo o seu lugar marcado na história e será difícil encontrar um português que não tenha opinião formada sobre ele.

Filho da burguesia portuense

Jorge Nuno Pinto da Costa durante um ato eleitoral em meados dos anos 70

Jorge Nuno de Lima Pinto da Costa nasceu no seio de uma tradicional família burguesa, na freguesia de Cedofeita, cidade do Porto, a 28 de dezembro de 1937.

Depois dos estudos primários e de aulas privadas em casa de inglês e de francês vai estudar para o famoso Colégio Jesuíta das Caldinhas, em Santo Tirso, onde nunca se deu bem com a dura disciplina dos clérigos, demonstrando desde cedo um génio e rebeldia difíceis de conciliar com a obediência acrítica.

Dececionado com a vida académica, acaba por não seguir o caminho do seu irmão, não continuando os estudos, abdicando da possibilidade de ingressar na universidade, para voltar ao Porto, onde inicia a vida profissional, ajudando nos negócios da família.

Ouvir Calabote pelo rádio

Anos antes, ainda na infância, descobrira o amor da sua vida, a paixão avassaladora pelo FC Porto. Guiado pelo seu tio, assistiu ao primeiro encontro dos azuis e brancos contra o SC Braga e mais tarde estaria entre os adeptos que se deslocaram a Torres Vedras para acompanhar o jogo da última ronda que podia dar o título aos portistas, numa tarde de sol, drama e muito suspense... 

Trata-se da famosa tarde em que enquanto o FC Porto vencia o Torreense por 0x3, na Luz, o Benfica vencia a CUF por 7x1, com a famosa arbitragem de Inocêncio Calabote, que ainda hoje provoca acaloradas discussões.

Entre a multidão, o jovem Jorge Nuno foi um dos muitos que sofriam, com os olhos no relvado e os ouvidos colados ao rádio. A situação atingiu picos de dramatismo durante os doze minutos que mediaram entre o fim da partida em Torres Vedras e o apito final em Lisboa, tendo sido este momento, na opinião do próprio, um dos mais marcantes na sua formação futebolística, no qual chorou de alegria pela vitória do seu clube.

De jogador a dirigente

Na sua juventude, como guarda-redes do Sporting Clube Coimbrões, um clube de Vila Nova de Gaia

Entretanto ainda jogou futebol no Infesta e foi guarda-redes de leão ao peito, no Sporting de Coimbrões, um clube de Vila Nova de Gaia, antes de se tornar dirigente do FC Porto pelas mãos de Cesário Bonito, como chefe da secção de hóquei em patins. Tinha então 35 anos.

Do hóquei patinado passou para o de campo e mais tarde para o pugilismo, onde se tornaria diretor durante o consulado de Afonso Pinto de Magalhães. Foi nessa altura que conheceu Reinaldo Teles, futuro companheiro de luta e que era então um dos pugilistas do clube.

Ao futebol chegaria por indicação de Américo de Sá, em 1976, para chefiar o departamento de futebol, num período difícil em que o clube não festejava nenhum campeonato desde a famosa tarde de Torres Vedras em 1959. 

«Largos dias têm cem anos...»

Ao lado de Américo de Sá e com Pedroto como seu treinador lançou-se à conquista do Campeonato, há tantos anos longe das Antas, festejado em 1977/78.

Seguiu-se o bicampeonato e o tri acabaria por escapar perto do final da época para os leões, provocando o estalar do verniz entre Américo de Sá e Pinto da Costa, que se vê afastado do clube com a denúncia pública do seu estilo truculento e a desproporção dos seus ataques a Lisboa, na opinião de Américo de Sá.

As palavras do Presidente caem mal na nação portista e Pedroto e demais equipa técnica saem do clube em solidariedade com Pinto da Costa, enquanto 14 jogadores entram em greve, recusando-se a apresentar-se nas instalações do clube, treinando-se na praia, sozinhos.

Na cidade corriam rumores de que seria Pinto da Costa que estava por detrás dos revoltosos mas todos os envolvidos no caso o ilibaram, acabando por se saber que eram os jogadores que custeavam os treinos. 

Jorge Nuno Pinto da Costa (esq.) e José Maria Pedroto (dir.): os dois obreiros do FC Porto que dominou o panorama desportivo nacional a partir do final dos anos 80

Eram os dias do «Verão Quente» na invicta, onde as emoções vividas na zona das Antas, e um pouco por toda a cidade, elevaram a temperatura a valores bem mais altos do que as habituais provocadas pela canícula dos meses de verão.

A «Guerra Civil azul e branca» acalmaria em Agosto de 1980. Oliveira saía do clube, Gomes era vendido, Octávio voltava para a sua Palmela. Sem os principais líderes do balneário a cabeça da rebelião estava cortada, Américo de Sá reforçava o seu poder, mas a verdade é que a sua era tinha os dias contados...

Senhor Presidente

FC Porto de Stessl - o treinador que veio substituir Pedroto - passou à história ganhando apenas uma Supertaça, e em 1982 Pinto da Costa voltava ao clube pela porta grande, recebido como herói e tornando-se no 33.º presidente do clube, após vencer as eleições.

Com um já debilitado «Zé do Boné» no banco, Jorge Nuno Pinto da Costa inicia uma revolução no clube e por arrasto no futebol (e desporto) nacional, lançando as bases de um FC Porto de dimensão europeia.

O primeiro grande troféu ganho durante a sua presidência seria simbolicamente conquistado pela secção de hóquei em patins que venceu a Taça das Taças, mas seria no futebol que o FC Porto se tornaria num clube reconhecido mundialmente. 

À conquista da Europa: de Basileia a Viena

Em 1984, com Pedroto já muito doente e incapaz de acompanhar a equipa, o FC Porto perde a final da Taça das Taças, mas a máquina de sucesso do clube estava lançada. No princípio do ano seguinte, José Maria Pedroto perde a sua batalha com o cancro, provocando enorme comoção na nação portista e em Jorge Nuno Pinto da Costa, profundamente comovido por perder o amigo, e companheiro de luta.

Com Artur Jorge (dir.) segurando a Taça dos Campeões Europeus, conquistada com uma brilhante vitória por 2x1 sobre o Bayern München

Mas o FC Porto de Pinto da Costa, à imagem de Pedroto, sabia fazer da fraqueza a sua força e recuperou para ser campeão no final dessa época, depois de, numa jogada de mestre, Jorge Nuno contratar o jovem Paulo Futre ao Sporting.

Com Futre, Gomes, João Pinto e Madjer o FC Porto conquistou o bicampeonato e abriu as portas da Taça dos Campeões de 1986/87, que terminaria com a vitória em Viena, na noite do mágico calcanhar de Madjer.

Seguiram-se a Supertaça europeia e a Taça Intercontinental e em Lisboa os rivais assistiam como que paralisados à ascensão do rival nortenho. O FC Porto desbrava o caminho, assumindo-se como uma força emergente do futebol do continente.

Em Portugal os azuis e brancos, que entretanto passaram a ser conhecidos como dragões, tomaram de assalto o poder e deixaram o Benfica e o Sporting quase restringidos ao papel de meros observadores das glórias portistas.

Entre 1995 e 1999 o clube conquistou o «pentacampeonato», ultrapassando o tetra dos famosos «Cinco Violinos» do Sporting, feito que nem o grande Benfica de Eusébio havia conseguido.

Um Porto de honra

Na viragem do milénio dois títulos do Sporting e um do Boavista pelo meio marcaram a pior fase do seu reinado à frente do clube das Antas.

José Mourinho iniciou no FC Porto e com Pinto da Costa o caminho da glória que o transformou no mais aclamado treinador mundial

Mas seria ainda no ano do último título leonino que Pinto da Costa, em mais um golpe de visão, contratou José Mourinho, que fora demitido do Benfica e recusado pelos sportinguistas, treinando então a União de Leiria e iniciando mais uma era dourada dos dragões.

Enquanto o clube ia contruindo o novo Estádio do Dragão, Mourinho formava uma equipa em volta de Deco, Ricardo Carvalho, Jorge Costa e Vítor Baía, conquistando o campeonato de forma imperial, além da Taça de Portugal e regressando aos sucessos na Europa, vencendo a Taça UEFA.

Um ano depois, além de novo campeonato, aquele que viria a ser o Special One, liderou os dragões à conquista da Liga dos Campeões, com um claro 3x0 sobre o Mónaco na final.

Apito Dourado

Apesar da glória na liga das estrelas, as nuvens negras aproximavam-se sob a forma do «apito dourado», um megaprocesso de investigação sobre a corrupção de árbitros e dirigentes do futebol nacional.

Depois de ter sido constituído arguido Jorge Nuno Pinto da Costa viria a ser indiciado pelo crime de corrupção desportiva. Acossado por uma forte campanha que envolveu um livro, da autoria da sua ex-companheira Carolina Salgado, e um filme, que alimentaram discussões e debates e que dividiram a opinião pública do país, Jorge Nuno Pinto da Costa pugnou desde cedo pela sua inocência e do seu FC Porto.

No decorrer dos trâmites, e com o processo em andamento que conduziria ao julgamento, o FC Porto viu-lhe ser retirados seis pontos na secretaria, mantendo o título de campeão, e Pinto da Costa foi suspenso por dois anos.

Durante o verão de 2008 a UEFA, após queixa apresentada pelo Vitória de Guimarães e pelo Benfica, excluía provisoriamente o clube das competições europeias. Mas o FC Porto contestou e pouco tempo depois voltava ser readmitido na Liga dos Campeões, iniciando a viragem da maré para o clube, que veria mais tarde o seu Presidente ser ilibado das acusações no caso «apito dourado» e recuperaria os pontos perdidos na secretaria.

Mais vitórias

Resolvidos os problemas na barra do tribunal, Pinto da Costa, que nunca perdera o norte, liderou o clube à conquista do «tetra», entre 2005 e 2009.

Depois de voltar a ficar em terceiro lugar pela segunda vez no seu mandato, no campeonato de 2009/10, foi buscar André Villas-Boas para liderar o barco portista, em mais uma jogada que se revelou brilhante.

Com Villas-Boas, em Manchester, num jogo da Liga Europa (2012) @Catarina Morais

Mais uma época de domínio avassalador, com o FC Porto a acabar a Liga pela primeira vez sem sofrer nenhuma derrota, conquistando o seu 25.º campeonato, além da Taça de Portugal e da Supertaça e coroando tudo isso com o triunfo na Liga Europa, o sétimo troféu internacional do clube.

Campeonato atrás de campeonato o FC Porto de Pinto da Costa tornou-se uma máquina conquistadora de troféus, conseguindo resultados nunca antes atingidos por outro clube em qualquer outra era, ao ponto de nenhum dirigente no Mundo ter alcançado mais títulos do que ele.

Hegemonia a fugir

Os anos mais recentes foram menos fulgurantes por parte do FC Porto. Vítor Pereira acrescentou mais dois títulos nacionais ao clube, completando o tri, só que a isso seguiu-se uma fase em que o Benfica se reergueu.

Jorge Jesus levou as águias ao título em 2014 e 2015, os portistas investiram fortemente no plantel (Iker Casillas foi o exemplo mais mediático), só que Rui Vitória continuaria a consolidar as conquistas encarnadas, num período de seca que foi recorde na era de Pinto da Costa.

O jejum terminou com a conquista do campeonato nacional em 2017/18, sob o leme de Sérgio Conceição, antigo futebolista dos azuis e brancos. Foi a 21ª vez que os dragões se sagraram campeões na era do icónico presidente. 

O Benfica ganhou o campeonato seguinte, mas o FC Porto voltou às conquistas em 2020, e logo com Liga, Taça e Supertaça, novamente com Sérgio Conceição à frente da equipa. Sobre o treinador, Pinto da Costa não deixou dúvidas: «Só sai quando eu morrer».

Nesse mesmo ano foi reeleito como presidente dos dragões, com 68,65 por cento dos votos dos sócios que, segundo o próprio, deram «um exemplo de vitalidade, respeito e interesse pela vida do FC Porto». Falharia o título em 2021, mas no ano seguinte, o 40º à frente do clube, Pinto da Costa viu o seu clube caminhar a passos largos para mais uma temporada à Porto.

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