Bill Viola. O corpo e o espírito

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Influente criador de videoarte norte-americano.

Foi um dos mais destacados cultores da videoarte, um tipo de expressão artística que surgiu de forma experimental na Nova Iorque dos anos 60 e se tornou progressivamente aceite e comercialmente rentável.

Os seus vídeos caracterizavam-se pelo recurso frequente à câmara lenta e pela presença assídua da água. Mas havia mais do que as imagens: as suas criações assentavam também grandemente numa atmosfera envolvente, desencadeadora de sentimentos e de emoções no espectador. Embora usasse um meio moderno, por vezes com alta tecnologia envolvida, as referências ao budismo, ao cristianismo e à arte do passado eram facilmente reconhecíveis nas suas obras. Bill Viola, ‘o Rembrandt da era do vídeo’, como lhe chamou uma crítica em 2001, faleceu no passado dia 12 de julho na sua casa de Long Beach, Califórnia, de Alzheimer. Tinha 73 anos.

Nascido em Queens, Nova Iorque, em 1951, a sua vida ficaria marcada por um episódio de infância, quando passava férias com a família na montanha. A circunstância de quase se afogar num lago, em vez de o perturbar ou traumatizar, ficou-lhe na memória como uma espécie de vislumbre de um mundo encantado, um momento de paz inigualável. Talvez por isso, em obras como Ocean without a shore, feita para a Bienal de Veneza de 2007 e instalada na Igreja de San Gallo, a água aparecia como um elemento de transição entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos.

Estudou na Syracuse University, onde obteve um bacharelato em Belas Artes em 1973, ano em que começou a colaborar com o músico David Tudor (o mesmo que executou pela primeira vez a famosa peça ‘silenciosa’ 4’33’’ de John Cage). Nessa década andou por Itália, mas também pelas remotas Ilhas Salomão, Java e Indonésia, registando em vídeo ritos tradicionais daquelas populações. Convidado para expor numa universidade de Melbourne, iniciou uma relação com a sua ‘anfitriã’, Kira Perov, com quem viria a casar-se.

Em 1980 foram para o Japão, onde estudaram os fundamentos do budismo com um mestre zen. Ao fim de um ano e meio fixaram-se na Califórnia.

Em 1995, foi o artista escolhido para representar os EUA_na Bienal de Veneza. Entre as obras que levou à Sereníssima, encontrava-se uma inspirada na Visitação de Jacopo Pontormo, uma pintura do século XVI. Viola viu-a num livro e não mais a esqueceu. Um dia, estava a conduzir o seu carro para o ateliê onde trabalhava e teve uma espécie de epifania. «Havia três mulheres numa esquina, onde tive de parar no sinal vermelho. Estavam a voltar da hora de almoço e passaram mesmo à minha frente, do outro lado da rua. À medida que começaram a atravessar a rua, o vento levantou-se e agitou-lhes os vestidos. Eu estava na cápsula estanque do carro, um observador exterior, numa posição perfeita para observar. Vi-as afastarem-se e o semáforo ficou verde. Assim que cheguei ao ateliê, a primeira coisa que fiz foi ir buscar o livro de Pontormo. Abri-o e lá estava, exatamente a mesma cena a que eu tinha visto na rua, vinda do Renascimento. Inacreditável».

Transportou a experiência para o vídeo The Greeting, deixando os seus amigos chocados por usar cenários teatrais e modelos com vestidos esvoaçantes. «Ficaram horrorizados. Chamaram-me traidor».

As obras de Viola extravasaram as paredes dos museus e galerias. Para os Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004, foi-lhe encomendada a instalação The Raft , mais um a vez uma evocação de uma pintura clássica (A Jangada da Medusa, de Géricault) e mais uma vez uma obra onde a água tem protagonismo. Em Portugal, o MAC/CCB possui uma obra de Viola, a instalação Il Vapore, de 1975, que associa ao vídeo uma forte componente sensorial, com o som de água a correr e o cheiro de folhas de eucalipto.

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