Afeganistão. Talibãs estão a colocar mulheres vítimas de abuso na prisão

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Foto: Ali Khara - Reuters (arquivo)

De acordo com um relatório da ONU, o governo talibã está a colocar mulheres sobreviventes na prisão, alegando que o faz "para sua proteção". No entanto, as Nações Unidas consideram que se trata de uma prática lesiva para a saúde física e mental destas mulheres.

O documento divulgado pela Missão de Assistência das Nações Unidas no Afeganistão considera que a violência de género contra mulheres afegãs aumentou desde que os talibãs tomaram o poder no país, ainda que já fosse elevada antes disso.

A prevalência de incidentes de violência de género contra mulheres e raparigas afegãs, inclusive por via de práticas tradicionais prejudiciais, era conhecido por ser elevado antes da tomada do Afeganistão pelos talibãs a 15 de agosto de 2021. Desde então, tem sido ainda superior, dado o impacto das crises económica, financeira e humanitária, que continuam a afetar aqueles que vivem no país”, lê-se no documento.

Destaca também que as mulheres tem sido relegadas de forma crescente para o espaço privado, o que as deixa mais vulneráveis à violência doméstica por parte de parceiros e familiares.

Antes da chegada dos talibãs ao poder, havia no país 23 centros ou abrigos de proteção de mulheres controlados pelo governo, mas estes espaços desapareceram desde então.

Questionados pela missão da ONU no país, os líderes talibã consideraram que não havia necessidade de manter estes abrigos a funcionar e que os espaços são “um conceito ocidental”.

Outros adiantaram que as mulheres devem estar com os maridos ou com membros da família. Em vários casos, as autoridades pediram aos membros masculinos da família que assumissem o “compromisso” de não prejudicar a mulher sobrevivente de abusos.

No entanto, em casos em que as mulheres não tenham familiares homens com quem possam ficar, por exemplo, as sobreviventes de abuso são colocadas na prisão “para sua proteção”.

Esta é uma abordagem semelhante à que os líderes talibãs adotam com os toxicodependentes e sem-abrigo da capital, Cabul.

A missão da ONU no Afeganistão considera que esta atuação constitui “uma privação arbitrária” da liberdade, que confina mulheres que já estão numa situação de vulnerabilidade “num ambiente punitivo”, o que poderá também ter impacto na sua saúde física e mental.

Estas mulheres ficam também em risco de discriminação e estigmatização quando são libertadas, acrescenta.

A Missão de Assistência das Nações Unidas no Afeganistão (UNAMA) enumera outros problemas, desde logo o facto de grande parte das queixas ser entregue a funcionários do sexo masculino.

A completa ausência de mulheres a trabalhar neste meio “desencoraja e inibe as sobreviventes de apresentarem queixas”. De acordo com a UNAMA, muitas das mulheres acabam por não denunciar situações de abuso por receio da arbitrariedade das decisões do governo talibã.

Desde o regresso dos talibãs ao poder, em agosto de 2021, têm sido várias as decisões e ações por parte das autoridades no sentido de retirar direitos a mulheres e raparigas do país.

Poucos dias após a tomada de poder, em 2021, os talibãs tinham prometido que as mulheres poderiam estudar e trabalhar mesmo após as mudanças políticas no país. “As mulheres terão um papel muito ativo na nossa sociedade”, prometeram.

No entanto, em decisões subsequentes, as raparigas passaram a poder frequentar apenas o ensino primário e ficaram excluídas de facto de outros níveis de escolaridade e do mercado de trabalho. 

As mulheres e raparigas não podem frequentar parques, ginásios e piscinas e só podem viajar acompanhadas por um familiar do sexo masculino.


Em 2022, os talibãs assinaram um decreto que obriga as mulheres a usarem a burca, vestuário que tapa completamente o corpo, da cabeça aos pés, deixando apenas os olhos visíveis.

“As mulheres que não forem muito velhas ou novas devem cobrir o rosto, exceto os olhos”, determinaram. Já este ano, os poucos salões de beleza e cabeleireiros que ainda resistiam foram encerrados por ordem dos talibãs.

Há quase um ano, a 24 de dezembro de 2022, os talibãs determinaram a exclusão das mulheres das organizações não-governamentais a nível local e também das ONG internacionais que operam no Afeganistão.

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