Sánchez põe em marcha ataque à imprensa

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Numa cruzada contra a desinformação e as mentiras, o Governo de Pedro Sánchez aprovou um pacote legislativo que irá, inevitavelmente, condicionar a ação da imprensa. Declarações do ex-diretor adjunto do El País fazem cair a máscara do presidente do Governo espanhol.

Tem sido uma semana bastante turbulenta em Madrid. O Governo de Pedro Sánchez – sustentado por uma aliança contranatura com os independentistas catalães após ter perdido nas urnas no verão passado – continua a seguir uma linha que faz soar os alarmes no que à democracia diz respeito.

As nomeações para cargos dos quais se exige independência e imparcialidade, o ‘Plano de Ação pela Democracia’ que interfere com os meios de comunicação, as contínuas contradições do presidente do Governo e o mais recente escândalo que evidencia a cumplicidade com o regime de Nicolás Maduro são os assuntos que marcam a atualidade política espanhola. Para além disto, o Governo do PSOE e do Sumar continua sem apresentar um Orçamento do Estado e o futuro dos espanhóis em matéria fiscal continua adiado.

O ataque à imprensa

Quando Begoña Gómez, esposa de Pedro Sánchez, esteve no centro das atenções por alegados casos de corrupção e conflito de interesses, em abril, o líder do Executivo espanhol anunciou que se iria retirar por cinco dias de modo  a refletir na sua continuidade na Moncloa. Como já se esperava, o número político de Sánchez fez com que voltasse, em julho, com um plano agressivo contra os meios de comunicação.

«Se permitirmos que os embustes conduzam o debate político (…) a consequência será que teremos causado danos irreparáveis à nossa democracia», disse, acrescentando que «há demasiado tempo que permitimos que o ‘fango’ colonize impunemente a vida política e a vida pública». Esta segunda-feira, a ideia que resultou da profunda reflexão do presidente do Governo foi aprovada em Conselho de Ministros, revestida de uma pátina de salvação democrática.

«O Governo apresenta o Plano de Ação pela Democracia», como pode ler-se no website do Ministério da Presidência, da Justiça e das Relações com as Cortes «para reforçar a transparência, o pluralismo e o direito à informação». O projeto integra trinta e uma medidas e é apresentado com o objetivo de «reforçar o Estado de Direito, melhorar a transparência e a prestação de contas das instituições e lutar contra a desinformação».

Um plano ambicioso, mas um tanto quanto curioso, tendo em conta todas as atitudes de Sánchez enquanto líder do Governo espanhol.

O plano foca a modificação de três leis: a do direito à honra, a da proteção de integridade e a da publicidade institucional. É, contudo, importante realçar que as reformas legislativas podem não chegar a ser aplicadas, uma vez que o Governo pode não conseguir o respaldo necessário nas Cortes Gerais (Senado e Congresso dos Deputados).

Ainda que assente numa maioria para continuar a chefiar o Governo, Sánchez não tem a homogeneidade parlamentar que certamente gostaria, como ficou visível numa votação recente em que o Junts per Catalunya – que mantém o Governo Frankenstein 2.0 – mudou o sentido de voto, passando da abstenção ao ‘não’, fazendo cair a proposta de lei do executivo. Mais uma prova que Sánchez está à mercê dos caprichos do líder do Junts e foragido da Justiça espanhola, Carles Puigdemont.

Voltando à proposta que promete salvar a democracia, o Governo garante que quer «dar mais ferramentas e poder à sociedade espanhola para avaliar a a ação dos poderes públicos». Parece uma proposta generosa por parte do próprio poder público, mas assemelha-se mais a uma coação dos meios de comunicação que ousem não seguir a linha editorial da Moncloa, mascarada como uma cruzada democrática contra a desinformação.

Sánchez pretende também reforçar a lei de «segredo profissional dos jornalistas» e proteger os mesmos «contra pedidos feitos com o único objetivo de os intimidar no exercício das suas funções». É, por isto, importante recordar a publicação do ex-diretor adjunto do El País, David Alandete, que confessou ser vítima de pressões por parte do próprio Presidente: «Pressões a jornalistas, com quando o atual presidente me telefonou aos gritos para que mudasse um título? Ou quando a sua chefe de imprensa conhecia de antemão os títulos que íamos publicar no El País e telefonava para os modificar? Ou com quando um dos seus ministros nos adiantava despedimentos antes de que ocorressem? Pressão com as do famoso PSOELab, que se dedicava a insultar jornalistas críticos mediante perfis que confirmámos que estavam financiados pelo partido? Campanhas como a do presidente que recorria a um grande acionista da Prisa para pedir uma mudança da linha editorial?». Afirmações que deixam  evidente que o objetivo de Sánchez é controlar ou silenciar quem o critica a ele e ao seu núcleo.

Em nome da transparência, exige-se que a informação sobre os proprietários dos jornais e sobre o investimento publicitário que recebem seja pública, é prevista a reforma da lei de publicidade institucional para introduzir critérios de transparência, proporcionalidade e não discriminação, da lei orgânica do direito à honra, integridade pessoal e familiar e à própria imagem e da lei reguladora do direito de retificação, com o objetivo, quase que orwelliano, de «melhorar o sistema de retificação de notícias falsas ou absolutamente tendenciosas».

Trata-se de um pacote legislativo com arrepiantes semelhanças à Lei da Imprensa que vigorou de 1938 a 1966, no período de Francisco Franco.

Na capa do jornal espanhol ABC de quinta-feira é anunciado que «seis ministros reunirão a cada três meses para vigiar a imprensa». Como disse o magistrado e deputado liberal Manuel Fernandes Tomás, numa sessão das Cortes Constituintes no início do século XIX, «censura prévia é o juízo de uma junta composta quando muito de seis homens; e nisto diz-se que uma nação não deve saber senão o que sabem seis homens ou que eles querem que se saiba». E se é verdade que a liberdade total de imprensa pode trazer consigo males, Tomás acreditava que os males que resultam da censura prévia «são mais e maiores».

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