A experiência em França e a descida com o Paços: «Não desejo a ninguém»

1 semana atrás 36

Rui Pires foi uma das maiores promessas na formação do FC Porto. O médio, atualmente com 26 anos, embarcou para outro tipo de aventuras e voltou a emigrar, desta vez para Singapura, o segundo país que conheceu em termos desportivo depois de França, onde esteve dois anos.

Num país a quase 20 horas de distância de Portugal, o trinco confessa-se feliz com a decisão na carreira, uma vez que tem um estilo de vida que não encontraria na maior parte do mundo. Apesar de o país se equiparar, em termos de dimensão, à ilha da Madeira, conta com quase seis milhões de habitantes e pouco espaço para construir... novos estádios.

A diferença horária entre Singapura e Portugal não é um problema. Rui Pires atende a nossa chamada de sorriso no rosto, pronto a falar sobre todos os capítulos da carreira que começou em Mirandela, onde nasceu. Seguiram-se FC Porto, Paços de Ferreira, Troyes (França) e Lion City Sailors (Singapura).

Nesta terceira e última parte da entrevista ao zerozero, Rui Pires aborda a mudança para França, abre o coração relativamente à lesão grave que contraiu durante esse período e diz não fechar a porta a um regresso a Portugal.

Reveja a primeira e a segunda parte desta entrevista.

ZZ: Fazemos agora uma ponte para França, depois de não se estrear pela equipa principal do FC Porto. Como é que um jovem encarou essa mudança e como é que surgiu?

RP: Eles demonstraram bastante interesse. Tinha várias propostas de equipas da I Liga e foi difícil escolher qual a melhor para a minha carreira. No entanto, temos que perceber que a segunda divisão francesa é forte a nível físico e técnico. Possuem equipas boas, estádios cheios e a qualidade das infraestruturas não fica nada atrás. Falei com algumas pessoas que já lá estavam e toda a gente me aconselhou a ir. O Troyes já estava interessado quando tinham um treinador português, o Rui Almeida. Ele acabou por sair, mas continuaram interessados. Quis arriscar um pouco. Gostei da experiência, apesar de não ter nenhum português comigo. Eles não falam muito bem inglês, ou seja, tive que me desenrascar de outra forma. Aprendi francês num ápice. Pedi logo aulas ao clube, duas vezes por semana. Pouco tempo depois, já estava a dar entrevistas com um português... a roçar o francês [risos]. Gostei muito de estar lá, fora a temperatura, que é um pouco abaixo ao que estamos habituados.

@Rogério Ferreira / Kapta+

ZZ: Não sentiu que foi um passo atrás na carreira?

RP: Não, não. Aprendi bastante, joguei com atletas muito bons e tive um treinador bastante competente. O problema é que na minha primeira época tive uma lesão grave, um cenário pelo qual nunca tinha passado. Foi um bocado de azar, uma vez que tive esse infortúnio num jogo que já estava a acabar. Contraí uma rotura de ligamentos no joelho e deram-me autorização para regressar a Portugal para ser operado. Depois apareceu a pandemia e o nosso campeonato foi dos poucos que não chegou a ser retomado. Estávamos a um ou dois pontos dos lugares de subida... Faltavam ser disputados dez encontros, porém, nunca aconteceram. Ou seja, quem estava nos dois primeiros postos, acabou por subir. Na segunda época, já regressei aos relvados e conseguimos a promoção, inclusive.

ZZ: Como foi o processo de regressar aos treinos? Sentiu medo?

RP: É muito difícil porque tu pensas sempre que a tua vida vai andar para trás. Não sabes como é que vais voltar, se vais estar bem, tens sempre dúvidas. No entanto, contei com uma recuperação top, fui acompanhado por um fisioterapeuta de confiança, o Tiago, a quem tenho de agradecer. Fez-me os tratamentos na altura da pandemia e estava sempre disponível para mim. Mas quando voltas aos treinos... Contas com alguns altos e baixos. Os primeiros momentos são complicados, mas depois são momentos bonitos porque sentes melhorias a cada semana. Começas a andar, a correr. Tens sempre objetivos por cumprir. Lembro-me do primeiro treino. Estávamos a fazer uma posse de bola e tinha medo de ir ao contacto. Ficava só no meu canto e pensava: ''Por favor, ninguém me venha aqui tocar. Deixem-me estar aqui. Não quero nenhum duelo' [risos]. Neste momento, já não sinto nada e estou normal, após um grande exercício mental para ultrapassar o medo.

@Kapta+

ZZ: Pouco tempo findado, abandona França e regressa a Portugal pela porta do Paços de Ferreira. Quais as razões para voltar ao país?

RP: O Paços de Ferreira já estava interessado na altura em que fui para França. O Troyes subiu de divisão e foi comprado pelo Manchester City. A ideia era trazerem jovens jogadores para potenciarem no futuro. Ou seja, quem estava no comando eram pessoas diferentes e mudaram tudo. Tinha mais um ano de contrato e até podia ter ficado lá, mas senti que não ia ter as oportunidades que desejava, ainda para mais após uma lesão. Queria era ter minutos, ritmo competitivo. Nessas situações, o que precisamos é ganhar confiança, voltar a ser felizes. Só somos felizes quando jogamos. Assim, surgiu a oportunidade no Paços de Ferreira. Tinham feito um grande ano e foi uma boa decisão. Acabei por jogar bastante durante os dois anos, apesar de termos descido de divisão na segunda temporada.

ZZ: Nessa época tudo correu mal...

RP: Tivemos um ano bastante atípico até janeiro porque não conseguíamos fazer pontos. Depois, o cenário mudou de figura e começou a melhorar. Foram meses complicados do ponto de vista psicológico. Muitos altos e baixos, muitas trocas... Não desejo isto a ninguém. É como se fosse uma bola de neve, é uma maré de azar onde acontece tudo. Contamos com muitos jogadores jovens de vários países, que precisavam de tempo para se adaptarem. Ainda fizemos bastantes pontos na reta final da temporada, mas foi insuficiente. Contámos ali com alguns confrontos diretos em que podíamos ter feito mais. O futebol é assim, há sempre equipas que têm de descer de divisão. Fiquei muito triste porque as gentes de Paços de Ferreira não mereciam. É um clube familiar, com grandes condições em Portugal. Não há emblemas com tantas regalias. Espero que voltem o mais rápido possível para onde merecem, a Liga Portugal Betclic. 

@Kapta+

ZZ: A nível individual, porém, esteve em destaque...

RP: Fui dos jogadores com mais minutos, fiz praticamente todos os jogos e no final do ano apareceram algumas propostas boas do ponto de vista financeiro. Vim para Singapura estabilizar a minha vida financeiramente e desportivamente. Estou muito feliz porque luto por títulos. Já tinha saudades. É um clube em que é obrigatório ganhar sempre, é uma pressão boa.

ZZ: Um regresso a Portugal está no horizonte?

RP: Sim, sem dúvida alguma. Adoro Portugal, se pudesse estava sempre aí juntamente com a minha família. Penso que ainda vou voltar a Portugal, mas nunca adivinhamos o que pode acontecer. Eu até posso estar no próximo ano ou daqui a dois/três/quatro anos. O ambiente que presenciei aí é diferente de todos os outros. Sinto falta do convívio dos jogadores, do balneário, dos almoços de equipa. Os atletas ficam com saudades.

Portugal

Rui Pires

NomeRui Miguel Guerra Pires

Nascimento/Idade1998-03-22(26 anos)

Nacionalidade

Portugal

Portugal

PosiçãoMédio (Médio Defensivo)

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