Valorização do iene aumenta apetite para carry trade do franco suíço mas há risco de “perdas avultadas”

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O economista sénior do Banco Carregosa, Paulo Monteiro Rosa, alerta que uma maior mobilização de carry trades em francos suíços “poderá redundar em perdas avultadas” em caso de agudização de conflitos geopolíticos, desaceleração económica ou aumento da incerteza nos mercados financeiros. O trader do Banco Best, Ângelo Custódio, refere, ao JE, que a determinação do Banco Nacional da Suíça em “reduzir ainda mais” as taxas, à medida que a inflação alivia, a oportunidade de “reduzir ainda mais os custos de financiamento” tornam a moeda nacional suíça “mais apetecível” na prática de carry trade.

O franco suíço tem sido uma alternativa dos investidores para levar avante o carry trade depois da subida da taxa de juros, decretada pelo Banco Central do Japão, a 31 de julho, de 0,10% para 0,25%, de acordo com a Reuters. Os especialistas contactados pelo Jornal Económico confirmam esta nova apetência, mas deixam avisos. O carry trade é um mecanismo que permite ao investidor tentar obter lucro através da diferença nas taxas de juro entre duas moedas.

O trader do Banco Best, Ângelo Custódio, diz ao Jornal Económico que há muito que o franco suíço é utilizado na estratégia de carry trade.

“Gozando de taxas de juro historicamente baixas associada a uma baixa volatilidade, o seu apelo aumentou, obviamente, após a disrupção do iene, que se valorizou fortemente na sequência dos fracos dados económicos verificados nos Estados Unidos, e de um surpreendente aumento das taxas de juro do Banco Central do Japão, que desencadeou uma turbulência nos mercados financeiros”, explica Ângelo Custódio.

O analista da XTB, Henrique Tomé, salienta, ao Jornal Económico, que depois da subida dos juros pelo Banco Central japonês “houve quem ponderasse proceder” a práticas de carry trade na Suíça, tendo em conta as taxas de juro mais baixas em comparação com a Europa e os Estados Unidos da América.

“Ainda assim, a taxa de juro da Suíça é mais alta que a taxa de juro do Japão, mesmo depois de esta ter subido. Adicionalmente, não podemos afirmar que, depois do Japão, a Suíça tem sido o alvo preferencial”, diz Henrique Tomé.

Posições vendedoras atingem 3,8 mil milhões

O trader do Banco Best, Ângelo Custódio, sublinha que é possível verificar posições vendedoras significativas na divisa [franco suíço], cerca de 3,8 mil milhões, um sinal, no entender de Ângelo Custódio, que “poderá estar a ser utilizada para financiar movimentos de carry trade”.

O economista sénior do Banco Carregosa, Paulo Monteiro Rosa, refere que os investidores mantiveram uma posição vendida de 3,8 mil milhões de dólares contra o franco suíço, “mesmo tendo mudado abruptamente” para uma posição comprada de dois mil milhões de dólares no iene, baseando-se em dados da Comissão de Negociação de Futuros de Commodities dos Estados Unidos.

Ângelo Custódio acrescenta que a determinação do Banco Nacional da Suíça em “reduzir ainda mais” as taxas, à medida que a inflação alivia, a oportunidade de “reduzir ainda mais os custos de financiamento” tornam a moeda nacional suíça “mais apetecível” na prática de carry trade.

Paulo Monteiro Rosa diz que o Banco Nacional da Suíça “deverá continuar a cortar as taxas de juro ainda mais” nos próximos meses, à medida que a inflação diminui.

“Isso reduziria os custos de empréstimos em francos e poderia penalizar a moeda helvética no curto prazo, tornando-a mais barata. Também o Banco Nacional da Suíça parece relutante em ver a sua moeda fortalecer ainda mais, em parte por causa dos problemas que isso pode causar aos exportadores”, acrescenta o economista do Banco Carregosa.

Para Ângelo Custódio, à medida que os investidores recorrem ao franco suíço como alternativa ao iene para financiar o carry trade, “aumenta substancialmente” o risco do franco suíço registar uma volatilidade historicamente inexistente. “Tal, certamente, levará o Banco Central da Suíça a atuar, através de intervenções económicas ou atuando nas taxas de juro, para conter especialmente rally’s de subida que poderiam ter um impacto substancial com os principais parceiros comerciais, sobretudo nas exportações, isto após as principais economias mundiais terem alterado significativamente a sua política económica, como é o caso da Europa e dos Estados Unidos”, considera o trader do Banco Best, Ângelo Custódio.

Estabilidade do franco suíço desincentiva carry trade

O economista sénior do Banco Carregosa, Paulo Monteiro Rosa, alerta que podem existir perigos para os investidores que alinhem numa estratégia de carry trade do franco suíço. Um dos motivos prende-se com a relativa estabilidade da moeda em termos de apreciação face às restantes.

Paulo Monteiro Rosa sublinha que, atualmente, a taxa de juro de referência do franco suíço fixa-se em 1,25%, já tendo sofrido uma baixa de 50 pontos base em 2024, o que no entender do economista é uma taxa “relativamente baixa”.

Para Paulo Monteiro Rosa a estratégia de carry trade para ser bem-sucedida “necessita não só de taxas de juro baixas da moeda do empréstimo obtido”, mas “essencialmente da evolução favorável do câmbio” dessa moeda. O economista sénior do Banco Carregosa acrescenta que, no curto prazo, taxas de juro baixas de uma moeda “retiram-lhe atratividade, favorecendo assim uma potencial depreciação” dessa moeda. “Alinham-se as duas variáveis mais importantes de um carry trade bem-sucedido: financiamento a taxas de juro baixas e desvalorização da moeda em que se realiza o empréstimo. Foi isso que aconteceu nos últimos anos aos carry trades realizados em ienes japoneses”, reforça o economista.

Paulo Monteiro Rosa sublinha que os juros baixos [do franco suíço] compensam os custos com os empréstimos, mas a valorização da moeda helvética “é suficiente” para invalidar por vezes o carry trade, podendo ser uma estratégia mal-sucedida.

“As atuais tensões geopolíticas crescentes aumentam o apetite pelo franco suíço, uma moeda de refúgio em períodos de incerteza, comprometendo seriamente o sucesso do carry trade devido a uma eventual valorização do franco suíço perante uma maior procura devido à sua característica de porto seguro. No início de agosto, enquanto os mercados financeiros, sobretudo índices acionistas, desvalorizavam acentuadamente e passavam por uma elevada volatilidade, o franco suíço valorizou 3,5% em apenas dois dias. Em janeiro de 2015, o abandono do Banco Nacional da Suíça de 1,20 francos suíços por cada euro, e posterior forte valorização do franco suíço destruiu fortunas”, avisa o economista sénior do Banco Carregosa.

A título de exemplo, Paulo Monteiro Rosa refere que se um investidor obter um empréstimo em francos suíços a 1,25% e investir em obrigações do tesouro americano na maturidade a 10 anos a 3,8%, ou nos mercados emergentes a 10%, “obtém um lucro pelo diferencial” das taxas de juro, mas “corre um risco elevado devido à eventual valorização” do franco suíço. O economista do Banco Carregosa acrescenta que [o investidor] ganharia 2,55% (3,80%-1,25%), mas salienta que “uma eventual valorização da moeda helvética superior a esses 2,55%, redundaria num prejuízo nesse carry trade, não contando com comissões no processo de compra e venda, e no empréstimo obtido”.

Paulo Monteiro Rosa considera que existe outro factor que dificulta o sucesso de um carry trade em francos suíços para investir na Zona Euro ou nos Estados Unidos, que passa pela “adoção de uma política monetária expansionista e início de um novo ciclo de baixa das taxas de juro” na Europa e nos Estados Unidos.

“As descidas das taxas de juro na Zona Euro e Estados Unidos tendem a depreciar o euro e o dólar, respetivamente. Assim, a margem de ganho pelo diferencial das taxas de juro diminuiu, além de uma tendência desfavorável do câmbio euro e dólar face ao franco suíço”, explica o economista do Banco Carregosa.

Questionado sobre se existem algum tipo de vantagem no carry trade, tendo em conta que quer o Banco Central Europeu como a Reserva Federal dos Estados Unidos (Fed) procederam a baixas nas taxas de juro, de 25 e 50 pontos base, o analista da XTB, Henrique Tomé, diz que esta prática é sempre uma “forma indireta” de alavancagem, “portanto existem vantagens, caso o posicionamento corra bem, pois conseguimos multiplicar os nossos ganhos”.

Mas, alerta Henrique Tomé, numa situação onde os mercados sigam uma direção oposta, “o nível de risco aumenta e pode acontecer o que se sucedeu no Japão”.

Questionado sobre qual poderia ser o impacto nos mercados se existisse uma maior mobilização para o carry trade através do franco suíço, Paulo Monteiro Rosa lembra que a desmobilização do carry trade no iene teve um impacto significativo nos mercados, provocando um sell off nas ações, que aconteceu em inícios de agosto. Com a subida da taxa de juro pelo Banco Central do Japão, em 15 pontos base de 0,10% para 0,25%, a 31 de julho, o mercado acabou por se assustar, levando a que o índice bolsista japonês Nikkei 225 caísse mais de 12%, a 5 de agosto, a maior descida diária desde 1987. O índice norte-americano quebrou 3% e o sector tecnológico sofreu descidas de 3,8%.

O economista sénior do Banco Carregosa lembra também o colapso que existiu no sector financeiro da Islândia em 2007 e 2008.

“Na altura, os investidores tinham pedido empréstimos em ienes e francos suíços para tirar vantagem das altas taxas de juro islandesas, acabando os carry trades por colapsar diante das fortes valorizações do iene e do franco suíço relativamente à coroa islandesa, impossibilitando o saldar das suas dívidas nas moedas nipónica e helvética, levando à falência muitos islandeses e o próprio país”, recorda o economista do Banco Carregosa.

Paulo Monteiro Rosa alerta que uma maior mobilização de carry trades em francos suíços “poderá redundar em perdas avultadas” em caso de agudização de conflitos geopolíticos, desaceleração económica ou aumento da incerteza nos mercados financeiros.

“Diante de cenários de volatilidade, recessão e incerteza, o franco suíço é uma moeda de refúgio e a sua eventual apreciação nesses cenários de stress contribuem para o insucesso dos carry trades e graves problemas financeiros para quem os realizou”, diz o economista do Banco Carregosa.

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