"Continuidade" e "compromisso". Governo cumpre 100 dias no poder

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Cumprem-se 100 dias, esta quarta-feira, desde que o atual Governo tomou posse, marcando o fim de uma crise política desencadeada pelo pedido de demissão do antigo primeiro-ministro António Costa na sequência do seu envolvimento na Operação Influencer.

A 2 de abril deste ano, depois de umas eleições legislativas em que nenhum partido ou coligação chegou à maioria absoluta, o Executivo liderado por Luís Montenegro e composto por elementos do Partido Social Democrata (PSD) e do CDS-PP - como o líder centrista, Nuno Melo, na pasta da Defesa - assumiu as rédeas do país.

Desde então, foram anunciadas medidas em vários setores, desde a Habitação e a Segurança, passando pela Imigração e pela Saúde. Em sentido contrário, também foram revogadas e travadas medidas que tinham ficado do anterior Governo do Partido Socialista (PS).

Agora, aproxima-se a alta velocidade um novo teste: A proposta de Orçamento de Estado para 2025, que pode significar a queda do Governo, caso venha a ser travada pelo PS, ou pelo Chega (ou por ambos, pois não seria a primeira vez que as duas forças políticas se unem para impedir a Aliança Democrática [AD] de seguir avante com uma proposta).

PSD e PS "são irmãos gémeos"

O politólogo José Adelino Maltez - que acredita que "entre o PS e o PSD é mais aquilo que os une que aquilo que os separa", pois "são irmãos gémeos" - considerou, em declarações ao Notícias ao Minuto, que estes 100 dias não diferiram fortemente "dos últimos 400", tratando-se de um caso de "continuidade" política.

O PS exigiu um teatro de cedências do Governo, e vai haver um teatro de cedências do Governo, que vai aceitar

"O que mudou foi a conversa de fundo. Antes, chamava-se António Costa, agora chama-se Luís Montenegro", argumentou, afirmando que o que existe, atualmente, é "um anúncio de muitas boas intenções, mas impotência legislativa", sendo que "a principal ameaça a este Governo está naquela questão de o Parlamento querer governar".

"Em questões políticas, afastou-se a hipótese de uma aliança preferencial com o Chega e, portanto, o Governo vai navegar no 'centrão'. A principal coisa que discutimos é como é que vai ser o voto do PS no Orçamento, que é o que interessa agora", continuou.

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Neste âmbito, aliás, Maltez mostrou-se confiante que "o PS exigiu um teatro de cedências do Governo, e vai haver um teatro de cedências do Governo, que vai aceitar", sendo que "ninguém quer eleições a curto prazo".

Segundo considera, "não há perigo de parar a contagem" dos dias em que o atual Governo está no poder, precisamente "porque o PS não quer eleições".

"Que há uma ameaça do Parlamento face ao Governo, há, e esta situação em que o Governo não pode continuar sem apoios parlamentares específicos, também é verdade. Este Governo não é de 100 medidas, é 'sans mesures' - sem medidas. Não vê o horizonte para aplicar as suas medidas, porque este teatro de governamentalização não dura sempre, tem de haver factos minimamente reformistas. Agora, esses, o PS não diz que não, mas têm um preço alto, e o Governo vai pagá-los", vaticinou.

José Adelino Maltez enquadrou as suas declarações no âmbito das eleições legislativas em França, onde a coligação de Esquerda Nova Frente Popular venceu, ainda que sem maioria absoluta.

"O resultado das eleições em França garantiu o principal seguro de vida do Governo de bloco central em Portugal, que é a manutenção da Europa. Se a Europa explodisse através de um resultado em França complicado, isto é, tanto da Frente Nacional como da coligação de Esquerda radical, durava menos o Governo em Portugal, assim dura mais. Como há esse seguro de sobrevivência do europeísmo, tudo bem, nem interessa fazer análises finas", argumentou.

Cumprem-se 100 dias de "intenções"

Já o politólogo André Freire considerou, em declarações ao Notícias ao Minuto, que o Governo está ainda num período de "estado de graça", ou de "lua de mel", até porque "não passa pela cabeça de ninguém começar a responsabilizar o Governo atual pelo decurso dos acontecimentos, porque muitos deles vêm de trás".

"Mudanças que este Governo possa imprimir vão levar algum tempo a serem implementadas e a terem os seus efeitos. Desse ponto de vista, o Governo está ainda em estado de graça", considerou, argumentando que "a situação que temos desde 10 de março não mudou muito" e prova disso foram as eleições europeias, "onde apesar de o PS ter ficado à frente, na verdade aquilo é um empate técnico".

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"As pessoas estão a dar o benefício da dúvida e querem esperar para ver", disse o professor do ISCTE, elencando que, nestes 100 dias, o Governo conseguiu alcançar um acordo com os professores e está ainda em negociações com vários outros setores profissionais.

Ninguém espera que esteja já a produzir efeitos. De qualquer maneira, o Governo parece ter uma linha de rumo, portanto a avaliação global é positiva

O Executivo liderado por Luís Montenegro "já fez algumas propostas", mas "são ainda projetos de intenções", explicou André Freire, usando como exemplo "o caso do conjunto de medidas propostas para o Serviço Nacional de Saúde, que fala sobretudo de intenções".

"Ninguém espera que aquilo esteja já a produzir efeitos. De qualquer maneira, o Governo parece ter uma linha de rumo, portanto a avaliação global é positiva", concluiu.

Já sobre a relação do Governo com a oposição nestes três meses, André Freire admite que "o arranque não foi muito bom, com a questão das três votações para presidente da Assembleia da República", em que "há responsabilidades repartidas, mas talvez o PSD e o CDS-PP tenham sido demasiados ingénuos".

Agora, o próximo teste é a aprovação da proposta de Orçamento de Estado para 2025 (OE2025). "O que se passou nas Europeias demonstrou que a situação está bastante empatada e, portanto, haverá um pouco mais de moderação no sentido de se encontrar um compromisso. Quem tem de fazer o esforço será o Governo, mas o PS, dado o empate técnico que se verificou nas Europeias, não tem razões para ousadias de deitar o Governo abaixo, porque isso seria potencialmente suicidário", acredita o politólogo.

Situação política ainda não está "clarificada"

De momento, a situação política ainda não está "clarificada", sendo que "os entendimentos maioritários possíveis são a AD com o PS, a AD com o Chega, os três juntos ou o PS com o Chega". Nesse sentido, porém, "tem havido um esforço de aproximação por parte do Governo às várias posições", vaticinou o politólogo.

Findos os primeiros 100 dias de governação à Direita, o Executivo de Luís Montenegro tem no horizonte vários desafios, incluindo as negociações com os polícias, mas também com os médicos e os oficiais de justiça, para além, claro, da proposta de Orçamento de Estado para 2025, que obrigará a AD a encontrar pontes com os principais partidos da oposição, de forma a garantir a viabilidade da proposta e a sua continuidade no Governo.

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