Tribunal contraria Segurança Social e diz que empresas não têm de pagar TSU no layoff. Há mais processos em curso

2 horas atrás 19

O Tribunal Central Administrativo Norte entende, num acórdão de maio, que as entidades empregadoras que beneficiem do regime de layoff “clássico” estão isentas de pagar contribuições sociais sobre as compensações retributivas pagas aos trabalhadores. A decisão — que se aplica a uma empresa que contestou esse pagamento — vem contrariar aquele que tem sido o entendimento da Segurança Social. E, segundo especialistas consultados pelo Observador, pode dar força a outros processos em curso.

Esta será a primeira decisão de um tribunal superior a desafiar a prática seguida desde sempre pela Segurança Social: quando uma empresa entra no layoff “clássico”, previsto no Código do Trabalho, os montantes pagos ao trabalhador são alvo de contribuições por parte do empregador e do funcionário de, respetivamente, 23,75% e 11%. Quando está em layoff, o trabalhador recebe dois terços do salário normal, sendo 70% desse valor pago pela Segurança Social e o restante pelo empregador. O regime serve para situações em que a empresa enfrenta dificuldades por motivos de mercado, estruturais, tecnológicos ou catástrofes.

O caso sobre o qual se debruçou o Tribunal diz respeito a uma empresa que, durante a pandemia, entre abril e dezembro de 2020, colocou a “generalidade” dos trabalhadores em layoff clássico, o que há vários anos existe no código laboral. Na pandemia, vigorou um regime excecional do layoff, o simplificado, em que os empregadores estavam isentos de pagar TSU (taxa social única) sobre as retribuições, mas não foi desse layoff que beneficiou a empresa. A modalidade escolhida para os abrangidos foi a suspensão do contrato, em que não há prestação de trabalho.

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Durante esse período, não procedeu aos descontos de 23,75% a cargo do empregador sobre a compensação atribuída aos trabalhadores, o que gerou uma dívida superior a 10 mil euros. Por outro lado, procedeu aos descontos da parte do trabalhador (de 11%).

A empresa, que atua no setor do transporte aéreo comercial e de lazer, contestou a dívida e um primeiro tribunal (Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela) deu-lhe razão. A Segurança Social recorreu e uma decisão de um tribunal de segunda instância (Tribunal Central Administrativo Norte) conhecida em maio veio dar respaldo ao tribunal de Mirandela. Há, pelo menos, mais outra decisão do mesmo tribunal de primeira instância a ir no mesmo sentido.

Ao Observador, o Instituto da Segurança Social (ISS) confirma que o acórdão transitou em julgado, pelo que não é suscetível de recurso, decisão que o ISS “naturalmente respeita, o que determina o seu cumprimento”.

O ISS “confirma que estão em curso outros processos judiciais“, mas diz que o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte não representa “jurisprudência uniformizada” e que a decisão “é limitada ao caso em concreto, e, por isso, a solução ali perfilhada é de aplicabilidade circunscrita ao eventual caso julgado”. Por isso, o ISS diz que mantém “o entendimento segundo o qual os seus procedimentos estão legalmente sustentados, razão pela qual continuará a pugnar pelo pagamento das contribuições que são devidas pelas entidades empregadoras”.

Esta decisão “veio dar resposta a dúvidas levantadas sobre a obrigatoriedade de tais contribuições durante a suspensão dos contratos ou períodos de redução do período normal de trabalho, contrariando o entendimento da Segurança Social de que as mesmas eram devidas”, indica a firma de advogados SRS Legal, numa publicação recente em que se debruça sobre o acórdão.

No cerne da questão estão duas expressões aparentemente semelhantes mas que são usadas em contexto distinto na lei: retribuição e compensação retributiva. A lei define que o empregador tem o dever de “pagar pontualmente as contribuições para a segurança social sobre a retribuição auferida pelos trabalhadores“.

A Segurança Social entende que a compensação retributiva que os trabalhadores receberam “é retribuição”, o que à luz da lei “implica o pagamento de contribuições para a segurança social”. “A obrigatoriedade de pagar a totalidade das contribuições à segurança social nunca foi, até hoje, questionada durante toda a vigência do regime de suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao empregador, vulgo layoff”, argumenta.

A empresa, por sua vez, alegou que os valores pagos aos trabalhadores foram “exclusivamente compensações retributivas” (que substitui o salário durante o layoff) e não retribuição pelo que “nenhuma obrigação legal existe ou existia” de pagar as contribuições. Alega que a “retribuição” a que a lei alude corresponde ao pagamento pelo “trabalho prestado”, do qual o empregador retira vantagem; enquanto a compensação retributiva “tem antes uma natureza assistencialista“.

Vários advogados explicam ao Observador que a dúvida nunca foi verdadeiramente esclarecida nas várias alterações que foram sendo feitas ao Código do Trabalho. Já para o caso do trabalhador a lei é clara: aí o legislador determinou de forma considerada inequívoca que este tem de “pagar contribuições para a segurança social com base na retribuição auferida e na compensação retributiva“. Ou seja faz uma distinção que não é feita para o caso do empregador.

00 ao fim de semana. JOSÉ COELHO/LUSA

Na pandemia, vigorou um regime excecional do layoff, o simplificado, em que os empregadores estavam isentos de pagar TSU sobre as retribuições

JOSÉ COELHO/LUSA

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