REPORTAGEM | O fenómeno das camisolas retro: «Ninguém está preparado para o quarto equipamento do Estoril»

2 meses atrás 96

Futebol. Palavra oxítona e abrangente, que significa tudo aquilo que quisermos que ela signifique. Maneira romântica de o descrever, uns dirão. «A palavra» que já conseguiu parar guerras, unir países e ser o ponto comum entre pessoas dos «quatro cantos» do globo.

Quantas paixões são comuns a uma criança que nasça no norte de África, na Europa ocidental ou no longínquo oriente asiático? Usar uma camisola de futebol sempre foi uma das maneiras mais genuínas e expressivas de tornar essa paixão pública, mas a verdade é que o conceito da «camisola de futebol» já não se baseia apenas nisso.

Para cada vez mais gente significa, além da paixão pelo desporto rei em si, um sentimento de pertença, uma ideologia e um estilo de vida. Os equipamentos de futebol, com especial incidência para aqueles que marcaram o passado, transformaram-se em valiosas peças da moda moderna.

«9» usada pelo «Fenómeno» na Copa América de 2004 @zerozero

Porquê o antigo e o retro? A explicação divide-se em argumentos bastante simples, mas que envolvem emoções difíceis de explicar. Como se explica aquilo que se sente ao usar a «10» de Maradona, banhada a azul bebé e com o patrocínio da Mars? Ou a «22» de Kaká usada em 2007/08 ao serviço do Milan? Ou a «9» de Ronaldo «Fenómeno» usada na Copa América em 2004? Difícil, certo?

A verdade é que, além destes sentimentos mais individualistas e quase inexplicáveis, acrescentam-se alguns lógicos: o efeito nostalgia, a declaração de identidade e sentimento de pertença, o design e qualidade intemporais, as trocas culturais e, claro, a sustentabilidade.

Com este exercício em mente o zerozero decidiu abordar os responsáveis pela camisola que está a fazer furor em Portugal e que promete fazer ainda mais no mundo dos equipamentos: o Estoril Praia.

Mais do que uma camisola de futebol

Começámos por questionar António Nobre, assessor do clube estorilista, sobre o fenómeno das camisolas retro e a repentina entrada no mundo da moda: «Exatamente, há uma moda das camisolas retro. Há uma descontextualização da camisola de futebol». 

Lançamento equipamentos Venezia 2022/23 @FC Venezia

«O Venezia fez isso muito bem há dois ou três anos. Puseram o futebol na moda e havia ali um cruzamento dos dois mundos», começou por dizer. «Usar a camisola, mas fora do contexto de futebol, em modelos e não em jogadores. E depois esta moda do retro. Acho que existe um romance para aqueles valores, para puxar ao familiar, à infância, ao nostálgico», completou. 

O dirigente canarinho acrescentou: «Agora vamos a uma loja de fast-fashion e as marcas já fazem designs de roupas de futebol e inventam camisolas de futebol, que não são de clube nenhum. O nosso objetivo foi: tentar fazer um cruzamento entre a estética comercial e a nossa ideologia- e acho que o conseguimos».

(Pode ler a reportagem completa sobre o lançamento dos equipamentos da formação italiana aqui.)

Support Your Local Team

A premissa é simples. «O retro traz-te muito mais autenticidade», e é atrás desse sentimento que o clube de Cascais está a ir... e foi. De relembrar que no ano passado – 2023/24 - o Estoril Praia já se havia destacado pela reutilização dos equipamentos usados na época transata – 2022/23 -, numa medida que apelava à sustentabilidade, causa defendida exemplarmente pelos canarinhos.

Mas qual é o ponto comum entre o «retro», o sustentável e a «ideologia estorilista»?

Na visão do responsável canarinho, «ser um clube sustentável é parte da identidade do Estoril Praia», representada pelas inúmeras medidas impostas e sugeridas pelos estorilistas. Entre elas, a utilização de garrafas reutilizáveis, a intenção de eletrificar o estádio de «maneira diferente» e vender energia à rede, ter um autocarro elétrico no futuro, assim como os corta-relvas, e conseguirem produzir a sua própria eletricidade.

«O equipamento anterior tinha as cores do ecoponto, os próprios padrões. No amarelo era o plástico amarfanhado, o papel rasgado no azul e o vidro estilhaçado no verde.», introduziu. 

Destaque para as mangas preenchidas com símbolos da marca, típicas dos anos 80/90 @GD Estoril Praia

Para a temporada 2024/25 o objetivo estava bem delineado: «Vamos desenhar algo que seja extremamente bonito e depois que tenha esta nossa narrativa de autenticidade e esta coisa vintage do Support Your Local Team», completou.

«Será o retro a melhor forma de passar essa mensagem e esse sentimento de pertença?», questionámos. «Ao mostrar uma coisa antiga ela soa a autêntico. É uma coisa que já existe para trás, que apela ao sentimento. Quando se usa uma coisa antiga e lhe juntas uma narrativa forte para a contar… Ganha outro peso, ganha outra dimensão».

Criar uma «peça de arte bonita» e fazer não só dos adeptos, mas também dos turistas, «embaixadores do Estoril no mundo» é um desejo real do clube de Cascais.

Tendo este desejo em conta, António Nobre rapidamente explicou ao nosso portal a importância que, neste caso, a Kappa teve em todo o processo: «Trabalhamos com uma marca que nos dá muita liberdade criativa, dão-nos uma liberdade enorme para trabalharmos no design que queremos atingir». 

«No caso do Estoril, o clube fez 85 anos, que é um dos detalhes que temos na parte de trás da camisola. E nós achámos que era uma oportunidade perfeita de apelar ao support your local team [apoia tua equipa local] e de ir buscar esse sentimento», esclareceu.

«Take moderno, num design vintage»

O dirigente canarinho adiantou ainda que, dada a «jovem idade» do octogenário clube de Cascais - 85 anos -, a decisão passou por «pegar num design retro, mas dar-lhe um toque moderno». E prosseguiu na explicação pormenorizada de algumas decisões.

«Aquelas franjas nas mangas, com os símbolos da marca, eram antigamente cosidas e acrescentavam volume e peso às camisolas, as nossas não. Fomos à procura das nossas cores, mas de um ponto de vista moderno. Aquele amarelo um bocadinho mais torrado e mais condizente com a nossa estética de praia. São cores muito mais modernas do que aquele amarelo mais deslavado, menos brilhante, que seria a nossa aplicação retro», clarificou. 

qVimos, por exemplo, os trabalhos que a Kappa fez com o FC Porto nos anos 90

António Nobre

António Nobre foi mais além e desvendou que, além do tecido da camisola ser em poliéster reciclado, todos os cortes da mesma são «ultramodernos»: «Um jogador com aquilo vestido, a camisola fica toda justinha para não o conseguirem agarrar».

«Fomos à procura disso, de um take moderno num design vintage, mas muito técnico. Ou seja, aquilo tem que ser uma camisola muito técnica para os nossos jogadores. Acho que conseguimos encontrar o equilíbrio perfeito daquilo que pretendíamos».

Inspiração

«Viram alguns exemplos do passado para se inspirarem?», interpelámos. «Vimos, por exemplo, os trabalhos que a Kappa fez com o FC Porto nos anos 90. A franja na manga era algo que queríamos muito usar, mas a nossa primeira demo não tinha nada a ver com o modelo final», disse António Nobre segundos antes de mostrar, em primeira mão, ao nosso portal, o primeiro modelo do equipamento principal do Estoril Praia para a temporada 2024/25. 

Pedro Álvaro experimenta primeira demo do equipamento versão 2024/25. Imagem exclusiva fornecida pelo: @GD Estoril Praia

«A diferença é enorme!», reagimos. O dirigente canarinho, de sorriso no rosto, não hesitou: «O processo de trabalhar num equipamento novo é incrível. Dá muitas dores de cabeça, dá muita desilusão, vai para a frente, vai para trás, às vezes as coisas não resultam como esperas, mas o processo acaba sempre por valer a pena.»

Feedback recebido

«Esperavam uma reação tão efervescente e calorosa como esta?», questionámos. O responsável estorilista revelou-se surpreendido, não pela reação positiva, mas pela magnitude da mesma. «Estávamos à espera de uma boa reação. Não sei era se estávamos à espera de uma reação tão boa», respondeu.

O risco existe quando a intenção passa por «fazer algo disruptivo» e, como consequência, surgiram algumas dúvidas, admitiu-nos António Nobre: «Por exemplo, o azul que usámos é um tom mais escuro do que o azul das últimas épocas do Estoril, que era mais brilhante. Mesmo no símbolo, passámos de um que era microbordado para uma coisa monocromática e emborrachada, mais moderna».

«Tínhamos aqui algum receio, mas a reação foi unânime. Toda a gente gostou da camisola e isso deixa-nos muito orgulhosos», revelou.

Quarto equipamento!?

E, quando já percorríamos a reta final da agradável conversa com António Nobre, eis que o representante do clube de Cascais deixou cair no colo do zerozero a seguinte frase: «Eu acho que as pessoas não estão preparadas para o quarto equipamento do Estoril».

Como? Um quarto equipamento? Capaz de causar um rebuliço ainda maior? As questões entupiram a videochamada que, outrora perto de chegar ao fim, vira uma nova luz. 

qO quarto equipamento vai pôr o Estoril numa dimensão mundial

«Vamos lançar daqui a pouco tempo o segundo equipamento, e ainda teremos um terceiro que vai viver num determinado espaço-tempo, mas o quarto vai pôr o Estoril numa dimensão mundial a nível de equipamentos».

A curiosidade entope-nos as veias, e não evitámos indagar o dirigente estorilista: «Vai ser sobre…?», «Uma referência local», interrompeu-nos com entusiasmo. «Vai puxar de uma história local, mas com a qual muita gente se vai identificar. Posso dizer que vai tocar nuns nichos bastante poderosos, e mais não posso adiantar». 

A moda dos equipamentos retro veio mesmo para ficar e o Estoril Praia promete ser parte ativa do processo. 

Entretanto, quem sai a ganhar nisto tudo, somos nós. E por «nós», entenda-se: aqueles que só precisavam de uma justificação plausível para usar camisolas de futebol diariamente.

𝑆𝑜𝑚𝑜𝑠 𝑎 𝑡𝑟𝑖𝑏𝑜 𝑞𝑢𝑒 𝑣𝑖𝑣𝑒 𝑜𝑛𝑑𝑒 𝑎 𝑡𝑒𝑟𝑟𝑎 𝑟𝑎𝑠𝑔𝑎 𝑜 𝑚𝑎𝑟…
𝐴𝑞𝑢𝑖, 𝑜 𝑠𝑜𝑙 𝑛𝑎 𝑝𝑒𝑙𝑒 é 𝑏𝑟𝑜𝑛𝑧𝑒 𝑒 𝑛𝑜 𝑚𝑎𝑟 é 𝑜𝑢𝑟𝑜.

Direção artística - Colure
Produção - Zenkl, Manel Torgal, Andreia Carvalhal
Participação especial - Petra Remedio pic.twitter.com/xytIgdQ4Sw

— Estoril Praia SAD (@estorilpraiasad) July 19, 2024

Ler artigo completo