O primeiro-ministro de Espanha anunciou recentemente, a intenção do seu governo de aumentar a capacidade do aeroporto de Madrid em 28%, para cerca de 90 milhões de passageiros/ano, até 2031, num investimento total que rondará os 2 400 milhões de euros e que já é considerado o maior investimento em infraestruturas da última década.
O objetivo assumido é transformar o aeroporto de Madrid — que gera de forma direta ou indireta, quase 10% do PIB da região de Madrid — num dos maiores aeroportos da União Europeia e do mundo e reforçar, simultaneamente, o hub com a América Latina e desenvolver o hub com a Ásia, potenciando a criação de milhares de novos empregos.
É inevitável a comparação com o que se passa com o projeto de construção do novo aeroporto em Portugal, com a diferença de que por cá, não obstante todos os estudos que já foram feitos e todos aqueles que continuam a ser anunciados, não se sabe, ainda, onde nem quando vai ser construído. A decisão foi transferida para o novo governo o que até se compreende, tendo em conta o histórico de procrastinação. Com um pouco de sorte, o novo aeroporto de Lisboa ainda se poderá candidatar a constituir um hub para as Berlengas.
A comparação poderia ser estendida ao sector ferroviário, onde, apesar de todos os projetos anunciados, continuamos a alargar o fosso que nos separa dos nossos vizinhos e da restante Europa. Mas não é o momento de o fazer.
Partimos desta comparação com os nossos vizinhos espanhóis para chamar a atenção para a necessidade de ultrapassar a visão de curto prazo que tem dominado a decisão do País nas duas ou três últimas décadas e de reintroduzir a visão estratégica, seguindo aliás as tendências que estão a ocorrer no plano europeu no quadro das propostas de reindustrialização, de transição digital e da sustentabilidade energética e ambiental.
E, associada a esta visão estratégica, igualmente para a necessidade de se estabelecer um Pacto Social para o Crescimento que mobilize os agentes económicos e sociais, os responsáveis políticos e partidários e as instituições da sociedade civil, de que quero destacar as Ordens Profissionais e, em particular, a Ordem dos Economistas. Um Pacto que contribua para inverter a tendência de mais longo prazo que se vem afirmando na economia portuguesa para a estagnação e para a especialização de baixo valor acrescentado, responsável, em particular, pela saída de jovens quadros qualificados a que se tem assistido nos últimos anos.
E, por último, chamar a atenção para a necessidade de, nesta reintrodução da visão estratégica, repor o processo de constituição de classes médias – designadamente através da dinâmica de valorização salarial –, que se desenvolveu no período pós-segunda guerra mundial e que foi a base do mais longo período de crescimento económico na Europa e da afirmação da democracia, e que entrou em regressão na última década do século passado.
O título deste texto é uma homenagem ao nosso grande poeta, Luís de Camões, cujos quinhentos anos do nascimento se comemoram este ano. Cada um é livre de fazer a interpretação que entender.
A coluna “Pensar a Economia” tem periodicidade quinzenal e resulta de uma parceria editorial entre o JE e a Ordem dos Economistas.