Sanções tiveram como "único efeito" empurrar Irão para leste

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O Irão é hoje um "importante ator" regional, que faz "alianças" com a Rússia e a China e "negócios" com a Índia, assinala a especialista iraniana, em declarações à agência Lusa, depois de uma intervenção no III Congresso Internacional do Centro Interdisciplinar de Estudos de Género, que terminou sexta-feira no Instituto Superior de Ciências Sociais e Politicas da Universidade de Lisboa.

Ao mesmo tempo, "o Estado sancionado, no caso a República Islâmica, transfere o impacto [das sanções] para as famílias e isso geralmente não é debatido quando se debate política internacional".

Feminista assumida, Nazanin Shahrokni trouxe ao III Congresso Internacional do Centro Interdisciplinar de Estudos de Género uma comunicação que resulta da investigação que tem desenvolvido sobre o impacto das sanções nas famílias iranianas.

Com o objetivo de "desmistificar a ideia de que as sanções funcionam em certos países", a professora de estudos internacionais na Universidade Simon Fraser (Canadá), doutorada em Sociologia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), defende outra via.

"Guerras e sanções não são a solução, medidas diplomáticas e negociações são as únicas soluções para as convulsões na região", diz.

Sendo certo que as sanções impedem o regime iraniano de fazer negócios e exportações, também o pressionam de tal forma que acabam por ter o efeito contraproducente de "contribuir para consolidar o autoritarismo doméstico".

Aliás, a história do país revela que foi nos momentos de maior isolamento internacional que existiu "maior repressão interna".

Acossada, a teocracia iraniana "recuou" e deixou, por exemplo, de subsidiar "muitos serviços públicos", passando essa responsabilidade para as famílias, exemplifica a professora.

"O Irão está sob sanções há 30 anos e isso ajudou a aliviar o punho sobre a população? Não", constata.

Ao mesmo tempo, prossegue Nazanin Shahrokni, "porque o Estado se sente ameaçado pelas sanções internacionais, na verdade reforça o seu punho sobre a sociedade, nas áreas em que o pode fazer".

É isso que explica a "viragem conservadora na política iraniana", observa.

"A igualdade de género tem sido questionada mais do que nunca e o Estado mudou de um fantástico programa de planeamento familiar para políticas pré-natal, em que o Estado subsidia casamentos e oferece empréstimos para as pessoas se casarem", concretiza.

Nazanin Shahrokni assinala ainda que "muitas das conquistas das mulheres nas últimas décadas estão a regredir".

Neste contexto, o Nobel da Paz atribuído em 2023 à iraniana Narges Mohammadi "pela luta contra a opressão das mulheres no Irão e pela promoção dos direitos humanos e da liberdade", foi "simbólico", reconhece.

As mulheres iranianas "sentiram que foram vistas e reconhecidas" pela comunidade internacional, admite, acrescentando, porém, que tal "foi só isso, simbólico".

"Isso resultou na libertação de Narges Mohammadi? Não", lamenta, referindo-se à ativista, presa desde 2021 e um dos principais rostos da revolta "Mulheres, Vida, Liberdade", desencadeada em 2022, após a morte da jovem curda Mahsa Amini, detida por desrespeitar o código de vestuário islâmico. Em sequência, as mulheres iranianas manifestaram-se nas ruas, tirando o véu e cortando o cabelo.

Nazanin Shahrokni admite que não espera mudanças fundamentais no regime iraniano no futuro próximo, mas destaca que as mulheres iranianas continuam a praticar "resistência numa base diária", registando em fotos que continuam a recusar o véu.

"As lutas [das mulheres] desceram ao nível do quotidiano (...), sendo disruptivas numa base diária", finaliza a académica e autora do livro "Women in place: the politics of gender segregation in Iran".

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