Carla Benedito: “Os medicamentos criados por IA conseguem simular a reação dos recetores humanos a uma velocidade muito mais rápida”

2 meses atrás 56

O Futuro do Futuro

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Em Portugal há mais de 600 mil pessoas afetadas por doenças raras, mas o processo de análise e certificação continua a ser moroso. “Não temos um processo dedicado à avaliação dos medicamentos raros, o que faz com que levem muito mais tempo a serem a serem avaliados”, refere Carla Benedito, diretora geral da Takeda em Portugal, em entrevista ao Futuro do Futuro. A gestora alerta ainda para as mudanças no nosso habitat que levam ao aparecimento de novas doenças

As alterações climáticas também podem tornar-se alterações do estado de saúde de um país inteiro. “Há o risco crescente de termos dengue e outras doenças que não havia em Portugal pela questão das alterações climáticas”, alerta Carla Benedito, diretora-geral da delegação portuguesa da farmacêutica Takeda, em entrevista ao Futuro do Futuro.

A gestora refere que ainda não há caso para alerta sobre infeções de Dengue no país, mas lembra que a atual tendência climática pode desencadear uma mudança de cenário nos próximos tempos. “A própria Organização Mundial de Saúde diz que o maior risco para a saúde da humanidade nos próximos anos vem das alterações climáticas. Portanto, temos que levar muito a sério o que está a acontecer com as subidas de temperatura, com os impactos que isto tem na saúde das pessoas”, refere a gestora, dando como exemplo as cerca de 70 mortes que se registaram, nos últimos tempos, na Europa, com o vírus do Nilo Ocidental.

Em paralelo com as alterações dos padrões climáticos, a população continua a aumentar. E a própria estatística ajuda a explicar, em parte, o facto de as doenças que ameaçam a humanidade não terem parado de proliferar. “Continuam a aparecer doenças novas”, confirma Carla Benedito.

Tiago Miranda

Na atualidade estão identificadas entre 7000 e 8000 doenças consideradas raras. A gestora da Takeda admite que, eventualmente, seria possível dar uma resposta efetiva com o desenvolvimento de novos tratamentos se o número de doenças raras fosse “finito” e não continuasse a aumentar - mas a realidade revela-se bem mais imprevisível. “O que acontece é que há doenças que nós ainda não conhecemos que vão adicionar-se àquelas que nós conhecemos”, sublinha a gestora.

As doenças raras devem o nome ao facto de afetarem menos pessoas que outras maleitas mais comuns, mas o somatório de todas as doenças revela que, no final, há uma considerável percentagem da população que necessita de terapias que nem sempre figuram nas prioridades dos sistemas de saúde, dos cursos de medicina, ou das estratégias das farmacêuticas.

“Em Portugal, estimamos que cerca de 600 mil pessoas são portadoras de uma doença rara”, refere Carla Benedito. “Uma das doenças para a qual temos uma terapia tem sete doentes em Portugal”, acrescenta a gestora.

Foi para ilustrar um misto de alerta e esperança que Carla Benedito deu resposta aos dois desafios que costumam ser colocados no Futuro do Futuro com um som de crianças em plena brincadeira e diversão, e ainda o quadro “Noite Estrelada” de Vincent van Gogh.

No caso do som, a responsável da Takeda procurou lembrar as crianças que sofrem de uma doença rara conhecida por intestino curto que as obriga a serem alimentadas por via venosa devido ao facto de terem um consumo de nutrientes reduzido.

"A Noite Estrelada", de Vincent Van Gogh, foi escolhida por Carla Benedito para ilustrar a esperança e a necessidade de criar medicamentos para doenças raras

DR

“Muitas das crianças que têm intestino curto não saem à rua, não brincam, não têm uma vida social para além da vida da casa” refere, sem deixar de salientar depois “a grande alegria” proporcionada por um tratamento que permite que estas crianças façam uma vida mais próxima do convencional sem terem de ficar limitadas pelo “saco de alimentação parentérica”, que lhes fornece nutrientes.

Carla Benedito destaca o “boom” de medicamentos novos que irrompeu com a nova legislação aprovada por volta do ano 2000, e perspetiva a proliferação de novas terapias com a ajuda da Inteligência Artificial e das simulações computacionais. A responsável da Takeda recorda que os algoritmos permitem criar “mecanismos que conseguem testar, em vez de 10 compostos, milhões de compostos de uma vez só”. Com as simulações da Inteligência Artificial, o desenvolvimento de novos fármacos torna-se mais rápido.

“Conseguimos simular qual é a reação dos recetores humanos àquela molécula a uma velocidade que nós nunca conseguiríamos fazer na prática”, responde a gestora.

Nem todos os procedimentos de introdução de um novo medicamento no mercado beneficiam de uma aceleração comparável à da Inteligência Artificial. Carla Benedito recorda que alguns países já começaram a desenvolver procedimentos específicos para a avaliação dos medicamentos raros pelas autoridades especializadas.

A gestora aproveita esta entrevista para deixar o mote para que o processo se torne mais expedito no país. Ainda que não seja caso único na Europa, “em Portugal não temos um processo dedicado à avaliação dos medicamentos raros, o que faz com que os medicamentos raros levem muito mais tempo a serem a serem avaliados”, conclui a diretora geral da Takeda em Portugal.

Tiago Pereira Santos

Hugo Séneca conversa com mentes brilhantes de diversas áreas sobre o admirável mundo novo que a tecnologia nos reserva. Uma janela aberta para as grandes inovações destes e dos próximos tempos.

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