As declarações de Marcelo? "Foi tudo muito infeliz"

4 meses atrás 55

ELEIÇÕES NO FCP 

A democracia funcionou uma vez mais. Agora, no plano desportivo. E isso é sempre de enaltecer. Uma vitória da democracia – mesmo da democracia interna dos clubes desportivos – é sempre um acontecimento inspirador. Impõem-se, pois, duas saudações: 

Uma saudação a André Vilas Boas. A sua vitória não é só esmagadora. É, sobretudo, a vitória da coragem. Coragem de ser alternativa, coragem de enfrentar o poder, coragem de falar com frontalidade e de agir sem calculismos. E na hora da eleição afirmou-se com nível e superioridade.  Uma saudação a Pinto da Costa. Sai derrotado nas urnas porque não soube sair do poder a tempo; mas sai com um lugar enorme na história do clube. Fez do FCP um clube com uma excecional dimensão nacional e internacional; e é, em todo o mundo, o Presidente de um clube de futebol com mais títulos conquistados. Isto é obra e é história. 

Há poucos anos, Frederico Varandas passou a liderar o Sporting. Mais recentemente, Rui Costa chegou a Presidente do Benfica. Agora, é André Vilas Boas que conquista a posição cimeira no FCP. O que há em comum nestas três circunstâncias é muito claro: uma mudança geracional nos três principais clubes do país. E uma mudança geracional pode ser uma lufada de ar fresco no mundo do futebol. Bom para o futebol e bom para a sociedade. 

OS 50 ANOS DE ABRIL 

Cinco décadas celebradas com grande dignidade e ampla participação. Alguns destaques: 

As manifestações populares, que atingiram uma dimensão muito superior às dos anos anteriores. Compreende-se que assim seja e é bom que assim seja. As pessoas gostam genuinamente do 25 de Abril, gostam da liberdade e estão gratas aos militares de Abril.   O encontro que o PR organizou com os Presidentes dos Países Africanos de Língua Portuguesa e com o Presidente de Timor-Leste. Uma excelente iniciativa de Marcelo Rebelo de Sousa. Mostra que as relações com estes países estão no ponto mais alto de sempre. E recorda o enorme potencial que existe em torno da afirmação da língua portuguesa no mundo.  A sessão na Assembleia da República, com três enfoques especiais: a feliz iniciativa do PAR, decidindo homenagear as quatro vítimas do 25 de Abril, mortas covardemente pela PIDE naquele dia de 1974; e duas intervenções diferentes do padrão tradicional: a intervenção do Livre e a do PSD. Os discursos de Rui Tavares e Ana Gabriela Cabilhas foram lufadas de ar fresco.  As várias iniciativas comemorativas que se realizaram pelo país, nos Municípios e nas Escolas. Desta vez, houve mais iniciativas do que é normal. Sobretudo em escolas. A ideia dos professores de levar o 25 de Abril até às crianças e jovens foi uma grande ideia. 

 
O único senão é que, ao contrário do que há dias sugeria Ramalho Eanes, falou-se pouco de futuro. Com poucas exceções, a regra foi falar mais do passado. Mas compreende-se. Foi mais um dia de celebração que um dia de projeção de ideias. 


AS POLÉMICAS DE MARCELO 

Ao falar com a imprensa estrangeira, o PR teve uma noite infeliz, disse o que não devia ter dito e concentrou as atenções em si pelas piores razões. Foi tudo sem sentido: as considerações deselegantes sobre Luís Montenegro e António Costa; as explicações desnecessárias sobre as relações com o seu filho, que devem ser da intimidade familiar e não da praça pública; e sobretudo a infelicidade da ideia sobre alegadas indemnizações às ex-colónias. A ideia de reparações financeiras às ex-colónias é uma ideia sem sentido, é um contencioso que não existe, é um tema que irrita a sociedade e que não se deve abordar à mesa do café com esta ligeireza. Ainda por cima sem concertação com o governo, a única entidade com competência na matéria. Tudo muito infeliz. 

Claro que Marcelo tem sempre um registo muito informal. Mas desta vez foi de mais. O PR tem de controlar este ímpeto. Para seu bem e do país. 

Um PR deve ser fator de união. Ao agir deste modo, o PR não está a unir. Está a dividir. Como se viu na AR, no 25 de Abril. As críticas que lhe fizeram são lamentáveis, mas o PR deu azo a isso.  Um PR deve ser fator de equilíbrio. Ainda por cima quando a sociedade está muito radicalizada. Ao abordar como abordou temas como as indemnizações às ex-colónias, o PR só contribuiu para acrescentar radicalismo aos radicalismos já existentes. 


Ainda por cima, há o critério da oportunidade. Estamos numa altura em que o país precisa muito do PR, para fazer pontes e ajudar a "segurar" a estabilidade: a AR está muito fragmentada; e o Governo tem uma maioria muito escassa. Ora, Marcelo só pode ajudar o país se tiver a sua credibilidade em alta e se não delapidar o seu capital político. Intervenções como esta não ajudam. É preciso ter mais cuidado. 

LISTAS PARA AS EUROPEIAS 

Comecemos pela lista do PSD: 

A escolha de Sebastião Bugalho pode ser surpreendente. Mas as críticas à sua escolha são manifestamente exageradas. Não se pode pedir aos líderes que escolham em função da qualidade, da renovação, da juventude e da não dependência dos aparelhos partidários e depois criticá-los quando seguem esses caminhos.  Acresce que, apesar de Bugalho não ter ainda curriculum europeu, tem, todavia, um talento político invulgar. Muito acima do que é normal. É um jovem que irá longe na política.  Finalmente, o convite a Rui Moreira para ser número dois: uma pessoa com o estatuto de Rui Moreira ou se convida para número um ou não se convida. Este convite foi, pois, uma brincadeira de mau gosto. Uma completa falta de respeito

Depois, a lista do Partido Socialista: 

A aposta em Marta Temido é uma aposta eleitoral forte. Marta Temido teve muitas falhas na Saúde, mas é a figura mais popular do PS. E conjuntamente com Francisco Assis torna muito sólida a lista do PS. O que mostra que PNS quer ganhar as eleições europeias, transformadas que estão numa espécie de segunda volta das legislativas.  O que já faz menos sentido é substituir todos os deputados que o PS tinha no PE: renovação, sim, mas nem tanto. Deputados como Maria Manuel Leitão Marques ou Margarida Marques fazem falta em Bruxelas. São competentes. Mas percebe-se a estratégia: a pouco e pouco, Pedro Nuno Santos está a "limpar" o "costismo" e a afirmar a sua liderança. 

DEMISSÕES NO SNS 

Fernando Araújo tomou a decisão de se demitir da Comissão Executiva do SNS. É de saudar tal decisão. 

Primeiro, é de saudar porque é uma decisão clarificadora. É claro há muito tempo que há orientações incompatíveis entre Fernando Araújo e Ana Paula Martins em relação às ULS. Sendo assim, é melhor clarificar já, do que andar a disfarçar para o divórcio se consumar mais tarde.  Segundo, é também sabido que entre o PSD e Fernando Araújo há um mal-estar devido à participação deste na campanha eleitoral do PS. Assim sendo, é sempre melhor a clarificação que a hipocrisia. E Fernando Araújo optou pela clarificação. Mostra que é uma pessoa de caráter. 

A partir de agora, escolha quem escolher para substituir Fernando Araújo, a Ministra da Saúde fica muito mais exposta. Deixou de ter um anteparo. Vai ser ainda mais escrutinada. Convém que tenha isto em atenção: a realidade política mudou. 

O primeiro grande momento de escrutínio vai ser o Programa de Emergência para a Saúde, a apresentar até 2 de junho. Ou é um programa bem concreto, quantificado e calendarizado, ou então vai tornar-se um instrumento de vulnerabilidade da Ministra. 

CARGA FISCAL EM ALTA 

A OCDE divulgou esta semana mais um relatório especialmente impressivo acerca da carga fiscal em Portugal. Vejamos, apenas, dois exemplos concretos: 

No caso de um trabalhador solteiro e sem filhos, Portugal é o 8º país da OCDE com impostos mais altos. Acima da média da OCDE. À nossa frente só países mais ricos, como a Bélgica, a Alemanha ou a Áustria.  No caso de um casal com dois filhos – exemplo muito habitual – a situação é ainda pior. Nesse caso, Portugal passa a ser o 6º país com impostos mais altos em relação a famílias com filhos. Muito acima da média da OCDE. 

Estes dados agora divulgados pela OCDE provam o acerto da proposta do Governo de fazer uma nova redução do IRS. Esperemos agora que a AR tome a decisão correta e não inviabilize uma boa solução. 

O Governo apresenta uma proposta de baixa do IRS no valor de 350 milhões de euros. Como não tem maioria no Parlamento, seria positivo que o Governo negociasse a sua proposta e aceitasse mesmo aumentar um pouco o valor da redução fiscal, em favor de uma aprovação.  Por sua vez, seria positivo que os partidos da oposição não fizessem exigências financeiras incomportáveis. Subir, por exemplo, a proposta do Governo de 350 para 500 milhões ainda pode ser tolerável. Fazer aumentá-la para o dobro ou mais, como alguns propõem, pode  comprometer a sério as finanças públicas. É preciso equilíbrio, diálogo e bom senso. 

OS REFORMADOS E A POBREZA 

Em vésperas de o Governo tomar decisões sobre a melhoria das pensões dos reformados, de acordo com as suas promessas eleitorais, vale a pena conhecer os dados divulgados pelo recente relatório da Segurança Social relativo a 2022. É que os números mais atualizados mostram que, 50 anos depois do 25 de Abril, a situação dos pensionistas é ainda muito vulnerável. 

A maioria das pensões em Portugal está abaixo do limiar da pobreza (591 euros). De facto, 67% dos pensionistas (1,3 milhões) tem reformas abaixo de 443€.  A pensão média atingiu os 506€ em 2022. Apesar do esforço de atualização feito, o aumento, em cinco anos consecutivos, foi de apenas 44€.  As mulheres têm pensões mais baixas que os homens. E a diferença não é irrelevante: as mulheres recebem menos 43% do que os homens.  Finalmente, o complemento solidário para idosos (CSI) não cobre todos os pensionistas. Bem ao contrário: apenas 7% dos reformados têm acesso ao CSI. 

No meio destes dados preocupantes, há um sinal de confiança: o Governo já decidiu alterar a lei relativa à atualização das pensões, para que todos os pensionistas tenham garantida a atualização atual. Ao contrário do que hoje sucede. Ainda não há decisão. Mas já há uma luz ao fundo do túnel.

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