Cerca de 700 mil portugueses sofrem de insuficiência cardíaca

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Um em cada seis portugueses com mais de 50 anos sofre de insuficiência cardíaca, patologia que está associada a um elevado número de hospitalizações e mortalidade. São cerca de 700 mil pessoas e 90% não estão diagnosticadas.

As conclusões são do Estudo Epidemiológico sobre Insuficiência Cardíaca (PORTHOS - PORTuguese Heart failure Observational Study), que é apresentado esta terça-feira. Em declarações à Renascença, Rui Baptista, cardiologista e investigador principal, diz que o trabalho mostra porque é que a insuficiência cardíaca é a principal causa de hospitalizações em pessoas com mais de 65 anos.

“Encontramos na população portuguesa, com mais de 50 anos, uma prevalência de 17% da síndroma de incidência cardíaca, o que dá mais ou menos um em cada seis pessoas com mais de 50 anos em Portugal continental. Esta é a primeira conclusão. Portanto, mostra que estamos perante um problema que é muito prevalente, é muito comum. E isso também explica porque é que a insuficiência cardíaca é a principal causa de internamento em doentes com mais de 65 anos no nosso país."

O último estudo sobre a prevalência da insuficiência cardíaca em Portugal foi feito em 1998. Vinte e cinco anos depois, o número de casos praticamente duplicou: passou de 400 mil para 700 mil.

Rui Baptista diz que o envelhecimento da população e a falta de controlo de doenças como a diabetes e a tensão arterial explicam esta evolução.

“À medida que há uma maior proporção de portugueses mais velhos, e a insuficiência cardíaca está intimamente relacionada ao envelhecimento, nós temos, em termos absolutos, mais casos, portanto, isto é logo uma das primeiras explicações. Em segundo lugar, nós em Portugal temos dois fatores de risco para a incidência cardíaca, que são muito prevalentes, que é a hipertensão arterial e a diabetes. Portanto, o facto de haver muitos portugueses a viver nos seus 40, 50, 60 anos com hipertensão arterial e diabetes faz com que estes fatores de risco vão agindo sobre o coração. E o que acontece é que passados 10, 15, 20 anos, o coração começa a entrar em insuficiência.”

Alerta vermelho

Para Rui Batista, cardiologista e investigador principal do estudo PORTHOS, estes resultados são um alerta vermelho para um problema de saúde pública, que deve obrigar o Serviço Nacional de Saúde (SNS) a mudar e a adaptar-se a esta nova realidade.

“É importantíssimo que os modelos de organização do sistema de saúde se adaptem à diferente epidemiologia das doenças. Portanto, o que nós agora temos muito é o quê? São doentes que vivem com doenças crónicas pautadas por agudizações”, sublinha.

“Nós falamos muito da questão das urgências, que há uma grande procura pelas urgências também muito porque nós não temos sistemas montados para acompanhamento destes doentes com doenças crónicas complexas, como é a insuficiência cardíaca. Portanto, é fundamental controlar adequadamente os doentes com diabetes, com hipertensão arterial, é fundamental garantir que há uma redução da taxa de obesidade no país, um melhor controlo da dislipidemia, porque todos estes fatores de risco vão levar a uma degradação da função cardíaca. Mas não é só o Coração, também é o rim e também vão causar os AVC.”

O conhecimento deste problema é, na opinião do cardiologista da Universidade de Coimbra, uma oportunidade para criar estratégias para diagnóstico precoce desta síndrome e, fundamentalmente, para a sua prevenção.

Se os fatores de risco - como a hipertensão, a diabetes e a obesidade - forem controlados, é possível travar esta epidemia que tem tendência para aumentar.

“Estas doenças cardio-cérebro-vasculares têm que ser controladas através da mitigação dos fatores de risco e mais ainda, numa outra coisa que nós chamamos a prevenção primordial que é atuar nas crianças para que elas não venham a desenvolver estes fatores de risco. Portanto, Portugal tem uma taxa de sobrepeso e obesidade infantil à volta 30%, portanto, a ideia é que devemos atuar cada vez mais cedo, para que as pessoas cheguem à meia-idade sem os fatores de risco, que depois vão levar a que desenvolvam as doenças posteriormente.”

"90% dos doentes não tinham diagnóstico prévio"

Para Rui Baptista, também tem que haver um “esforço enorme” na deteção precoce destes casos.

“O que nós encontramos neste estudo foram formas precoces de insuficiência cardíaca de doentes que nunca tiveram uma compensação, nunca foram à urgência. Aliás, 90% dos doentes não tinham diagnóstico prévio, foram diagnosticados agora.”

A deteção precoce da doença permite “implementar estratégias de mudança, de estilo de vida e estratégias terapêuticas, que permitem evitar a progressão da doença e, portanto, poderão reduzir o risco do doente ter uma primeira de descompensação que vai levar a urgência, que o vai levar a ser internado”.

Rui Baptista também defende a realização de rastreios, sobretudo, entre os grupos de risco.

“É preciso compreender que, em Portugal, um doente que seja internado com diagnóstico de insuficiência cardíaca, um em cada 10 doentes já não vai sair do hospital. Portanto, isto é uma coisa muito séria”.

O estudo PORTHOS decorreu entre dezembro de 2021 e setembro de 2023, envolvendo uma amostra com mais de 6 mil pessoas acima dos 50 anos registadas no Sistema Nacional de Saúde de Portugal Continental.

As conclusões vão ser apresentadas esta terça-feira na NOVA Medical School.

A Insuficiência Cardíaca é uma doença crónica, que afeta cerca de 26 milhões de pessoas em todo o mundo e está associada a um elevado número de hospitalizações e mortalidade.

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