Ricardinho esteve no zerozero: «Não era por assinar pelo Sporting que ia deixar de ser do Benfica»

8 meses atrás 62

O ´5 para 4´ continua na família de podcast´s do zerozero e, agora às terças-feiras, vai continuar a comentar futsal! Do nacional ao internacional e sem nunca esquecer o feminino, no nosso podcast vai se falar de futsal a sério, sempre com um belo e especial toque de humor à mistura...

Sim, nós sabemos que o Sporting voltou a perder pontos na Liga Placard, que vem aí a Taça da Liga... mas Ricardinho é Ricardinho. E só por isso tem de ser um episódio bem especial.

O melhor jogador português da história do futsal esteve no zerozero e lançamos agora o primeiro videocast da história do 5 para 4: o convidado merece e a conversa é imperdível!

@FPF/André Sanano

«A proposta do Sporting era surreal»

zerozero (ZZ): Ricardinho, obrigado por estar aqui, por ter aceitado o convite. Está de férias, não é?

Ricardinho (R): Estou, estou a aproveitar agora, por isso é que demoramos mais um bocadinho [a combinar a entrevista]. Estou chill out.

ZZ: Recentemente esteve muito perto de ir à final four da Champions com o Riga...

R: Estive à porta. Era um sonho. O estar ali, no último jogo com o Barcelona, a um golo de ir a uma final four, já é um sonho para eles, de todos os amantes da modalidade no Leste. É duro porque estás um golinho, mas também sabes o porquê. E assim consegues digerir melhor.

ZZ: Em 2018, esteve perto do Sporting. Nessa altura só não aceitou porque achou que o Bruno de Carvalho estava mais perto do Big Brother do que de continuar como presidente [risos]?

R: Podia ser, mas não [risos]. Porque eu senti que aquilo era sério demais. Ao início levei aquilo como uma brincadeira, porque surgiu quando tínhamos acabado de ser campeões em Saragoça, quando ganhámos ao Sporting na segunda final consecutiva na Champions. E as equipas estavam todas no mesmo hotel.

Estávamos a jantar, a festejar, e lembro-me perfeitamente que estava com o presidente do Inter [Movistar] ao lado e veio o Bruno de Carvalho. E disse ao nosso presidente que no ano seguinte ia ganhar a Champions porque ia buscar a chave da sua equipa. Que era eu. Mas com um tom que parecia de brincadeira.

@Inter Movistar

O que é certo é que passado uns dias contactaram-me e disseram que era mesmo para ir para frente e depois começaram a falar com o presidente, queriam pagar a cláusula. Mas depois a cláusula já não era de um milhão, já era de um milhão e meio, e depois já começou a haver ali muitas confusões. Já comecei a ver coisas que já estavam a entrar em partes pessoais, entre adeptos e tal, e achei que não faria muito sentido.

Eu sempre tive a sorte de, muito possivelmente, ter sido dos jogadores mais pagos de sempre no futsal. Números que não se praticam no futsal. Mas aquela [do Sporting] superava em 10 vezes mais. Estamos a falar de uma coisa surreal. Entendo perfeitamente a parte do Benfica, dos benfiquistas, de ficarem chateados e essas coisas todas, mas também acho que tem que haver o entendimento de que nós somos atletas profissionais.

Se eu tivesse assinado pelo Sporting, não era por isso que eu iria deixar de ser do Benfica ou gostar do Benfica. Nós portugueses temos muita dificuldade em separar as águas... mas pronto não aconteceu. 

ZZ: Tem noção de quantas abordagens/propostas diferentes teve ao longo de toda a carreira? E qual foi a mais estranha?

R: Mais estranha acho que foi agora uma da China, há uns três anos. Era uma loucura de números também, impossível de se pensar. Mas que tinha uma cláusula muito pequenininha que dizia assim: nós [China] estamos a sofrer uma segunda praga da Covid, a Covid-0. E se houver um caso de covid na tua cidade não recebes mais até voltares ao ativo. E eu respondi que ia se me pagassem um ano adiantado. Estavámos a falar de algo perto dos 70 mil euros por mês, uma coisa maluca, não se pratica no futsal.

@Riga FC

Mas convites recebi muitos. Eu sempre disse que queria ser uma pessoa que, quando chegasse a reta final da carreira não queria andar a arrastar e ao mesmo tempo disse que queria dar ao futsal aquilo que ele me deu a mim. E o maior agradecimento que eu queria fazer era ser embaixador de futsal um dia pela UEFA. Ou então ser eu mesmo a tentar ser eu esse embaixador, mesmo não tendo suporte por trás.

A Indonésia foi muito pela questão de ajudar a que os olhos virassem um pouco para um local para onde não se olhava. Já o Riga foi uma coisa pessoal, porque eu queria bater o recorde de golos na Champions. Mexeu um bocadinho comigo, mas também a parte do projeto que está a ser muito difícil, porque as pessoas tem a mentalidade muito fechada e é difícil tirá-los daquele caminho. Está a ser um objetivo e um desafio muito bonito. 

qSó quero jogar num clube em cada país... Do Barcelona tive quatro ou cinco ofertas

Mas eu queria muito tentar levar um pouco do futsal a todos os lados. Vou a Singapura no próximo mês, por exemplo, para fazermos uma exibição de futsal. Até acho que vai ser a primeira vez que me vou juntar com o Falcão num evento assim. Era mais fácil se já não estivesse a jogar porque me estão constantemente a mandar mensagem para eu ir e tal, para fazer eventos. Mas eu ainda estou a jogar e quero ser competitivo ao máximo, depois quando acabar sento-me e faço o que apetecer.

Eu sempre disse que gostaria de só jogar num clube por cada país. Em Portugal é difícil, porque comecei aqui, sou daqui. Mas fora, se pensarem, eu tive ofertas. Do Barcelona tive quatro ou cinco ofertas. E rejeitei sempre, não pelo clube, que é gigante, mas porque tenho essa coisa de ser fiel. Recebi há três dias uma oferta para voltar para a Indonésia para outro clube.

No próprio Riga: tive em negociações para sair agora em dezembro, porque não estou a conseguir mudar a mentalidade do presidente e estou a sentir-me um bocado frustrado, porque quero muito ajudá-los, mas está mesmo difícil conseguir mudar essa mentalidade. E recebi uma proposta do maior rival. Antes de vir, prometi ao presidente que se fosse embora não era para o rival.

Ricardinho no Pendekar (Indonesia) @Pendekar United

Recebi agora uma oferta completamente maluca de Itália, um campeonato que eu empre quis conhecer, mas que ao mesmo tempo sempre me deu muito medo, pelos incumprimentos, e não queria estar a arriscar muito, apesar de querer jogar em quase todas as ligas importantes. Cada vez mais me protejo, apesar de perceber o lado dos clubes. Do Brasil, por exemplo, recebi uma proposta há três dias... Adorava jogar lá, mas já teria de ser um contrato especial.

Por exemplo, há umas semanas falou-se que eu ia para Itália. E nessa altura eu estava muito mais perto de um projeto da Arábia Saudita do que ir para Itália... Eu disse logo que não à proposta de Itália. Na Arábia Saudita estão agora a começar a promover o futsal e fizeram uma abordagem para, se não quisesse jogar, ser embaixador, fazer avaliação de talentos e achei engraçado. Acabou por não dar.

«Acho muito difícil voltar a jogar em Portugal»

ZZ: Olhando agora um bocadinho para a Liga Placard: como é ver um projeto como o do SC Braga a intrometer-se na luta com os grandes?

R: Brutal. O presidente [António] Salvador está a fazer uma aposta incrível. Pavilhão brutal, que quero ir conhecer em breve pelo ambiente, o trabalho está a ser de top. Acho que é muito importante mais equipas conseguirem ter estes projetos. Sei que é difícil ter esta capacidade económica e potencial por trás para meter as equipas a batalhar assim. O SC Braga é líder da Liga Placard!

@SC Braga

Acho que é um trabalho espectacular. Acho que estão a ter o reconhecimento perfeito e Deus queira que se consigam intrometer de verdade muito mais vezes e muito mais tempo nessas frentes, porque acho que o Benfica e Sporting necessitam disso para crescer ainda mais um bocadinho. Já são top, claro, aliás, estão sempre na final four da Champions, não é por acaso, mas com esse crescimento vai dar mais um plus maior para para a nossa modalidade em Portugal.

Sobre a proposta do SC Braga: sim, foi uma pena porque foi numa altura que eu queria mesmo, mesmo muito voltar a casa. Entendo que para mim era baixar muitos os números, mas para eles continuava a ser um esforço. Mas o que mais me doeu foi a dúvida que eles tinham: eu queria assinar antes de ir [para o Mundial], eles só queriam assinar depois de me ver. Isto tudo antes do Mundial 2021, na altura da minha lesão. E depois pesou o orgulho. Ainda tentaram mais tarde, mas já nem quis ouvir. Eu sabia que poderia ajudar, sabia o que poderia fazer, se calhar a jogar menos minutos. 

ZZ: Achas que era a tua última oportunidade de voltar?

R: Agora, sinceramente, depois disto, do último recorde que me faltava bater na Champions, acho muito difícil voltar. Mas o futsal português está muito bem servido.

ZZ: Como tens visto o crescimento do futsal português?

R: Na Liga acho que esta redução de equipas ajudou ainda mais a competitividade. E nota-se muito claramente quando uma equipa não está competitiva, não há margem para erro. Vais começar a juntar mais gente de qualidade. O crescimento do número de inscritos também aumentou e ajuda muito a aposta forte da Federação, que foi incrível.

Estamos a falar de números que nunca se imaginou que se pudesse chegar, o que é muito bom. Esta nova geração aos 17 anos já disputava Europeus. Antes, o Israel, o Ivan, o André Lima jogavam o primeiro Europeu aos 24 anos... Antes tínhamos quatro pessoas de staff e agora tens o mesmo número de jogadores e staff.

ZZ: Alguma vez entraste em campo e pensaste que um jogador em específico ia levar um cabrito teu [risos]?

R: Só se algum amigo me pedisse [risos]. Fiz algumas vezes, mas era numa altura em que era mais brinca na areia. Até que me partiram uma perna e começamos a pensar que se calhar não é boa ideia.

Mas eu acho que o temos de tentar criar no futsal é hábitos. Quanto mais treinas aquilo e mais fazes aquilo, começa-te a sair e não pensas. Começas a fazer naturalmente. Naquele golo contra a Sérvia, por exemplo: eu andava a treinar aquilo há 3 meses. E diziam-me para estar quieto porque ia levar 'pau'. E depois não tinha tido noção do que tinha feito.

Acho que há muitos jogadores melhor tecnicamente que eu. Só que eles não conseguem ou não têm a liberdade de primeiro fazer disso uma rotina e de fazer isso em qualquer momento do jogo, que era uma coisa que eu que eu que eu fazia muito, a ganhar ou perder. Era um reflexo, uma coisa que me que me saía.

Sobre o golo do Zicky, que é o jogador com maior potencial psicologicamente que já que eu já vi, tem aquilo tudo no sítio. Ele sabe o que tem de fazer em campo. E aquele golo dele não é pensado. A única coisa pensada é o calcanhar, quando vai para dentro. A bola antes é uma reação treinada.

Eu uma vez tive uma conversa com o Marquinhos porque levava muita porrada e o Falcão não. E ele disse-me que é preciso fazer isso quando se ganhava e se perdia. Isso conquista-se. Uma vez em Espanha, num jogo, levei tanta porrada... e sempre que caia dizia desculpa. Desistiu de me bater.

«Nunca olhei para a seleção para bater recordes»

ZZ: Há uns anos um treinador disse 'eu ando há 20 anos a dizer que somos melhores que eles'... E tu viveste isso tudo.

R: A grande mensagem aqui foi que não temos nada pior que eles. Ouvimos tanta vez aquilo. E eu também comecei a trazer essa exigência de Espanha porque via os jogadores e pensava como era possivel. E começava a comparar os espanhóis com os portugueses. E começas a bater de frente, não queres ser da equipa do quase no fim da tua carreira.

Já tínhamos uma geração, que até achamos ser melhor que a nossa, que foi assim por ter menos condições. Tínhamos de fazer igual ou melhor. Aquele Europeu de 2018 foi o click. Mas muito porque começámos a querer jogar contra os melhores. Tu vais começar a criar rotinas. Antes já sofríamos antes de ter a dor. Temos de jogar primeiro. Esse desbloqueio foi essencial, tentámos equilibrar a balança.

@UEFA

Foram 20 anos de seleção e quando finalmente consegues a estrela não jogas com ela... Dá muito orgulho. No Euro 2022, quando fui ver, percebi que foi o melhor passo que podia ter dado. O passo ao lado. Eles estão bem entregues.

ZZ: Porque nunca quis bater o recorde de internacionalizações do Arnaldo Pereira?

R: Nunca olhei para a seleção para bater recordes. Acho que a geração passada não foi tratada da forma que achava que devia ter sido. Foi a melhor geração e a próxima vai ser das melhores seleções de sempre.

Senti que a geração anterior não teve o melhor tratamento, uma questão de respeito. O futsal foi injusto com eles. E este era o maior reconhecimento por tudo o que o Arnaldo fez por mim. Eu fui o número 10 na seleção por causa do Arnaldo. Sempre lhe disse que, no que dependesse de mim, não ia bater esse recorde. E cumpri.

«Alípio disse que ia perder a oportunidade de ser o melhor desta m**** toda»

ZZ: Ele e o André Lima foram os seus pilares no Benfica.

R: Foi meu pai, foi meu irmão, foi meu amigo, foi meu conselheiro... Eles moldaram-me como homem. O André Lima, o Arnaldo, o Zé Maria, o Pedro Costa. Era um miúdo do bairro, do norte. Aprendi muito com eles, eles é que fizeram de mim um homem. Mas sinto que não lhes consegui pagar tudo o que eles me deram. O Zé Maria, por exemplo, esteve a treinar comigo na minha recuperação antes do Mundial. Faltou ao trabalho para estar comigo. 

@Benfica

Tinha 17 anos quando cheguei. Vinha com muitos minutos do Miramar. Nos primeiros sete jogos não joguei... e pedi para ir embora ao mister Alípio [Matos]. Meteu-me a jogar e eu fiz três golos. Mas perdemos... e no jogo a seguir fiquei de fora. E foi aí que ele me disse: 'miúdo, podes ir embora. Mas vais perder a oportunidade de ser o melhor desta m**** toda'. Pensei bem e acabei por ficar.

ZZ: Benfica, Japão, Rússia... Inter Movistar. Como foi ser português em Espanha?

R: Nessa altura fui o melhor do mundo em 2010, tinha tocado o céu. E fui para o Japão ganhar dinheiro, ponto. Ganhava aqui um e fui ganhar sete lá. No Japão sou melhor marcador, melhor jogador, ganhámos tudo... e não fico nem no top-10 de melhor do mundo. Ninguém me via. Então fui para Espanha, a ganhar muito menos. E percebi como os espanhóis nos olhavam.

Quando cheguei, o treinador disse logo que não era uma contratação dele. No primeiro jogo disse-me que ia ficar no banco na primeira parte para ver. Na segunda parte entrei e marquei o golo da vitória. A partir daí joguei sempre. Foram duas Champions, quatro final four. Sugeri a contratação do Cardinal em dezembro, um bicho competitivo. Então se mexem com ele por dentro... 

ZZ: Foi em Espanha que o nome Ricardinho se consolida: como acha que se lida com a pressão do rótulo de 'novo Ricardinho'?

@FPF

R: Vou dar um exemplo: quando falei do Tiaguinho não me precipitei por falta de talento, mas por falta de controlo emocional. E fui aprendendo a não apontar ninguém por mais talento que vejas. Porque isso traz demasiada carga aos atletas. Daí eu dizer que o Zicky tem uma força brutal, emocional e psicológica incrível.

O que acontecia antigamente? Havia um talento no Norte, mandavas para Lisboa. Ficava numa casa a ser cuidado por não sei quem e depois ia ter algumas vezes com aquele e a alimentação é a comer ali não sei onde... E isso não ajuda em nada. Porque tu não estás a acompanhar o atleta, afinal de contas. Acompanhamento tive eu, com dois atletas que cuidavam de mim, que me davam conselhos, que me davam boleias para o norte.

Hoje em dia já é um acompanhamento melhor. Eu costumo dizer que nós não precisamos de sermos profissionais para ser profissionais. Muitas vezes eu ouço jogadores a dizer que só treinam à tarde. Que vão treinar de manhã. Não queres? Tens de querer. A minha equipa não tem nutricionista: cuida-te, hoje em dia vais ao YouTube e sabes tudo.

qFui aprendendo a não apontar ninguém por mais talento que vejas

Acho que se mete demasiada pressão nos atletas quando estão a começar a ascender, acho que os os clubes deviam fazer o que tem feito, o que fez muitas vezes o Sporting e bem, e acho que o Benfica também deveria fazer, que é se estás é para jogar. Se não estás para contar com o atleta, emprestam, deixam jogar. Os miúdos, precisam de jogar e crescer, cometer erros.

Acho que não devemos meter esses rótulos para o bem deles. Não quer dizer que nenhum deles possa ser melhor que eu, que espero que sejam muitos. Mas eu acho que é meter um rótulo muito pesado. Quando me diziam 'novo Falcão' eu dizia sempre que ele fez a história dele, eu fiz a minha e ele foi a minha referência.

ZZ: Qual foi o adversário mais difícil que tiveste de enfrentar?

R: Schumacher. Uma vez que jogamos contra eles e naquela típica bola em que tu adiantas, ele vai controlar e quando vais ele mete o corpo... Eu bati nele parecia um comboio, senti o meu corpo todo a estremecer. E ele na mesma. E uma das vezes que consegui fintar ele mandou-me para a bancada [risos].

«Numa hora fiquei sem bateria com tantas chamadas e mensagens»

ZZ: Não podia deixar de perguntar sobre aquela quase pré-época com a equipa de futebol do Benfica: o que aconteceu realmente?

R: Tive um passo e não aconteceu por causa da capa do Record. Isto surgiu depois de eu bater recorde de golos na Liga, 53 se não me engano. Estava num patamar muito acima e até quis sair e tal.

@DR

E tive uma abordagem, mas nunca pensei que fosse para o Benfica. Só que havia muitos pontos: o Benfica não ganhou e vais contratar um jogador de futsal para tentar ganhar o título? Isto na altura do mister Fernando Santos.

Eu já não dormia. A Nike mandou-me logo as chuteiras, caneleiras, tudo. Foi nessa altura em que me senti pela primeira vez uma super estrela. A ideia era começar a treinar antes do início da pré-época, que estava agendada para 20 mas ia começar a 14. Para não haver imprensa porque ia ser uma bomba e tal. E ninguém podia saber disto.

@DR

E eu estava na seleção, mas a cabeça já estava noutro lugar. Às duas da manhã recebo uma mensagem com uma foto a dizer: esta vai ser a capa do Record amanhã. Não tinha falado com ninguém. E eu lembro-me que numa hora, com tantas chamadas e mensagens, fiquei sem bateria. A comunicação social veio em peso, uma grande confusão.

E começaram-me a ligar emissários. Oferecer contrato para ir para a Académica, assinava com o FC Porto, contrato de cinco anos, emprestado... A volta que isto já estava a dar. Voltei para o hotel, chamadas atrás de chamadas, já estava sozinho no quarto e à noite recebo uma outra mensagem com uma foto a dizer 'Desculpa lá, Ricardinho' na capa do Record.

ZZ: Já falou várias vezes do fim da carreira: se acabasse amanhã, faltava ganhar alguma coisa?

R: Faltava ter jogado os Jogos Olímpicos, era só isso. Queres sempre ganhar mais Champions, mais Europeus, queres sempre ganhar mais coisas, mas ter jogado Jogos Olímpicos... E tentar ver mais conquistas, agora vou tentar ver como embaixador da modalidade. Já tive convites da FPF e da UEFA, mas já disse que não é só para cortar fitas, é para trabalhar, para ajudar a modalidade realmente.

Elevar a modalidade em todo o lado, fazer crescer, criar mais condições para que em outros países haja melhores condições para que os atletas não tenham que assinar contratos que depois não são cumpridos, por essas coisas todas comuns. Para inaugurar pavilhões não precisam de me levar para a estrutura. Contem comigo para trabalhar.

«Falcão é o melhor jogador de todos os tempos»

ZZ: Como é a sua relação com o Falcão?

R: Considero-me amigo do Falcão. Num torneio combinámos ver quem fazia primeiro um golo de costas. Ele jogou primeiro... e fez logo o golo. Temos falado muito recentemente até porque o filho está cá e temos combinado fazer umas coisas juntos para levar Ricardinho & Falcão pelo mundo.

@Getty /

O Falcão foi a melhor promoção que o futsal podia ter. Ele aliava tudo: craque, brincalhão, chamar o público, encher o pavilhão... Mas o Falcão ainda podia dar mais ao futsal, não consegue pela vida que tem. Mas ele sim era a pessoa ideal para impulsionar o futsal para desporto olímpico. Vou tentar.

ZZ: Teve alguma proposta para jogar no Brasil recentemente?

R: Há 3 dias. Já recebi do Corinthians, do Joinville... Eu gostava muito de jogar no Corinthians, já o disse. Mas jogar no Brasil, com Estaduais, 20 horas de viagem... 

ZZ: Para terminar: entre Ricardinho e Falcão, quem é o melhor?

R: Para mim, o Falcão é o melhor jogador de todos os tempos. Por todas as conquistas, por tudo o que deu no campo, etc. Eu acho que nós somos jogadores totalmente diferentes. As pessoas compraram-nos muito, mas eu acho que nós somos jogadores totalmente diferentes e eu acho que sou um jogador, na minha opinião, mais completo que o Falcão.

@Getty /

Mas quem produziu mais naquilo que foi o futsal para mim foi o Falcão. Eu não tenho, nunca tive nenhum problema de dizer que ele é o meu ídolo, que eu tenho como referência e nunca quis ser igual a ele. Isso é um ponto assente, nunca quis ser igual a ele, mas quis muito chegar onde ele estava.

Obviamente, cada um faz sua história. Obviamente que eu ganhei coisas que ele não ganhou. Ele ganhou coisas que eu não ganhei. Toda a gente tem aquela dúvida porque ele não saiu do Brasil. Mas eu nunca quis sair de Portugal, se me tivessem dado todas as condições eu também não tinha saído.

Ele tem coisas que eu não gosto. Eu tenho coisas que ele não gosta, de certeza. Mas acima de tudo temos respeito um pelo outro. A maioria dos brasileiros vão dizer que ele é o melhor, a maioria dos portugueses vão dizer que eu sou melhor. É bom haver esse debate.


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Portugal

Ricardinho

NomeRicardo Filipe Silva Duarte Braga

Nascimento/Idade1985-09-03(38 anos)

Nacionalidade

Portugal

Portugal

PosiçãoAla

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