Provas do processo BES vão ser exibidas com um simples clique

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Apesar dos 215 volumes que o processo principal do Banco Espírito Santo conta actualmente, a que se somam centenas de apensos, não se prevêem grandes maratonas dos funcionários entre a sala de audiência e a divisão onde o gigantesco processo em papel está guardado, ambos no piso 3 do Edifício A, no Campus da Justiça, em Lisboa.

Isto porque a prova que está em análise no julgamento — tanto a apresentada pelo Ministério Público quanto a acrescentada pelas defesas — está toda digitalizada e organizada no SEGIP — Sistema Electrónico de Gestão de Informação Processual, que estará à disposição dos juízes que vão começar nesta terça-feira a julgar o caso.

Fruto de um trabalho prévio de uma equipa de sete pessoas, esta ferramenta informática permite interligar cada elemento de prova a um determinado facto que ou o Ministério Público ou as defesas querem que seja considerado provado pelo tribunal.

Podem ser gravações de uma escuta telefónica, fotografias de uma vigilância, um manuscrito apreendido a um arguido, um relatório, uma carta ou um extracto bancário, entre uma panóplia de outras opções, que podem ser associadas a um arguido ou até a uma testemunha que vai falar sobre o mesmo.

O objectivo é facilitar o cruzamento da informação e a compreensão global da prova nos megaprocessos, que pela sua dimensão tornam-se muito difíceis de julgar, o que leva a que muitas vezes esta fase se prolongue durante anos.

“Neste processo, temos a prova indexada a cada capítulo e subcapítulo da acusação. Fizemos mais de 12 mil associações de prova”, resume ao PÚBLICO o juiz António Costa Gomes, membro da equipa de Apoio Logístico à Tramitação de Elevada Complexidade (ALTEC), lançada em Dezembro do ano passado pelo Conselho Superior da Magistratura.

Esta equipa, formada por dois juízes, quatro funcionários judiciais e um engenheiro informático, pretende colocar a tecnologia ao serviço da Justiça, recorrendo a instrumentos sofisticados que facilitam o trabalho diário dos juízes. Está pensada, por exemplo, o recurso a uma ferramenta de transcrição automática, que permitirá passar a escrito de forma imediata aquilo que uma testemunha ou um arguido disse em tribunal.

Para breve está previsto que 20 assessores que trabalham nas comarcas a apoiar os juízes passem a trabalhar em rede com a ALTEC, dando uma outra escala a esta equipa e servindo como pontos locais na identificação de processos em que se justifique a utilização do SEGIP.

Mas aqui a ajuda não é imposta a ninguém. Tem de partir dos juízes que têm um determinado megaprocesso entre mãos o pedido para esta equipa intervir. António Costa Gomes e o colega, João Ferreira, contactam quem os accionou, avaliam as necessidades e planificam o apoio de acordo com os recursos disponíveis.

Sobre o BES, António Costa Gomes não esconde que fruto da dimensão do processo considerado por juízes que nele intervieram o mais complexo de sempre a ser analisado pela Justiça portuguesa não foi possível fazer tantas associações de prova como noutros casos mais pequenos. Mas mesmo assim não tem dúvida da mais-valia desta ferramenta, que vai permitir dar uma outra dinâmica ao julgamento.

Pelo menos deverá impedir um espectáculo frequente nos megaprocessos, em que os funcionários judiciais são obrigados a encarnar uma espécie de Indiana Jones em busca de documentos perdidos, entre centenas de volumes em papel. Uma tarefa morosa que empena o andamento dos trabalhos.

O embrião deste sistema foi criado em 2011, para o julgamento do processo Face Oculta, fruto da carolice de António Costa Gomes, que, para o desenvolver, fez três cursos online pagos do seu bolso e adquiriu várias licenças de software. Mas isso já foi na pré-história da ferramenta, que, entretanto, tem uma nova versão criada de raiz por um engenheiro informático, oriundo da PSP, que actualmente trabalha como técnico especialista no Conselho Superior da Magistratura.

Apesar das limitações, o antepassado do SEGIP foi suficiente para, com uma instalação de som, um projector e uma tela, a Justiça fazer um brilharete no julgamento do Face Oculta, cuja logística levou vários advogados a fazerem um elogio, raro, sobre as condições do tribunal. Na sala do julgamento do BES, bem mais pequena do que o salão do Palácio da Justiça de Aveiro onde foram julgados os 36 arguidos do Face Oculta, não há projector nem tela, mas duas televisões, onde a prova será exibida.

Tanto nos primórdios como na actualidade, as questões de segurança não foram esquecidas. Por isso, o sistema informático não é posto em rede, ficando alojado num servidor local, onde são inseridos os documentos digitalizados. Na sala do julgamento do BES vão estar disponíveis dois computadores, onde os advogados poderão consultar o SEGIP com a prova organizada.

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