Refugiados em Portugal. “O que preciso é de viver em segurança”

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Reportagem

20 jun, 2024 - 18:30 • João Cunha

No dia em que se assinala o Dia Mundial do Refugiado, a história na primeira pessoa de quem, num país na América do Sul, decidiu pegar um dia em três filhos menores e fugir para um país seguro onde foi acolhida pelo Conselho Português para os Refugiados.

Há roupa estendida num espaço interior ao ar livre, junto a parte das 100 camas disponíveis no Centro de Acolhimento de Refugiados (CAR2) do Conselho Português para os Refugiados, em São João da Talha, no concelho de Loures.

Um conjunto de camisas e calções, com meias à mistura, espera que o sol perca a vergonha e, por entre as nuvens cinzentas que teimam em não desaparecer, as seque.

O Centro de Acolhimento disponibiliza alojamento temporário, que não deverá ser superior a três meses, onde se faz o atendimento multidisciplinar aos refugiados que chegam a Portugal.

"As pessoas são encaminhadas pela AIMA, no âmbito dos programas e mecanismos de solidariedade que o Estado português tem com as Nações Unidas e com a União Europeia, nomeadamente no que se refere à reinstalação e à recolocação e, a partir daí, preparamos um plano de vida destas pessoas durante um período de 18 meses", explica a diretora do Centro.

"Os primeiros meses são neste centro e, depois de conhecermos as famílias e casos individuais que nos chegam, encaminhamo-los para os vários municípios com respostas adequadas para estas pessoas”, diz Mónica Frechaut.

Quem chega é então preparado para essa integração descentralizada. Submete-se à aferição de competências educacionais e aprende a língua portuguesa. Pelo meio realiza exames médicos e rastreios de saúde. No passo seguinte, participam em programas de orientação cultural, em que são orientados para os futuros locais de acolhimento. No fundo, prepara os refugiados e os municípios parceiros para essa integração.

Mariana, nome fictício, está há quase há quatro meses em Portugal.

“Todos os que aqui trabalham acolheram-me muito bem. Senti-me bem, mesmo não tendo sido fácil, porque foi uma mudança muito grande”, confessa esta mãe de três crianças menores, que com ela vieram da Colômbia para Portugal, onde aguardam o estatuto de refugiado.


“Aprendi a conviver com diferentes culturas e, na verdade, sinto-me, mais do que qualquer coisa, muito agradecida por me terem dado esta oportunidade de ter o que preciso neste momento: segurança”.

Decidiu sair da Colômbia por esse motivo. Revela que na cidade onde vivia, bastava sair à rua e atender o telemóvel para ser assaltado. E que estava cansada de raptos, em plena luz do dia.

“No meu país não há, infelizmente, segurança. Decidi vir para sentir o que não há no meu país, infelizmente, há algum tempo. Aqui sinto-me muito tranquila. É tudo muito diferente, sinto-me em segurança ao sair e, simplesmente, passear pelas ruas”.

Deixar o país não foi fácil, admite, mas “a decisão tinha de ser tomada”, diz esta formada em direito, que exercia advocacia no seu país de origem.

Quanto ao futuro, tem a certeza que “será bonito” e passará pelo nosso país.

Estou encantada com Portugal. Quero ficar por muito bom tempo, não sei do tempo que disponho, é claro, porque só Deus sabe, mas seja que tempo for, quero ficar por aqui”.

Preferencialmente no campo, admite Mariana, onde possa viver ainda em maior tranquilidade e onde seja possível cultivar a terra.

“Os seres humanos são capazes de desempenhar várias tarefas. Eu sou advogada e até gostava de poder voltar a exercer, em Portugal. Mas não quero apostar apenas na minha carreira. Quero estar no campo e quero aprender o português, claro”.

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E quem sabe, pelo caminho, conhecer um português com quem possa partilhar a vida, sempre com os filhos ao seu lado.

Marta Dias é formada em ciência política e relações internacionais e trabalha no departamento de mediação social do Centro de Acolhimento Temporário para Refugiados, em São João da Talha, no concelho de Loures.

“Acho que é um trabalho gratificante. Sempre estudei tendo em mente ir para área humanitária”, diz esta jovem, que admite que os momentos de muita ansiedade e muita dúvida obrigam a ter de saber gerir expectativas junto de quem chega.

Numa fase inicial, são “a ponte entre quem chega e os serviços”.

“É normal que quem chegue não saiba, por exemplo, que tem de ter número de SNS, número de Finanças, Segurança Social ou de Identificação Civil. Nós fazemos logo essa ponte e a partir daí, com um programa mais definido, articulamos com as autarquias”, adianta Marta Dias.

Porque muitos dos que por ali passam acabam em municípios, sobretudo do interior do país, onde passam a ter habitação e condições para subsistir, sem grandes ajudas.

Mas o trabalho do Centro não acaba aqui: é comum ir aos locais onde essas pessoas foram instaladas para desenvolver ações de formação e visitas programadas para acompanhar esses migrantes,

"As pessoas continuam-no a mandar mensagem, às vezes nascem bebés e vêm mostrar-nos as crianças. É uma relação gratificante”.

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