As Causas. Racismo, imigração e 'maniqueísmo'

4 meses atrás 102

Dois temas me preocupam há muito, e não só, e se calhar nem principalmente, pelos motivos que para muitos serão os evidentes.

Falo de imigração e de racismo. Estes temas nunca foram problema na minha pequena história pessoal: por vários motivos, sempre abominei o racismo desde que me conheço; e, descendendo de imigrantes pelo lado paterno e materno (os nomes Alarcão e Júdice não mentem…), acho que bebi com o leite materno o orgulho dessas origens exteriores à minha amada Pátria.

A eleição europeia que vai ocorrer em menos de três semanas é um bom pretexto para a análise dos temas, como são alguns eventos recentes em Portugal.

Um aviso à navegação: pessoas demasiado sensíveis e complexadas, talvez seja melhor precaverem-se.

BOCA FOLEIRA OU CRIME DE ÓDIO?

Comecemos então pelo racismo. O exemplo mais recente foi o pandemónio que se criou na Assembleia da República depois de André Ventura ter assumido – para criticar o tempo previsto para construir o novo aeroporto de Lisboa – que os turcos “não são conhecidos por ser o povo mais trabalhador do mundo”.

A esquerda unida oficial revoltou-se contra Aguiar Branco por não ter agido depois disso para impedir o que foi apelidado – por exemplo – de “discurso de ódio”, um “crime”, a “passagem de uma linha vermelha” ou que “foi a tirada mais grave na casa da democracia desde que [André Ventura] foi eleito deputado pela primeira vez” (o disparate maior, vindo de ex-líder do PP, pois infelizmente já houve bem pior).

E também foi exigido pela SOS Racismo que Aguiar Branco se demitisse, e por outros que se retratasse, pedisse publicamente desculpas ou ao menos que se arrependesse e mudasse a sua posição.

Talvez fosse sensato que eu me limitasse a dizer que Ventura disse uma “boca foleira”, um disparate, fez uma provocação, exprimiu um “preconceito” como sensatamente afirmou a Embaixada Turca em Lisboa, foi incivilizado e mal-educado para com um povo amigo.

E que me limitasse também a dizer que Aguiar Branco está roxo de razão, citando nesse sentido o pai adotivo das irmãs Mortágua, Francisco Louçã (eu sei que foi no tempo de Sócrates para que o BE pudesse dizer o que lhe apetecia), e agora Isabel Moreira, Sérgio Sousa Pinto, Francisco Teixeira da Mota, João Pereira Coutinho, Jorge Lacão, João Miguel Tavares, Leonor Caldeira, Pedro Gomes Sanches, entre tantos outros.

ESQUERDA: AJUDAR O CHEGA

No entanto, acho que o tema é demasiado sério para ser varrido para debaixo da mesa. E não pelas razões esgrimidas à Esquerda.

A urgência em o abordar também nasce do nenhum relevo que eu tenha visto as televisões darem a comentários contra a corrente, dos acima citados e de outros, durante um fim de semana em que nos encharcaram com a tese contrária, ao ponto do Observador ter titulado um take da Lusa (nem a Lusa nem PNS diziam isso) “Pedro Nuno sobre Aguiar Branco: ‘discurso racista’”!

Como é óbvio, o que Ventura disse é tão racista como o que afirmou o Presidente da República à imprensa estrangeira sobre António Costa e é igualmente lamentável e censurável.

Mas está muito mais perto da boca foleira do que do discurso de ódio.

Apetece até citar Jesus Cristo e dizer que lance a primeira pedra o grupo parlamentar que nunca cometeu pecado semelhante.

Convirá, pois, racionar a indignação para coisas mais graves.

Talvez por isso, é preciso perceber a razão profunda de tanta teatralidade. Para mim, como base, há a transformação do racismo na explicação de tudo o que nos incomoda (adiante falarei de um livro bem oportuno).

Mas existe também o facto de que toda a estratégia política da Esquerda ser, por um lado, tentar convencer que a AD e o CHEGA no fundo se amam, e ao mesmo tempo, tudo continuar a fazer – como nos tempos das presidências Ferro Rodrigues e Santos Silva – para criar uma bipolarização com o CHEGA ajudando-o a crescer.

E Ventura agradece penhorado, pois estamos em campanha eleitoral e as sondagens não o sossegam. Nada melhor do que este epifenómeno para recuperar.

A TÁTICA: DESANCAR AGUIAR BRANCO

Mas seja ou não crime de ódio disparar contra turcos, como quando Eça de Queirós – à falta de tema para uma crónica - desancou o Bey de Tunes, o que é mais grave é o ataque a Aguiar Branco, desancado pela Esquerda e pelos media por se recusar a fazer o que Ventura quer e que os atacantes afinal também desejam.

O que Aguiar Branco disse é um exemplo de “óbvio ululante”: não lhe compete fazer censura, instituir uma política do gosto, substituir-se ao MP, ajudar a fazer do Parlamento um circo, com Ventura a subir nas provocações para ser impedido de falar e se passarem dias inteiros a falar disso.

Se Ventura cometeu um crime contra os turcos, ou contra toda a humanidade que não seja caucasiana, há tribunais para disso tratar.

Se não cometeu, por que carga de água compete ao Presidente da Assembleia da República agir como se o tivesse cometido?

E, de novo, isto não é mais do que uma derivação da teoria de que o PSD está feito com o CHEGA. Desta vez, subliminarmente, através de Aguiar Branco.

Se houvesse dúvidas, bastava ver a lógica do PS, BE e LIVRE ao recusar ouvir os antigos presidentes do Tribunal Constitucional: isso esvaziaria o balão.

O FALSO DILEMA DA IMIGRAÇÃO

Passemos então às coisas sérias. Como é o caso da imigração.

Também aqui o maniqueísmo reina. Se olharmos para os media nos últimos dias, e para o que dizem alguns políticos, há apenas um dilema: fechar as fronteiras da Europa ou manter as fronteiras abertas.

Se não fosse proibido pela cultura woke chamar “estúpido” a alguém (acaba de sair um romance na tradição orwelliana que começa com isso, “Mania” de Lionel Shiver) era o que apetecia dizer.

A realidade nunca foi a preto e branco e se há filmes magníficos que o preservam, o mundo real nunca o será.

Em regra quase absoluta, um dilema dá jeito à propaganda e aos debates, mas é uma simplificação falsificadora. Veja-se o tema da imigração, de que como mero exemplo, sobre as fronteiras se podem apresentar pelo menos 9 soluções:

Não entra ninguém; Só entra quem não tiver certas nacionalidades e/ou religião (islamismo); Só entra quem tenha autorização de acordo com as leis vigentes; Só entra quem tenha contrato de trabalho ou promessa firme de o concretizar; Só entra quem tenha certo tipo de habilitações; Só entra um número limitado por ano, a definir de acordo com regras; Apenas entra ilegalmente quem demonstre ser perseguido no seu País por motivos políticos e por isso é refugiado; Entram todos os que invoquem a crise climática; ou Todos os que queiram, cheguem ou não ilegalmente, e sem nenhumas regras.

Como é óbvio, cada uma destas nove hipóteses pode ser declinada em muito mais sub-hipóteses.

Eu compreendo que é difícil debater em 10 minutos nas televisões todas essas nuances da realidade.

Mas o resultado é óbvio: a simplificação da dicotomia entre fronteiras fechadas e fronteiras abertas, a qual favorece os radicais de Esquerda e de Direita. E que provoca nos moderados a enorme dificuldade de defender a sensatez - o que se enquadra em 5 das alíneas supra, as c) a g) - num mundo cheio de malucos (digo-o enquanto não seja claro que dizer isto é crime).

200 MILHÕES DE REFUGIADOS?

Vejam apenas um exemplo: o candidato do LIVRE às eleições de junho afirmou, como algo natural e inevitável, que até 2050 aportarão às fronteiras da União Europeia 200 milhões de refugiados climáticos.

A afirmação está totalmente distorcida: (i) a previsão refere 25 a 1000 milhões, ou seja, vale pouco, (ii) inclui migrantes dentro de cada país, (iii) os que se dirigem a muitas áreas e não só à Europa, e (iv) pressupõe políticas invariantes.

Em todo o caso, assumir a inevitabilidade pressupõe fronteiras totalmente abertas e que a única alternativa seriam as fronteiras totalmente fechadas.

A mensagem surge naturalmente aterradora: um aumento em duas gerações de 50% da população na União Europeia, esmagadoramente não qualificada, num tempo em que cada vez haverá menos emprego não qualificado disponível pois é substituído por máquinas, robots e inteligência artificial.

O que isto significa não é que a Europa tem de se fechar a sete chaves, mas que tem de regular a imigração, o que está a fazer e vai ter de acentuar, que não é viável política e economicamente ter as portas escancaradas, o que os moderados devem ter a coragem de afirmar e defender.

Mas não é isso que ouvimos e lemos: a Esquerda radical, a teoria crítica da raça, o maniqueísmo, criam má consciência nos moderados que se ousarem dizer que tem de haver regras para a imigração são de imediato apodados de radicais de Direita, extremistas, fascistas e racistas. E, como não querem ter maçadas, assobiam para o lado ou só dizem banalidades.

Como resultado, o CHEGA e os seus parceiros por essa Europa fora surgem como os únicos que se opõem às portas escancaradas, sintonizando com a esmagadora maioria da população: em Espanha recente sondagem dá 72% de preocupados com a imigração, por exemplo.

Com isso talvez se tornem (se somarem os dois grupos de Direita radical) no primeiro grupo no Parlamento Europeu e acabarão a governar muitos países europeus, com grande alegria da Esquerda radical e da Esquerda tonta, que no fundo apostam na tese do “quanto pior, melhor”.

Já vimos isto acontecer na Europa no século passado. Parece que não queremos aprender.

O ELOGIO

Ao Presidente da República porque – talvez em homenagem a Camões – saiu do que parecia um “sono eterno” e recomeçou a exercer a sua função.

O que foi isso? Defender uma evidência objetiva, mas que não será fácil politicamente e por isso revelou coragem: o PS tem de se abster na votação do Orçamento no final do ano e não fazer cair o Governo.

Só é pena que Marcelo tenha andado a malbaratar o prestígio presidencial (pela primeira vez, numa sondagem para a TVI, os que o classificam “mal ou muito mal” são mais do que quem acha que está “bem ou muito bem”), por exemplo com 74% dos portugueses a criticar o que disse e como disse sobre reparações pelo passado e 85% a criticarem fortemente o que disse sobre António Costa e Luis Montenegro.

LER É O MELHOR REMÉDIO

Por mero acaso acabei na passada semana de ler o best-seller do NYT “America's Cultural Revolution - How the Radical Left Conquered Everything”, de Cristopher F. Rufo. É a melhor obra que li sobre a forma como a Esquerda Radical, de Marcuse a Paulo Freire, de Angela Davis a Derrick Bell, colonizou as universidades americanas com a “teoria crítica da raça” e a tese do “racismo sistémico” que habitaria dentro de qualquer branco. Livro a traduzir, não tenho dúvida.

E aproximando-se o 10 de junho e o 500º aniversário da provável data do nascimento de Luís de Camões, durante algumas semanas irei propor livros camonianos.

Hoje, de Frederico Lourenço, admirável classicista e grande escritor, “Camões – Uma Antologia” (Quetzal), para ler a seleção comentada de textos de “Os Lusíadas” e da “Lírica”, à venda a partir da próxima semana. E também para abrir o apetite para mais.

A PERGUNTA SEM RESPOSTA

O caos dos imigrantes a tentarem acesso ao AIMA para pagar uma taxa de 400 euros para se iniciar o processo da sua regularização em Portugal, levou um bom amigo a sugerir-me o seguinte:

A grande maioria dos emigrantes que procuram legalizar-se estão empregados. Porque não, as empresas onde trabalham fazerem o link com a AIMA?”. E, digo eu, as entidades patronais pagar essa taxa?

Assim não perdiam dias de trabalho, saber-se-ia quem tem emprego e poupavam-se imagens que nos envergonham.

A LOUCURA MANSA

Soube ontem que, durante quase uma semana, esteve ocupada parte da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, impedindo aulas e acesso dos professores aos seus gabinetes.

Os ocupantes copiam (apeteceria dizer como “macaquinhos de imitação”) o movimento “End Fossil End Genocide”, importado como os filmes de “cowboys” dos EUA, e algo idêntico ocorreu na Faculdade de Ciências do Porto e vai continuar a acontecer.

Já é loucura que chegue o que fazem estes meninos. Mas a maior loucura é que os responsáveis das universidades hesitem em chamar a polícia para repor os direitos de professores e estudantes assim afetados de modo manifestante desproporcional.

E que não se ouça uma voz de nenhum partido, do ministério da Educação, do Conselho de Reitores, de sindicatos ou associações de estudantes, a criticar estes métodos.

Honra lhe seja pela coerência: o BE aplaude as ocupações no seu jornal “Esquerda Net”.

Ler artigo completo